Paradoxo do teletrabalho. 28% trabalha mais, mas 36% tem melhor work-life balance
21,7% dos inquiridos já planearam a sua demissão devido às experiências vividas durante a pandemia e o teletrabalho, e 9,9% já se demitiu revela o “Survey Attack: Relatório de Bem-Estar Teletrabalho".
Quase um terço (28%) dos trabalhadores europeus trabalha mais horas num modelo de teletrabalho, mas 36% admite conseguir um melhor equilíbrio entre a sua vida profissional e pessoal, segundo dados do “Survey Attack: Relatório de Bem-Estar Teletrabalho 2022”, estudo da NFON e da Statista Q, junto a oito países europeus, incluindo Portugal.
Com o eclodir da pandemia assistiu-se à explosão do teletrabalho e a ida para casa obrigou muitas pessoas a fazer ajustamentos, preparando-se para a jornada de trabalho. Mas nem todos têm esse espaço físico dedicado. Para 12,1% dos trabalhadores em Portugal, Alemanha, Áustria, Itália, Espanha, Reino Unido, França e Polónia (com mais de mil participantes por país) inquiridos pela Statista Q/NFON, o home office é o quarto, 35,7% trabalham a partir da sala de estar.
Pouco mais de um terço (31,8%) têm um escritório dedicado a este fim e 1,2% afirma trabalhar permanentemente na casa de banho ou na varanda.
Em todos os oito países, a área média do espaço em que os profissionais trabalham é de 20,32 m2. Os britânicos, com 15,35 m², são quem dispõe de menos espaço para trabalhar em casa, enquanto os italianos conseguem usufruir de 23,81 m².
Paradoxo do teletrabalho
O teletrabalho resultou ainda num outro fenómeno de ajustamento. Ao mesmo tempo que o número de horas a que os colaboradores estão ligados ao trabalho aumentou — 28% dos inquiridos afirmam que a quantidade de trabalho a ser feito (carga de trabalho) aumentou, bem como o número de horas para 25,2% — para 36% estar em teletrabalho permite um maior equilíbrio entre a vida pessoal e a vida profissional e mais tempo para dedicar à família e aos amigos.
Christian Montag, especialista na influência das tecnologias digitais na psicologia humana, chama a este fenómeno o “paradoxo do teletrabalho”.
“As pessoas podem certamente trabalhar mais e ter mais tempo livre. A eliminação de deslocações longas e um horário mais flexível ao longo do dia, com uma boa organização, podem gerar mais tempo livre. Horários de trabalho personalizados, literacia digital e outros fatores de bem-estar podem também ser causas”, diz o especialista, citado em comunicado.
Por exemplo, 29,4% dos trabalhadores de oito países europeus diz que passam mais tempo a fazer exercício físico e também comem de forma mais saudável.
Sinal da forma paradoxal como o trabalho remoto impacta a vida dos colaboradores são os níveis de stress vivenciados. Entre os participantes, 37% sentiram níveis variáveis de stress. Entre outras coisas, a necessidade de preparar as próprias refeições (8,7%), uma fraca conexão de internet (17,2%) e estar contactável a qualquer hora (19,7%) foram nomeados como fatores de tensão.
A falta de interação social com os colegas é um fator de stress para 35,3% e a falta de limites claros entre o tempo de trabalho e o tempo de lazer para 30,3%. Em contrapartida, menos pessoas indicaram que o barulho de fundo (15,9%) e remuneração inferior (9,3%) eram fatores de stress.
“Discussões sobre burnout na era digital ou tecnostress estão a tornar-se cada vez mais importantes. Nesta linha, a amostra global evidencia que 20,5% sofrem de tecnostress, que inclui, por exemplo, problemas técnicos como falhas no router, falta de bateria, equipamento inadequados, entre outros. O tecnostress em casa surge para cerca de um quinto dos participantes!”, diz Christian Montag.
Europeus aumentam auto-medicação no pós-pandemia
O estudo também indica que dos trabalhadores europeus estão apostados na auto-medicação com a pandemia, com 34,4% a tomar suplementos sem receita médica (como melatonina, produtos legais de canábis, extratos de plantas, vitaminas e chás calmantes) para melhorar o seu bem-estar desde o início da pandemia, 18,2% para aumentar a concentração e 13,4% para recuperação.
“Um facto notável é que em seis países os dados são muito semelhantes, mas a situação em Itália e na Áustria é bastante diferente: em Itália, 49,7% disseram que tinham tomado suplementos sem receita médica para melhorar o bem-estar, enquanto na Áustria o valor corresponde a menos de metade, ficando-se nos 22,1%”, destaca o estudo.
“Sabemos, com base em inúmeras investigações, que a pandemia de Covid continua a ser um fator de stress até hoje, que se manifesta na redução significativa do bem-estar psicológico para muitas pessoas e, como o presente estudo evidencia, muitos colaboradores recorreram a vários suplementos sem prescrição médica. No estudo ‘Relatório de Bem-Estar Teletrabalho 2022’, 28,9% dos inquiridos afirmou que a sua satisfação com a vida se deteriorou face ao período pré-pandemia. Quando as pessoas têm de continuar a funcionar nas suas vidas quotidianas numa situação ameaçadora a nível pessoal e global, são usadas diferentes estratégias para lidar e ser capaz de desempenhar as tarefas diárias – mesmo em teletrabalho – apesar da tensão”, destaca Christian Montag.
O uso de produtos legais de canábis (como óleo CBD) para aumentar o bem-estar quase duplicou desde o início da pandemia (24,9% antes da pandemia, 43,3% desde o início da pandemia) e a toma de melatonina também aumentou de 38% para 62,6%. Para Christian Montag “a toma de melatonina particularmente preocupante. O sono é um processo natural que não deve ser dessincronizado”.
Demissão: 21,7% planeou sair
O estudo também revela sinais de alarme para os empregadores na Europa: 21,7% dos inquiridos afirmam que já planearam a sua demissão devido às experiências vividas durante a pandemia e o teletrabalho, e 9,9% já deixaram os seus trabalhos.
Falta de oportunidades de desenvolvimento de carreira (34,2%), salário inferior (por exemplo, número de horas de trabalho reduzidas, perda de oportunidades de comissão, 30,1%) e estar contactável a todas as horas (16,6%) foram as razões que levaram à saída.
Alcançar uma maior harmonia entre bem-estar e trabalho está na lista de prioridades dos colaboradores, com mais de um terço (33%) a pretender uma distinção mais clara entre a vida pessoal e a vida profissional, e 20,9% a apostar no desenvolvimento pessoal.
Mas, mais uma vez de forma paradoxal, emerge uma certa predisposição para trabalhar estando doente e/ou durante as férias. “Cada vez mais pessoas parecem estar dispostas a ir de baixa em vez de tirarem dias. Férias ou períodos de descanso são uma conquista social, uma construção de abrigos onde recuperar ou recarregar baterias”, alerta Montag.
Para 38,3% o teletrabalho é uma vantagem porque podem trabalhar mesmo estando doentes, com apenas 26,2% afirmam que não vão estar disponíveis para o seu empregador nas suas próximas férias.
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