Exclusivo Novo juiz do BES vai ouvir testemunhas sem ter ainda lido o processo

Próximas sessões da instrução do BES estão marcadas entre 26 a 30 de setembro e mantêm-se, apesar do juiz Pedro Correia admitir que ainda nem leu o processo.

O novo juiz de instrução, responsável pela instrução do caso BES desde o dia 5 de setembro, vai manter as sessões agendadas para 26 a 30 de setembro – a inquirição de 33 testemunhas – apesar de ainda não ter lido o processo. Ou seja: o magistrado assume que ainda não teve tempo suficiente para analisar o maior processo da Justiça portuguesa (que conta com 186 volumes) mas que, mesmo perante este estado das coisas, não vai deixar de realizar a diligências marcadas para finais de setembro. Assumindo que, depois de ler o mega processo e caso se justifique, possa voltar a reinquirir essas mesmas testemunhas.

“Nos presentes autos, mostram-se agendadas diligências de instrução para os próximos dias 26 a 30 de Setembro e 24 a 28 de Outubro de 2022, encontrando-se agendadas as inquirições de 33 pessoas do número total que importa ainda ouvir”, segundo explicou o juiz Pedro dos Santos Correia, num despacho enviado às partes, a que o ECO teve acesso.

Nesse mesmo despacho – enviado esta quarta-feira – Pedro Correia faz, inclusive, um desabafo, relativo à dimensão e complexidade do processo. “Mantenha-se em mente que os autos são compostos por 186 volumes, tendo ainda apensos nove procedimentos cautelares de arresto; que a acusação deduzida pelo Ministério Público tem 3654 páginas, versando uma multiplicidade de factos de grande complexidade, quer atento o seu volume, quer atenta a matéria que deles emerge”, escreve o magistrado colocado no conhecido Ticão a 5 de setembro. “O mesmo acontecendo, mutatis mutandis, com os diversos requerimentos de abertura de instrução deduzidos nos autos”. ;

Assumindo assim que “não se mostra possível realizar a análise integral dos autos no espaço de tempo que medeia entre a mencionada tomada de posse e a data de realização das diligências atrás indicadas, importa, por ora, diligenciar pela continuação da tramitação dos autos, mantendo-se as aludidas diligências”, concluiu o magistrado.

No passado dia 5 de setembro, o Conselho Superior da Magistratura (CSM) transferiu o processo do caso Universo BES/GES das mãos de Ivo Rosa ara Pedro dos Santos Correia, juiz auxiliar com apenas dois anos de experiência e que recentemente foi colocado no Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa, em substituição do recém juiz presidente da comarca de Lisboa.

A saída de Ivo Rosa deve-se assim ao movimento de juízes, embora Ivo Rosa não possa ainda ser colocado na Relação, já que tem um processo disciplinar contra si pendente.

Assumindo que a “transferência de um Juiz para outro juízo por via do movimento não viola o princípio do juiz natural. O processo permanece no mesmo juízo para onde foi feita a distribuição, efetuada aleatoriamente”. Ou seja: o CSM sublinha que não foi feita uma nova distribuição/sorteio, porque o que mudou não foi o juiz mas o juízo.

Ivo Rosa ficará afeto ao Tribunal Central de Instrução Criminal, dando continuidade à instrução do processo Octopharma cujo debate instrutório já começou e cuja próxima sessão está marcada para dia 3 de outubro.

Qual a dimensão do processo BES?

O processo BES/GES conta com 30 arguidos (23 pessoas e sete empresas), num total de 361 crimes. Considerado um dos maiores processos da história da justiça portuguesa, este caso agrega no processo principal 242 inquéritos, que foram sendo apensados, e queixas de mais de 300 pessoas, singulares e coletivas, residentes em Portugal e no estrangeiro. Segundo o Ministério Público (MP), cuja acusação contabilizou cerca de quatro mil páginas, a derrocada do Grupo Espírito Santo (GES), em 2014, terá causado prejuízos superiores a 11,8 mil milhões de euros.

A figura central desta investigação é Ricardo Salgado, ex-líder do Banco Espírito Santo (BES), acusado de 65 crimes: associação criminosa (um), burla qualificada (29), corrupção ativa (12), branqueamento de capitais (sete), falsificação de documento (nove), infidelidade (cinco) e manipulação de mercado (dois).

É composto por 767 volumes, entre autos principais, arrestos, incidentes de oposição e apensos bancários e 186 volumes de autos principais, processados até à data da distribuição em 687.398 folhas. Mais todos os apensos bancários, de buscas e diversos (mais de duas centenas) e equipamentos informáticos apreendidos. A acusação conta com 3.552 folhas, assinadas por sete procuradores.

O prazo será ou não alargado pelo CSM?

O prazo que tinha sido dado pelo Conselho Superior da Magistratura (CSM) para Ivo Rosa terminar a fase da instrução do caso BES de oito meses (que terminaria em fevereiro de 2023) pode agora vir a ser alargado. Segundo o que fonte do CSM explicou ao ECO, esse prazo pode agora vir a ser “reavaliado”. Porém, até a data, ainda não aconteceu.

O CSM deu, a 1 de junho deste ano, ao juiz Ivo Rosa um prazo de oito meses para terminar a fase de instrução do processo BES/GES. “Este é o prazo considerado adequado [oito meses], porquanto o prazo legal de quatro meses é manifestamente insuficiente atenta a complexidade e dimensão do processo”, referiu, na altura, o CSM.

Na resposta, a mesma fonte afirma que “o pedido de aceleração processual do processo [BES/GES] foi parcialmente deferido, tendo o CSM fixado um prazo de oito meses a partir da notificação da deliberação para que seja terminada a fase de instrução”.

Logo quinze dias depois, um grupo de 27 advogados — todos eles de arguidos ou assistentes no caso BES — tomaram uma posição pública face a este prazo.

O grupo de advogados — onde se incluem nomes sonantes como Paulo Saragoça da Matta, Raul Soares da Veiga, João Medeiros, Francisco Proença de Carvalho — advogado de Ricardo Salgado — Tiago Rodrigues Bastos e Rui Patrício, entre outros — “a decisão do CSM que está em causa, isto é, a fixação de um prazo para a instrução, é ilegal, e é-o por várias razões, sendo certo que acarreta uma interferência inadmissível por parte do CSM na função jurisdicional – por definição, soberana e independente – dos Juízes”, pode ler-se na carta.

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