Anacom critica lei que garante serviços básicos durante a crise. Clientes de telecomunicações ficam desprotegidos

A AR aprovou uma lei que garante que os cidadãos em dificuldades continuam a ter acesso a serviços básicos. Mas vê problemas na lei que podem deixar desprotegidos os clientes de telecomunicações.

A Assembleia da República (AR) aprovou uma lei para garantir que os consumidores continuam a ter acesso aos serviços públicos essenciais durante a pandemia, evitando, por exemplo, cortes de luz, água ou gás. Porém, no que toca às telecomunicações, essenciais numa altura em que muitas empresas adotaram o regime de teletrabalho, a Anacom vê insuficiências que podem desproteger os clientes das operadoras.

Face ao que considera ser margem para interpretações ambíguas da lei, que podem levar ao corte do serviço de telecomunicações a desempregados que não consigam pagar a fatura, ou mesmo à cobrança de juros de mora aos clientes que atravessem dificuldades financeiras durante a crise, o regulador decidiu entregar ao Parlamento uma “proposta para reforçar a proteção dos utilizadores de comunicações eletrónicas”, anunciou num comunicado.

“A Anacom congratula-se com a recente aprovação da lei […] que contempla medidas excecionais e temporárias para, em resposta a dificuldades causadas pela pandemia Covid-19, garantir o acesso aos serviços públicos essenciais e, de entre estes, aos serviços de comunicações eletrónicas, mas considera que o regime aprovado poderá ser objeto de um conjunto de clarificações e de melhoramentos”, considera a entidade liderada por João Cadete de Matos.

Uma das recomendações passa pela “reformulação da atual redação” da lei num ponto cuja leitura, da forma como está no documento, abre espaço a que as empresas de telecomunicações possam suspender o fornecimento do serviço “quando os assinantes estejam em situação de desemprego” ou o agregado familiar tenha tido uma quebra acentuada nos rendimentos.

Com esta lei, o Parlamento decidiu impedir que o fornecimento de luz, água e gás não possa ser cortado aos clientes que não paguem durante a atual pandemia, mais concretamente enquanto durar o estado de emergência e durante o mês seguinte. Já no caso das telecomunicações, a Anacom diz que a lei estabelece um “regime mais restritivo” para os clientes, em que, para serem protegidos, estes têm de provar a situação financeira débil em que se encontrem.

“Tendo em vista a proteção dos interesses dos utilizadores de serviços de comunicações, parece-nos dever ser ponderado até que ponto e justifica uma definição de um regime mais restritivo para estes utilizadores, em comparação com os utilizadores de outros serviços essenciais. Enquanto para os utilizadores de comunicações eletrónicas se exige que tenham de estar numa situação de desemprego, redução de rendimentos do agregado familiar igual ou superior a 20%, ou por infeção por Covid-19, nos outros serviços públicos essenciais não existe esta exigência”, nota a Anacom em comunicado.

Acresce que o regulador vê como problemático o “facto de a lei não especificar quais os comprovativos que podem fazer prova da situação de desemprego ou redução de rendimentos, deixando a cada empresa prestadora de serviços total liberdade para definir que comprovativos aceita”.

Lei permite que operadoras cobrem juros de mora

Outro problema na referida lei, na ótica da Anacom, é a inexistência de um bloqueio à cobrança de juros de mora por parte das empresas de telecomunicações. Em causa, eventuais dívidas que possam ser acumuladas durante a pandemia do coronavírus.

“A lei em vigor não proíbe a cobrança de juros de mora e de penalizações contratuais em consequência de atrasos no pagamento de faturas ou no carregamento de saldos, não impedindo, assim, que estes encargos possam acrescer o valor das dívidas acumuladas pelos assinantes durante este período de exceção, agravando desta forma os encargos que estas medidas visam mitigar”, aponta o regulador das comunicações.

Além disso, segundo a Anacom, a lei indica que as referidas dívidas “devem ser objeto de um plano de pagamento definido por acordo entre o prestador e o assinante, prevendo uma moratória de dois meses após o estado de emergência”. Ora, o regulador entende que esta solução deixa “uma elevada margem” para as operadoras “imporem condições de pagamento que podem não ir ao encontro das necessidades dos assinantes”, remata a entidade reguladora.

(Notícia atualizada pela última vez às 11h57)

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