EDP/CMEC: Mexia, Manso Neto e Pinho sem acesso ao processo ‘original’

O caso EDP foi separado em dois. Mas defesas dos arguidos do agora chamado EDP/CMEC continuam sem ter acesso ao mesmo, que se mantém em investigação, apesar da acusação a Salgado e Pinho em dezembro.

O processo que agora se chama de EDP/CMEC – que respeita aos arguidos António Mexia, a João Manso Neto e a Manuel Pinho mas pelas decisões que tomou enquanto governante e que terão beneficiado a EDP — continua ‘fechado a sete chaves’, sem as partes poderem ter acesso ao mesmo, apesar de não estar em segredo de Justiça.

O ECO enviou um pedido de consulta do mesmo, há cerca de dez dias, mas também não obteve resposta do DCIAP. Mais: esse mesmo acesso está a ser vedado também à defesa dos três arguidos, apesar das insistências dos advogados, segundo apurou o ECO junto de fontes judiciais.

O processo — originalmente chamado de processo EDP — foi dividido em dois a 5 de dezembro. Assim, a parte que respeita aos arguidos António Mexia, ex-líder da EDP e a João Manso Neto, chama-se agora de processo EDP/CMEC. Nele, vai ainda estar Manuel Pinho mas pelas decisões que tomou enquanto ministro de Economia e que terão beneficiado a EDP, no caso relativo a novos 32 CMEC.

Já o ‘segundo’ processo refere-se à acusação deduzida em dezembro, contra Manuel Pinho, Ricardo Salgado e Alexandra Pinho. Em causa, aqui, estão crimes de corrupção passiva, fraude fiscal e branqueamento de capitais. A acusação conta com 574 páginas e revela que Salgado e Pinho foram acusados de dois crimes de corrupção: ativa no caso de Salgado e passiva no caso de Pinho e de branqueamento de capitais. Aos crimes de Pinho junta-se ainda o crime de fraude fiscal. A ideia é a de evitar que, daqui, nasça mais um processo gigante.

Foi há dez anos, em 2012, que se deu a abertura de inquérito deste processo. O foco da investigação centrava-se nas suspeitas de favorecimento do Governo, na altura de José Sócrates, à EDP. Mas com o decorrer da investigação várias outras suspeitas foram nascendo, como a dos subornos superiores a cinco milhões de euros de Salgado, ex-líder do BES, a Manuel Pinho, à data ministro da Economia de Sócrates.

O inquérito investiga práticas de corrupção e participação económica em negócio nos procedimentos relativos à introdução no setor elétrico nacional dos Custos para Manutenção do Equilíbrio Contratual (CMEC).

O caso está relacionado com os CMEC no qual Mexia e Manso Neto são suspeitos de corrupção e participação económica em negócio para a manutenção do contrato das rendas excessivas, no qual, segundo o Ministério Público, terão corrompido o ex-ministro da Economia Manuel Pinho e o ex-secretário de Estado da Energia Artur Trindade. O alegado favorecimento da EDP no desenho final dos CMEC.

Os CMEC são uma compensação relativa à cessação antecipada dos Contratos de Aquisição de Energia (CAE), que aconteceu na sequência da transposição de legislação europeia no final de 2004. Ou seja, é um regime de compensação da elétrica por grande parte das suas centrais elétricas passarem a vender a sua energia ao preço de mercado, ao invés de manterem os contratos de preço fixo que já tinham.

Os CMEC e a licença da central a carvão de Sines levaram o MP a crer que este “negócio” foi oneroso para os consumidores de eletricidade e beneficiou a EDP. Daí que, Manuel Pinho, seja um dos arguidos no processo.

Em causa estão benefícios de mais de 1,2 mil milhões de euros alegadamente concedidos por Manuel Pinho à EDP, entre outubro de 2006 e junho de 2012. Os pagamentos teriam alegadamente como destino uma nova sociedade ‘offshore’ de Pinho – chamada “Tartaruga Foundation”, com sede no Panamá – e seriam feitos pela Espírito Santo Enterprises – empresa que também é uma ‘offshore’, nas Ilhas Virgens Britânicas, e que ficou conhecida como o Saco Azul do Grupo Espírito Santo (GES).

Os despachos de separação de processos -a que o ECO/Advocatus teve acesso — justificam que o facto de existirem recursos pendentes no Tribunal Constitucional e no Supremo Tribunal de Justiça, não lhes é permitido (ao Ministério Público) encerrar a investigação contra António Mexia e João Manso Neto. Tese refutada pela defesa dos arguidos: “estranha-se a alegação de constrangimentos associados a recursos pendentes no Supremo Tribunal de Justiça e no Tribunal Constitucional, uma vez que não há um único recurso pendente no Palácio Ratton e o único recurso pendente no Supremo é de fixação de jurisprudência, o que significa que não tem qualquer tipo de efeito suspensivo na marcha do processo – é, aliás, pressuposto de admissibilidade do recurso, que a decisão de que se recorre tenha já transitado em julgado e seja, por isso, definitiva”, segundo explicaram ao ECO/Advocatus os advogados destes dois arguidos, João Medeiros, Rui Costa Pereira e Beatriz Duarte Santos.

João Medeiros critica ainda o facto da equipa de defesa só ter sido notificada quase quinze dias depois do despacho de separação dos ditos processos. “É uma profunda falta de respeito pelos direitos processuais dos arguidos e dos seus advogados, que se veem na contingência de ter mendigar junto de jornalistas conhecidos que lhe enviem as peças processuais dos processos onde têm procuração. É que isto diz muito justiça de espetáculo que vivemos”, segundo declarações do advogado, ao jornal Observador.

E então que argumentos usou o Ministério Público para a separação de processos?

  • A investigação que” tem decorrido tem como objeto dois núcleos essenciais de factos que, embora tendo um denominador comum (a atuação de Manuel Pinho), são distintos e podem ser descritos e julgados de modo individualizado”;
  • Assim, por um lado, existe “a matéria relativa aos atos praticados (entre 2005-2009) pelo então Ministro da Economia, Manuel Pinho, relativamente ao grupo BES/GES e, por outro lado, as questões que giram em torno dos CMEC em que se investigam as decisões do mesmo arguido, e de elementos da sua equipa governativa e da EDP, relativamente ao favorecimento indevido a essa mesma entidade do setor elétrico com a contrapartida da sua ida para a Universidade de Columbia, nos EUA”;
  • O tentar evitar os mega-processos “com os correspondentes mega-julgamentos – com todos os inúmeros problemas que lhes são reconhecidos;
  • Tentar ultrapassar os constrangimentos “de ainda existirem pendentes diversos recursos, quer no STJ (para fixação de jurisprudência), quer no Tribunal Constitucional que, na realidade, dificultam a possibilidade de se avançar para um despacho de encerramento do inquérito quanto a todos os factos, complicando a utilização de diversos elementos probatórios recolhidos no inquérito”;
  • E ainda por “razões de celeridade processual, nomeadamente impostas pela existência de um arguido que se encontra sujeito a uma medida limitativa da sua liberdade (permanência na habitação com vigilância eletrónica), também beneficiam com esta solução”;

António Mexia foi constituído arguido a 2 de junho de 2017, na sequência de buscas à EDP. Tal como João Manso Neto, antigo administrador da elétrica, é suspeito de quatros crimes de corrupção ativa e de alegados subornos ao antigo ministro Manuel Pinho (Governo Sócrates), ao ex-diretor-geral da Energia Miguel Barreto e a João Conceição, antigo consultor de Pinho no Ministério da Economia e atual administrador da REN.

Quer a Mexia quer a Manso Neto, o MP imputa ainda o crime de participação económica devido ao negócio relacionado com alegadas irregularidades na adjudicação da construção da barragem do Baixo Sabor ao consórcio Grupo Lena/Odebrecht.

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