Decisão do Governo de suspender acordos de empresa viola a Constituição, acusa sindicato

  • Lusa
  • 23 Dezembro 2020

SPAC considera que a resolução do Conselho de Ministros “está ferida de variadas inconstitucionalidades e ilegalidades” e, neste sentido, garante que vai recorrer “a todos os meios judicias.

O Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil (SPAC) acusou esta quarta-feira o Governo de violar a Constituição por ter decidido “unilateralmente” suspender os acordos de empresa da TAP, que considera uma “iniciativa arriscada e socialmente irresponsável”.

“Após um simulacro de negociação antes da apresentação do plano de reestruturação do Grupo TAP a Bruxelas, o Governo toma agora uma decisão unilateral, sem consultar os representantes dos trabalhadores, em clara violação da Constituição”, afirmou o SPAC, numa comunicação aos associados, sublinhando que o Governo “prefere usar instrumentos de pressão sobre os pilotos do que realizar uma negociação efetiva de boa-fé”.

Assim, “antevendo esta posição”, a direção do SPAC deu conta de ter apresentado na terça-feira à TAP “uma proposta de acordo de emergência de suspensão parcial e alteração parcial do Acordo de Empresa (da TAP SA), com vista a dar início a um processo negocial que seja alternativa à iniciativa arriscada e socialmente irresponsável do Governo, materializada na referida Resolução do Conselho de Ministros”. O Conselho de Ministros aprovou na terça-feira uma resolução que declara a TAP, a Portugália e a Cateringpor, a empresa de ‘catering’ do grupo TAP, em “situação económica difícil”.

A estas empresas são, assim, atribuídos os efeitos previstos na legislação, nomeadamente a alteração de condições de trabalho e a não aplicação ou a suspensão, total ou parcial, das cláusulas dos acordos de empresa ou dos instrumentos de regulamentação coletiva aplicáveis, com estabelecimento do respetivo regime sucedâneo”, adiantou o Governo, em comunicado.

Na comunicados aos associados, a que a Lusa teve acesso, o SPAC considerou que a resolução do Conselho de Ministros “está ferida de variadas inconstitucionalidades e ilegalidades” e, neste sentido, garante que vai recorrer “a todos os meios judicias e extrajudiciais para defesa do Estado de Direito e da Lei Fundamental”.

Na opinião do sindicato que representa os pilotos da transportadora, “o Governo escolheu o caminho mais difícil para resolver os graves problemas do grupo TAP”, passando, assim, a pertencer-lhe “a responsabilidade pelas consequências dessa escolha”.

Ainda assim, o SPAC disse manter-se disponível para negociar soluções estruturais para a TAP, esperando “bom senso” para que isso seja possível. “Até lá, iremos reagir por todos os meios ao nosso alcance contra este atentado aos direitos dos pilotos, em especial o de audição das suas estruturas representativas e de negociação e contratação colectiva”, reiterou.

O plano de reestruturação da TAP, entregue em Bruxelas este mês prevê a suspensão dos acordos de empresa, medida sem a qual, segundo o ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, não seria possível fazer a reestruturação da TAP.

Prevê o despedimento de 500 pilotos, 750 tripulantes de cabine, 450 trabalhadores da manutenção e engenharia e 250 das restantes áreas. O plano prevê, ainda, a redução de 25% da massa salarial do grupo (30% no caso dos órgãos sociais) e do número de aviões que compõem a frota da companhia, de 108 para 88 aviões comerciais.

Comissão de Trabalhadores quer plano de reestruturação

Também a Comissão de Trabalhadores (CT) da TAP acusou esta quarta-feira o Governo e a administração de não cumprirem a lei ao negarem facultar informação oficial do projeto de reestruturação entregue à Comissão Europeia. “De acordo com a lei, as CTs devem dar parecer sobre os processos de reestruturação das empresas, e tanto a administração, como o Governo e quem tutela, não estão a cumprir a lei, negando a informação oficial do projeto de reestruturação já entregue a Bruxelas”, considerou a CT da companhia aérea.

A estrutura representativa dos trabalhadores diz que solicitou a disponibilização dos documentos apresentados durante as reuniões com a administração e com o Ministério das Infraestruturas e da Habitação, bem como do plano de reestruturação que foi entregue no passado dia 10 à Comissão Europeia, que “nunca” foram facultados.

“Foi-nos, sim, enviado para assinatura, um inadmissível acordo de confidencialidade a dez anos, que nos impede de divulgar e discutir com os trabalhadores seja por que meios for, as matérias contidas no projeto de reestruturação”, acrescentou a CT, realçando que “o Código do Trabalho já prevê o dever de confidencialidade das Comissões de Trabalhadores em matérias específicas”.

A CT reiterou que se opõe a medidas de despedimento de trabalhadores e cortes salariais, previstas no plano, e, neste sentido, está a ponderar, juntamente com outros órgãos representativos dos trabalhadores, a possibilidade de avançar com um plenário geral de trabalhadores em janeiro.

“A reestruturação da companhia deve ter em conta as reais necessidades do país em ‘tempos normais’ e não ser feita à luz de situação pandémica. Os trabalhadores não são o problema, são parte da solução para a retoma da TAP e a manutenção do seu papel”, sublinhou a estrutura.

Na perspetiva da CT, os trabalhadores não devem ser castigados pelos “desaires de outros” e atribuiu as culpas da situação financeira difícil em que a transportadora se encontra ao Governo e a antigas gestões. “As opções tomadas têm muito a ver com a situação financeira da TAP, senão vejamos: em 2001 a TAP quase colapsava em consequência da falência da Swissair, negócio imposto por Bruxelas a que o Estado cedeu”, começou por elencar.

A CT apontou o dedo também à compra no Brasil da VEM – Varig Engenharia e Manutenção, em 2005, “um sorvedouro de recursos financeiros”, e ao crescimento não sustentado, primeiro com a administração de Fernando Pinto e, depois, com a Atlantic Gateway, que diz ter aberto rotas e comprado aviões “sem que houvesse uma almofada financeira para sustentar” aquele crescimento.

“Em cima de tudo isto temos a concessão da ANA à Vinci, para nós erro crasso, pois deve haver o controlo público da gestão aeroportuária por forma a facilitar a complementaridade entre a gestão dos aeroportos, o ‘hub’ de Lisboa e a existência da TAP como companhia aérea de bandeira ao serviço do país”, concluiu.

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