Cortes de rating, subida dos juros ou injeções na banca. Sete cisnes negros para a dívida portuguesa

São cenários improváveis, mas definidos com base em riscos reais. Apesar de o outlook para a dívida, em 2020, ser otimista, a desaceleração económica e a pressão sobre a banca poderão dificultar.

A estabilidade política e a recuperação económica de Portugal, a par da política monetária do Banco Central Europeu e do ambiente internacional favorável, tem levado o país a brilhar nos mercados internacionais. As agências de notação financeira veem o país como rating de cada vez mais qualidade e os juros da dívida pública estão próximos de mínimos históricos.

No campo macro, a economia desacelerou, mas continua a crescer de forma robusta, enquanto as contas públicas estão, pela primeira vez em democracia, a aproximar-se do excedente. O sentimento em relação a Portugal é, assim, favorável e o cenário para 2020 parece positivo. No entanto, há sempre riscos internos e externos.

Com a ajuda do economista Filipe Garcia (da IMF – Informação de Mercados Financeiros) e do analista Pedro Amorim (da corretora Infinox), o ECO delineou como é que os fatores críticos se poderão desenvolver (de forma exagerada) caso algum desses eventos se materialize. Estes são os sete cisnes negros que poderão afetar a dívida pública portuguesa este ano:

1. Crise política leva Portugal a eleições antecipadas

O PS de António Costa venceu um segundo mandato no Governo, em outubro, mas não a maioria absoluta. Apesar de os quatro anos que passaram terem sido também assim e de o novo Governo ser visto como continuidade do anterior, o Orçamento do Estado (OE) para 2020 ainda não está aprovado na especialidade. Há críticas dos vários partidos sobre a despesa pública, tendo a Função Pública e o investimento como principais reivindicações. Um conflito sobre a despesa entre o PS e os partidos à esquerda poderá colocar em causa o OE, aumentando o risco de crise política, fazendo com que Portugal seja obrigado a ir a eleições antecipadas ainda no primeiro semestre de 2020.

2. Economia trava a fundo no segundo semestre na Europa

A economia mundial está a abrandar, tendo crescido perto de 3% em 2019, o ritmo de crescimento mais baixo desde a crise financeira de há uma década. O Fundo Monetário Internacional reviu as previsões para 2019 em baixa cinco vezes seguidas devido à guerra comercial entre os Estados Unidos e a China, que se alastrou a outros países e blocos económicos consecutiva. Atualmente, a projeção para 2020 é de um crescimento de 3,4% a nível global e de 1,4% na Zona Euro (após 1,2% em 2019). O reacendimento das tensões entre os dois gigantes poderá levar a um travão a fundo na economia global, que afete em especial a indústria automóvel alemã. No segundo semestre, a Europa entraria em recessão.

3. Espanha ingovernável leva a risco sistémico espalha-se

Espanha realizou quatro eleições legislativas nos últimos quatro anos e não teve facilidade em formar Governo. Após vários meses de impasse político (e à segunda tentativa), Pedro Sánchez foi investido como primeiro-ministro de Espanha. O presidente do PSOE passou a liderar o primeiro Governo de coligação em Espanha, mas o equilíbrio é periclitante. Caso “Espanha permanece ingovernável, a economia poderá entrar em recessão, um grande banco precisar de ser intervencionado, espalhando o risco sistémico pelo sistema financeiro” não só espanhol, mas de toda a Zona Euro, segundo Garcia, da IMF.

4. Novamente em apuros, bancos precisam de injeções de capital

“Após a recapitalização da Caixa Geral de Depósitos a sua situação está estável e as expectativas apontam para melhorias nos seus resultados. Sobre o Montepio o pior cenário está afastado após algumas mudanças e o único que pode vacilar será o Novo Banco”, diz Pedro Amorim, analista da Infinox. A pressão dos juros em mínimos históricos na Zona Euro e da concorrência das fintech sobre a rentabilidade da banca a par do aumento do crédito malparado devido à desaceleração económica poderia, no entanto, afetar de forma expressiva o setor na Europa. Os principais bancos seriam atirados de novo para os prejuízos, comprometendo o sistema financeiro e obrigando a novas injeções de capital. Em casos extremos, alguns bancos poderiam mesmo ser obrigados a medidas de resolução.

5. Contas públicas não conseguem ter excedente

É esperado que Portugal tenha, em 2020, o primeiro excedente orçamental em democracia. O saldo orçamental histórico poderá ser ameado pela desaceleração económica internacional. Com a economia a pressionar o país, um aumento do desemprego poderá levar a uma subida da despesa com prestações sociais, enquanto os parceiros de governação pressionam o Governo por maiores despesas públicas. A inversão do ambiente europeu, levaria a aumentos nos juros das dívidas soberanas do euro e agravando ainda mais a situação do país. Mário Centeno é obrigado a rever em baixa a meta e não consegue alcançar o excedente orçamental.

6. Rating de Portugal cai e volta ao limiar de “lixo”

Ao longo da crise, Portugal foi visto como investimento especulativo durante sete anos, três meses e dois dias pelas principais agências de rating. “Nos últimos anos tivemos uma melhoria da notação financeira da dívida nacional. É muito pouco provável que seja diminuída a nota a Portugal. Uma redução da nota a Portugal seria contraproducente para o que as agências têm dito sobre a evolução da nossa economia e sobre as contas públicas”, explica Pedro Amorim. Mas uma inversão no caminho de redução da dívida — devido ao agravamento das contas públicas ou à situação da banca — poderá levar as agências a colocarem a perspetiva de rating em “negativa” no primeiro semestre e a cortar a notação no fim do ano.

7. Fim da credibilidade do BCE e nova ameaça de fim do euro

Após anunciar novas medidas expansionistas, o Banco Central Europeu (BCE) deverá manter a estratégia praticamente inalterada ao longo do próximo ano. Mas os países já não acreditam na eficácia da instituição liderada por Christine Lagarde, cuja reputação é agravada pela discórdia entre os Estados-membros deixada pelo Brexit. Cisões na UE provocariam a perda de credibilidade do BCE e o regresso da ameaça do fim do euro. Os mercados da dívida invertem e os juros de Portugal regressariam aos níveis de 2017“, acrescentou Filipe Garcia.

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