#Episódio 4: Por 48 vezes, Rui Pinto foi ao sistema da FPF e conseguiu números de árbitros

O hacker acedeu a contatos de praticamente todos os árbitros nacionais, processos disciplinares, decisões do Conselho de Justiça, classificações de árbitros e transferências de jogadores.

1 de março de 2018. Madrugada dentro. Das 4 horas e 31 minutos até às 8h00 da manhã, Rui Pinto “efetuou 48 acessos a vários servidores e máquinas da Federação Portuguesa de Futebol” (FPF) através dos quais fez “exaustivas pesquisas e consultas em diretórios e ficheiros dos computadores utilizados pela FPF”. A acusação do Ministério Público relativa ao processo que envolve Rui Pinto é clara: O arguido procedeu “ao mapeamento e inventário de todos os serviços e dispositivos disponíveis na rede da FPF”.

Diz ainda o MP que Rui Pinto “não só visualizou, como exfiltrou, parte da informação que ali encontrou, a qual veio a guardar no seu equipamento eletrónico pessoal”. Concretizando: guardou ficheiros como um acórdão do Tribunal Arbitral do Desporto — que envolvia o presidente da SAD do Benfica, Luís Filipe Vieira — bem como listas de contactos de praticamente todos os árbitros, processos disciplinares, decisões do Conselho de Justiça, classificações de árbitros, pareceres e documentos sobre inscrições, transferências e revalidações de jogadores do futebol amador e profissional.

Sem conseguir apurar como, as procuradoras contam ainda que Rui Pinto “obteve as credenciais de acesso do funcionário da Federação Portuguesa de Futebol, Vítor Franco, à plataforma ‘Score’. Na posse das referidas credenciais, nos dias 12 de junho e 16 de julho de 2016, o arguido acedeu a essa mesma plataforma, tendo feito o downlowd de mais três documentos e mais 23 documentos depois disso”.

Mas não ficou por aqui. Em agosto de 2018, o hacker obteve a senha de acesso ao e-mail de João Rocha, vogal do Conselho de Arbitragem da Federação Portuguesa de Futebol e visualizou “exaustivamente” os seus conteúdos que remontavam a dezembro de 2011. Entre esses documentos estavam informações confidenciais como nomeações de árbitros de futsal e futebol de praia. Tal como no caso da Doyen, num dos seus discos externos havia um ficheiro com anotações sobre a FPF, desde “endereços de correio eletrónico e respetivas palavras passe e plataformas de ficheiros”.

Julgamento prossegue no Campus de Justiça

O julgamento de Rui Pinto — que está acusado de 90 crimes — começou a 4 de setembro. Teve até ao momento doze sessões, tendo já datas marcadas até 10 de dezembro. Porém, estas sessões já agendadas deverão ser insuficientes para ouvir as 120 testemunhas indicadas pelo Ministério Público e pelos advogados de defesa de Rui Pinto e do seu antigo advogado, Aníbal Pinto, também arguido no processo. Esta quinta-feira será ouvido um dos denunciantes, Bruno de Carvalho, ex-líder da SAD do Sporting.

Além dos assistentes — como o sócio da VdA João Medeiros (na altura da PLMJ) — e das intervenções iniciais dos arguidos, apenas foram ouvidas duas testemunhas da Polícia Judiciária até ao momento, o inspetor José Amador, e o especialista em informática da PJ José São Bento. O julgamento é conduzido por um coletivo de juízes liderado por Margarida Alves. Rui Pinto acompanhou todas as sessões, tirando notas, mas só falou na primeira sessão.

Sublinhou que está neste processo “numa estranha situação”, já que é “arguido, mas também testemunha protegido pelo Estado”. Numa curta declaração feita com papel na mão e em pé, o alegado hacker assume-se não como um pirata informático mas sim “um whistleblower que agiu no interesse público e “nunca por dinheiro”.Mas assume que o seu “trabalho de whistleblower está terminado” e garante que não o fez “nunca por dinheiro”.

O Ministério Público — em julgamento — tem tentado demonstrar que os ataques informáticos imputados a Rui Pinto configuram um ato de pirataria (ou “hacking”) sem precedentes em Portugal, pelo número de alvos, pelo volume de informação extraída, pela continuidade no tempo (entre final de 2015 e início de 2019) e pelas técnicas usadas para prosseguir esses objetivos.

Os inspetores da PJ ouvidos até aqui explicaram que no material apreendido a Rui Pinto em Budapeste (a 16 de janeiro de 2019) constavam e-mails de dezenas de advogados da PLMJ (só a caixa de correio de João Medeiros ocupava 18,89 gigabytes), mas também documentos da sociedade Vieira de Almeida, acessos à Procuradoria-Geral da República, informação da Federação Portuguesa de Futebol, um agendamento de uma reunião da Europol, ficheiros com dados de contas bancárias e respetivas senhas, entre outros alvos.

Nota: Este artigo faz parte de uma série de episódios da “Novela Rui Pinto”, que irão ser publicados ao longo da semana, e que contam que informação obteve, afinal, o hacker Rui Pinto, como o conseguiu fazer, quantos advogados foram hackeados e que informação relativa ao Benfica foi acedida. As histórias e os relatos têm por base a informação do despacho de acusação anunciado pelo Ministério Público em setembro de 2020, no âmbito da investigação do processo “Football Leaks”.

 

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