Apoios fazem aumentar descontos para a Segurança Social e “tramam” trabalhadores independentes

Um dos apoios extraordinários criados em resposta à pandemia está a obrigar os trabalhadores independentes a pagarem contribuições de, pelo menos, 65,75 euros, gerando dificuldades.

Há trabalhadores independentes que estão com dificuldades em pagar as contribuições para a Segurança Social, uma vez que, apesar de não terem ainda retomado a normalidade da sua atividade, têm de descontar, todos os meses, pelo menos, 65,75 euros. Isto porque, no ano passado, pediram um apoio extraordinário, que determina que têm de ficar “fidelizados” à Segurança Social até 30 meses finda a concessão do subsídio e pagar, durante todo esse período, contribuições com base em, pelo menos, o valor do apoio (438,81 euros).

O Orçamento do Estado Suplementar para 2020 criou o apoio extraordinário a trabalhadores, medida destinada aos portugueses em situação de desproteção económica e social, que não tinham acesso a “qualquer instrumento ou mecanismo de proteção social, nem aos apoios sociais criados” em resposta à crise pandémica, nomeadamente trabalhadores independentes com quebras de, pelo menos, 40% dos “serviços habitualmente prestados” e que já tinham esgotado os apoios extraordinários anteriores.

Este subsídio equivaleu a 438,81 euros mensais, tendo ficado estabelecido que, durante o período de concessão, o beneficiário tinha de pagar contribuições sociais equivalentes a um terço da “contribuição com base no valor de incidência do apoio” (ou seja, cerca de 22 euros).

Findo esse período, as obrigações tornavam-se mais pesadas, o que está agora a dificultar as contas dos trabalhadores independentes. De acordo com a legislação, em contrapartida a terem recebido este subsídio em 2020, os beneficiários têm agora de ficar “fidelizados” à Segurança Social por até 30 meses após a concessão da ajuda (no mínimo, têm de ficar por 18 meses, o que varia em função do histórico de contribuições).

E durante esse período, a “contribuição equivale à contribuição com base, pelo menos, no valor de incidência do apoio”, isto é, 65,75 euros. Além disso, durante o ano de 2021, esses beneficiários têm também de pagar o remanescente das contribuições sociais (os outros dois terços) relativas ao período de concessão do apoio.

Perante estas regras, há trabalhadores que, “mesmo estando muito necessitados de um apoio“, decidiram não recorrer a este subsídio extraordinário “por causa das contribuições a que ficariam obrigados”, contam ao ECO os Precários Inflexíveis. Outros decidiram desistir da ajuda, após terem recebido um ou dois meses de apoio, e devolver os valores, “quando perceberam os montantes de contribuições que teriam de fazer”, acrescenta a mesma fonte, salientando que o apoio é, de resto, “injusto” porque obrigada ao tal “período de fidelização” de 30 meses tanto os beneficiários que receberam o apoio durante um mês, como quem recebeu seis meses.

“Para quem recebeu apenas um ou dois meses, o montante que tem de ser pago em contribuições é bastante maior que o total de apoio recebido, o que não faz qualquer sentido”, sublinham os Precários Inflexíveis. “Sempre nos manifestámos contra a lógica deste apoio, que classificámos na altura como mais parecido a um empréstimo do que a um sistema de proteção social”, atiram.

O ECO apurou que há ainda um outro tipo de situações entre os trabalhadores independentes que aderiram a este apoio, isto é, há beneficiários que receberam esta ajuda em 2020, mas que, dado o agravamento da pandemia nos primeiros meses de 2021, não conseguiram ainda retomar a normalidade da sua atividade, estando agora em dificuldades para pagar os tais 65,75 euros mensais de contribuições sociais. Há quem tenha, entretanto, aderido ao novo Apoio Extraordinário ao Rendimento dos Trabalhadores — o AERT criado no Orçamento do Estado para 2021 — mas esteja a receber, por essa via, somente o valor mínimo (50 euros) ou pouco mais, não conseguindo fazer face, de qualquer modo, aos descontos que lhe são exigidos pela Segurança Social.

É importante explicar, para fins comparativos, que, em circunstâncias normais, os trabalhadores independentes têm sempre de pagar contribuições sociais, mesmo nos períodos em que não declararam rendimentos. Neste caso, aplica-se a contribuição mínima de 20 euros.

De resto, o apoio criado no Orçamento Suplementar não é órfão na contrapartida de fidelização à Segurança Social. Por exemplo, o apoio desenhado em 2020 para os trabalhadores informais implicava um compromisso de 24 meses com a Segurança Social, mas nesse caso o valor pago aos beneficiários era mais baixo (219,4 euros) e não se assumia esse montante como base dos descontos futuros.

E mesmo o referido AERT prevê, em alguns casos (apenas para os trabalhadores informais) que a concessão do apoio obriga à integração no sistema de Segurança Social durante 30 meses, período que pode ser reduzido para 18 meses. Também neste caso, o valor do subsídio (que no mínimo é de 50 euros e no máximo é de 501,16 euros) determina o montante mínimo dos descontos a fazer durante esse “período de fidelização”.

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