Quem esteve de baixa em fevereiro ou mudou de emprego foi excluído do bónus pós lay-off
O Governo previa gastar 70 milhões com o complemento de estabilização, mas despendeu 48 milhões. Os trabalhadores que mudaram de emprego e os que estiveram de baixa médica não receberam o apoio.
Os trabalhadores que estiveram de baixa médica durante todo o mês de fevereiro ou que mudaram de emprego pouco antes de serem colocados em lay-off não tiveram direito ao complemento de estabilização pago no final de julho pela Segurança Social. De notar que o Governo acabou por gastar menos de 70% do que tinha inicialmente previsto com este apoio, que foi pago a menos 168 mil beneficiários do que o Executivo tinha estimado.
O complemento de estabilização foi desenhado de modo a apoiar os trabalhadores que estiveram em lay-off (simplificado ou tradicional) durante um mês civil completo, entre abril e junho, e que sofreram, em consequência, perdas salariais, não podendo a sua remuneração base ultrapassar os 1.270 euros.
Segundo o decreto-lei 27-B de 2020, esta ajuda, que foi paga no final de julho pelo Estado, correspondeu à diferença entre o valor da remuneração base declarado relativo ao mês de fevereiro de 2020 e aquele declarado relativamente ao mês em que o trabalhador esteve em lay-off, tendo como valor mínimo 100 euros e máximo 351 euros.
Segundo explicou a Segurança Social ao ECO, esta fórmula de cálculo implica, contudo, que os trabalhadores que estiveram de baixa médica durante todo o mês de fevereiro não têm direito ao complemento de estabilização, mesmo que cumpram todas as outras condições de acesso. Isto porque o apoio é apurado com referência à remuneração do segundo mês de 2020 e, na ausência desta, não há lugar à atribuição da ajuda, garante a Linha da Segurança Social. É o caso, por exemplo, de um trabalhador que tenha recebido, em alternativa, o subsídio de doença durante todo o mês e não a sua remuneração normal.
Por outro lado, no caso dos trabalhadores que estiveram de baixa médica apenas durante alguns dias de fevereiro, mas não o mês inteiro, o complemento de estabilização é aplicado. Nesta situação, como foi declarada alguma remuneração base (referente aos dias de trabalho efetivamente prestados), a Segurança Social entende que se deve atribuir a ajuda excecional.
Já os trabalhadores que decidiram mudar de emprego, por exemplo, no início de março e que acabaram por ser colocados em lay-off durante todo o mês de abril não têm direito ao “bónus” em causa. Ao ECO, a Segurança Social avança que, como a entidade empregadora que requereu o regime excecional é diferente daquela que declarou a remuneração em fevereiro, os trabalhadores nestas circunstâncias não têm direito ao apoio, mesmo que cumpram as demais condições.
A advogada Madalena Caldeira frisa que o decreto-lei 27-B de 2020 nem prevê esta situação, nem faz esta distinção entre empregadores. Ainda assim, a especialista em lei laboral admite que a Segurança Social pode argumentar que, perante a mudança de empregador, não é possível perceber se a diferença que existe entre a remuneração de fevereiro e a remuneração recebida em lay-off se fica a dever à mudança de emprego ou à aplicação do regime excecional em causa.
Também os trabalhadores que estiveram em lay-off por um período não coincidente com um mês civil completo — por exemplo, 30 dias entre o meio de abril e o meio de maio — não receberam (ainda) o apoio em causa.
Esta situação foi denunciada pela Associação Nacional do Ramo Automóvel (ARAN), que sublinhou que, em consequência, têm surgido conflitos sociais entre empregadores e trabalhadores, “que imputam às empresas a responsabilidade pelo não pagamento daquele complemento”, uma vez que referem que as mesmas poderiam ter iniciado o lay-off no primeiro dia de cada mês e assim já teriam direito ao seu pagamento. De notar que o lay-off simplificado foi lançado em meados de março, cerca de três meses antes do Governo anunciar o complemento de estabilização, pelo que não era possível antecipar a situação em causa.
Em reação a esta denúncia, o Ministério do Trabalho já veio garantir que irá rever o enquadramento legal de modo a explicitar que, afinal, os trabalhadores que tenham estado, pelo menos, 30 dias em lay-off, mesmo sem completar um mês civil, têm direito a este complemento.
Este “bónus” foi, de resto, lançado em junho no âmbito do Programa de Estabilização Económica e Social (PEES), prevendo o Governo gastar cerca de 70 milhões de euros para esse fim. De acordo com o Ministério do Trabalho, acabou, contudo, por sair dos cofres do Estados menos de 70% desse valor. O Governo gastou 48 milhões de euros com este complemento.
No mesmo sentido, previa-se inicialmente que o “bónus” chegasse a 468 mil trabalhadores, mas só 300 mil trabalhadores receberam esta prestação. Este número compara também com os mais de 800 mil trabalhadores que estiveram em lay-off (a maioria, no regime simplificado) nos últimos meses. Tal diferença é explicada, além de pelas nuances já referidas, pelo facto de nem os trabalhadores com o salário mínimo, nem os trabalhadores com salários base superiores a 1.270 euros terem acesso ao apoio. Nos restantes casos, a ajuda foi atribuída de modo automático pela Segurança Social.
O ECO questionou o Ministério do Trabalho sobre os casos das baixas médicas e da mudança de emprego, mas não obteve resposta.
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