Costa tem quatro ministros de Estado, mas títulos valem pouco. O que conta é o peso político
Mais do que o título de ministros de Estado interessa o poder efetivo que Costa dá aos ministros. Os especialistas ouvidos pelo ECO não veem grandes mudanças na orgânica do novo Governo.
António Costa decidiu promover quatro ministros a ministro de Estado e um deles — Siza Vieira que tem a pasta da Economia — a número 2 do Governo, à frente de Mário Centeno. Mas o que de facto significa isto? Os especialistas contactados pelo ECO não atribuem muita relevância a estas mudanças. Mais importante do que o título é o peso político real.
“Acho que é um mero Governo de continuidade como o primeiro-ministro prometeu em campanha e afirmou na indigitação“, diz, ao ECO, Nuno Garoupa. O professor na George Mason University, nos EUA, acrescenta não ver “nenhum sinal de qualquer alteração relevante em política orçamental ou económica”.
Ou seja, para o economista esta alteração de posições entre os ministros da Economia e das Finanças não significa que Costa irá dar prioridade à economia em detrimento das finanças públicas.
Durante a campanha para as legislativas, o líder do PS agitou a bandeira das contas certas que Mário Centeno lhe deu e o programa eleitoral não revela qualquer viragem. A consolidação orçamental, desta vez com um enfoque na redução da dívida pública, é o ponto central de toda a estratégia na política económica e orçamental, como já frisou o próprio ministro das Finanças.
Pedro Silveira, professor de ciência política na Universidade da Beira Interior (UBI) e especialista em relações governamentais, defende que o título de ministro de Estado é mais simbólico e lembra que tudo depende do que acontece no dia-a-dia do Governo.
A escolha de quatro ministros de Estado — além de Centeno e de Siza, também Augusto Santos Silva e Mariana Vieira da Silva ganharam o título — “é algo simbólico”. No entanto, face ao Governo anterior de António Costa passa uma mensagem clara para fora de quem “faz parte do núcleo duro” do Executivo.
Na legislatura que agora acaba Costa não teve qualquer ministro de Estado. E não foi esse facto que impediu o ministro das Finanças de condicionar durante toda a legislatura a ação dos restantes ministros. Ou seja, Centeno não tem precisado do título de ministro de Estado para ter força à mesa do Conselho de Ministros.
No entanto, não é o facto de Centeno ser agora ministro de Estado que lhe atribuiu um peso político adicional efetivo. “Mário Centeno teria mais poder se fosse o único ministro de Estado”, argumenta Pedro Silveira que não acredita que a atribuição deste título possa servir para fazer alguma leitura sobre se Centeno fica até ao fim da legislatura. “Se fosse o único ministro de Estado poderia haver aqui uma leitura de compromisso de legislatura.” Neste caso, não.
O especialista em relações governamentais lembra que desde Pedro Santana Lopes, em 2004/2005, que um ministro da Economia não estava tão em cima na hierarquia do Executivo. Mas o poder real de Pedro Siza Vieira, amigo pessoal do primeiro-ministro, vai depender mais de dois fatores: se o primeiro-ministro vai “empoderar” o ministro da Economia, ou seja, se lhe vai dar o papel de “coordenador” do Governo perante os restantes ministros. Se Costa quiser passar a mensagem para dentro do elenco governamental de que a Economia ganha importância terá de “apresentar Siza Vieira no Conselho de Ministros como coordenador político” e como o membro do Governo “que tem autoridade para falar pelo primeiro-ministro”.
Silveira acredita que esta função será atribuída a Mariana Vieira da Silva, uma escolha “mais pacífica”, que já desempenhava essa função no atual Executivo e que agora também passou a ministra de Estado.
O professor da UBI acrescenta que, além disso, há um fator conjuntural que influencia as várias camadas de poder dentro de um Governo. “Se houver necessidade conjuntural de cortes o ministro das Finanças ganha mais preponderância mesmo que não tenha o título de ministro de Estado.”
Em governos anteriores, há também exemplos que mostram a força que por tradição têm os ministros das Finanças em Portugal. Em 2011, quando o primeiro Governo de Passos Coelho tomou posse, Vítor Gaspar era ministro de Estado e das Finanças, mas tinha Paulo Portas à sua frente na hierarquia do Governo, acumulando também o título de ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros. Portas, líder do partido da coligação governamental, era o número dois de Passos, mas essa posição não evitou o descontentamento do presidente dos centristas com a força que o ministro das Finanças tinha dentro do Governo.
Também na legislatura que agora acaba existe um outro exemplo que mostra que o peso político de um ministro resulta mais da missão que tem (e do sucesso com que a executa) do que dos títulos que compõem o nome do cargo. Pedro Nuno Santos, atualmente ministro das Infraestruturas e da Habitação, foi, em grande parte da legislatura passada, secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares. Mas ao ter como função ser pivot das negociações na geringonça tornou-se numa peça essencial para o sucesso da legislatura. Mesmo sem ser ministro.
No dia em que foi conhecido o elenco do Governo, a subida do ministro da Economia a número 2 do Governo não impressionou os patrões. “É um Governo de continuidade”, disse o presidente da CIP, António Saraiva, acrescentando não esperar que as “políticas sejam alteradas”. No entanto, houve atores de associações empresariais que elogiaram a escolha. Esta opção envia um sinal para os empresários de que “há um retemperamento” no Governo, depois de quatro anos de geringonça, diz Pedro Silveira. “As empresas leem que vão ter agora um interlocutor verdadeiramente importante”, embora tudo “dependa da prática”.
A estabilidade fiscal e a redução da carga fiscal das empresas — medidas que estão permanentemente nos cadernos de encargos das associações representativas das empresas — são decididas no Terreiro do Paço e não na Horta Seca, onde fica o Ministério da Economia.
Mas afinal para que serve ser ministro de Estado? Esta questão terá resposta na Lei Orgânica do Governo. Mas habitualmente, em executivos anteriores, como por exemplo no de Passos Coelho, ao ministro de Estado, cabia a responsabilidade de substituir o primeiro-ministro nas suas ausências e impedimentos — tendo o Presidente da República de ser informado. Uma situação, que se poderá intensificar com a presidência portuguesa da União Europeia, no primeiro semestre de 2021.
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