Ministério Público acusa empresário desportivo de corrupção. SAD do Benfica não foi acusada
César Boaventura foi acusado pelo MP de três crimes de corrupção ativa e um de corrupção ativa na forma tentada por tentar beneficiar o Benfica na época 2015/2016.
O empresário desportivo César Boaventura foi acusado pelo Ministério Público (MP) de três crimes de corrupção ativa e um de corrupção ativa na forma tentada por querer beneficiar o Benfica na época 2015/2016, segundo a acusação a que o ECO/Advocatus teve acesso. A Sport Lisboa e Benfica – Futebol SAD escapou à acusação uma vez que para ser responsabilizada era necessário que Boaventura fosse membro dos corpos sociais. O MP quer que arguido pague ao Estado 480 mil euros.
Os factos referidos na acusação remontam a abril e maio de 2016 na fase final da Primeira Liga. O MP acusa o arguido de ter abordado quatro jogadores de futebol e “aliciado” os mesmos a prejudicarem-se contra o Benfica, ou seja contra os interesses das próprias equipas, de forma a beneficiar o “clube encarnado”. Em contrapartida, Boaventura prometeu aos jogadores o pagamento de valores avultados que rondavam os milhares de euros.
Aquando dos factos referidos na acusação, o Benfica encontrava-se na primeira posição, com uma distância de dois pontos do segundo classificado, o Sporting. “Tais abordagens ocorreram dias antes da realização do jogo relativo à 31ª jornada da Primeira Liga da época 2015/2016 entre a Rio Ave Futebol Clube – Futebol SDUQ, Lda e a Sport Lisboa e Benfica – Futebol SAD, agendado para o dia 24 de abril de 2016, no Estádio dos Arcos, em Vila do Conde; e do jogo relativo à 33ª jornada da Primeira Liga da época 2015/2016, entre a Marítimo da Madeira – Futebol, SAD e a Sport Lisboa e Benfica – Futebol SAD, agendado para o dia 8 de maio de 2016, no Estádio dos Barreiros, no Funchal”, lê-se na acusação.
César Boaventura era, à data dos factos, “reconhecido no meio do futebol profissional como agente/empresário desportivo”, tendo o MP sublinhado a “conhecida” relação de “confiança” e “proximidade” que mantinha com Luís Filipe Vieira e com a Sport Lisboa e Benfica – Futebol SAD.
“No âmbito da sua atividade profissional, o arguido desenvolveu uma ligação profissional e pessoal com Luís Filipe Vieira, presidente do Conselho de Administração da Sport Lisboa e Benfica – Futebol SAD, à data dos factos, passando a manter com ele uma relação de grande proximidade e confiança, falando ao telefone e por escrito muito frequentemente, quer de assuntos profissionais quer de outros assuntos relacionados com o meio do futebol”, lê-se na acusação.
Apesar da Sport Lisboa e Benfica – Futebol SAD beneficiar com este “esquema”, segundo a lei, para uma pessoa coletiva ser responsabilizada é necessário que o crime seja cometido em seu nome e no interesse coletivo. Logo, e conforme a acusação, César Boaventura não pertencia aos corpos sociais da SAD e não “estava vinculado a esta entidade de forma nenhuma”.
“Também não se indicia suficientemente que o arguido tenha sido incumbido de qualquer tarefa, seja por quem for e, desde logo, por alguém com uma posição de liderança na estrutura da Sport Lisboa e Benfica – Futebol SAD. Assim como também não se indicia que exista qualquer subordinação por parte do arguido, ou atuação no âmbito de um conteúdo funcional“, refere o Ministério Público.
César Boaventura, enquanto empresário desportivo, negociava com os legais representantes de diversas sociedades desportivas, através da celebração de contratos de representação ou intermediação, assegurava a representação de jogadores de futebol profissional junto daqueles e intermediava a celebração de contrats, recebendo a respetiva comissão.
O MP quer a aplicação ao arguido da pena acessória de proibição do exercício da profissão ou atividade de agente/empresário desportivo por um período de três anos. Requereu ainda a condenação do arguido no pagamento ao Estado de 480 mil euros, correspondente ao valor da vantagem/recompensa prometida pela prática do facto ilícito típico e procedeu à liquidação do património incongruente, promovendo a declaração de perda a favor do Estado do valor de 1.172.010,35 euros.
As “propostas” aos jogadores
Os suposto esquema de César Boaventura implicou quatro jogadores de futebol: Marcelo dos Santos Ferreira, Cássio Albuquerque Anjos, José Lionn Barbosa Lucena, à data dos factos do Rio Ave, e Romain Jules Salin, do Marítimo da Madeira.
Segundo a acusação, Boaventura combinou uma reunião com José Lionn Barbosa Lucena e “aliciou-o” com 80 mil euros que seriam pagos por Luís Filipe Vieira. O jogador do Rio Ave só tinha de “ser penalizado com um cartão amarelo na primeira parte, fazer propositadamente um penalty e ser expulso na segunda parte, batendo com a mão no chão”.
“Pagaria tudo em notas de 500 euros, a entregar depois do jogo”, lê-se. O empresário referiu que Cássio Albuquerque Anjos “também estava comprado”. Lucena recusou. Após a recusa, o empresário desportivo aumentou o valor para 100 mil euros. Ainda assim, José Lionn Barbosa Lucena não respondeu.
Entre 1 e 24 de abril de 2016, César Boaventura reuniu com Cássio Albuquerque Anjos, supostamente para lhe apresentar uma “proposta contratual ao nível profissional”. “O arguido dirigiu-se a este dizendo-lhe que tinha “interesse na derrota do Rio Ave” no referido jogo, oferecendo-lhe a quantia de 60.000 euros para que “facilitasse a derrota da sua esquipa””, lê-se. O jogador recusou.
Também entre as mesmas datas, o jogador Marcelo dos Santos Ferreira reuniu com o empresário. Desta vez, Boaventura garantiu a contratação por um conhecido clube estrangeiro, em troca da “realização de uma falta suscetível de marcação de grande penalidade contra a sua equipa no jogo que teria lugar no dia 24 de abril de 2016 entre a Rio Ave Futebol Clube – Futebol SDUQ, Lda e a Sport Lisboa e Benfica – Futebol SAD”. Recusou também.
Por último, entre 3 e 7 de maio de 20016, e face ao jogo revisto entre o Marítimo e o Benfica, César Boaventura reuniu com um dos jogadores do clube madeirense, Romain Jules Salin. Para ter um “desempenho desportivo contrário aos interesses da sua equipa no referido jogo”, o empresário apresentou uma proposta de transferência para um clube estrangeiro, que corresponde a um salário de 300 mil euros anuais. Sem efeito também.
Assim, o Ministério Público considera que o arguido “quis agir da forma descrita, bem sabendo que prometia vantagens patrimoniais ilegítimas a jogadores profissionais de futebol, como fez a Marcelo dos Santos Ferreira, Cássio Albuquerque Anjos, José Lionn Barbosa Lucena, com o propósito concretizado de os determinar à prática de atos destinados a alterar ou falsear o resultado das referidas competições desportivas, resultado que o arguido pretendia, com vista a garantir que a SPORT LISBOA E BENFICA – FUTEBOL SAD fosse a primeira classificada da Primeira Liga no final das 34 jornadas da época 2015/2016”.
Só não concretizou a proposta a Salin, tendo apenas “iniciado a abordagem com a apresentação da habitual contrapartida financeira” mas recusada logo pelo jogador.
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