Ministério Público quer travar entrada em vigor dos sorteios eletrónicos
A lei relativa ao sorteio de processos pelos juízes foi publicada a 27 de março, com atraso de ano e meio.
O Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) quer que a Ministra da Justiça suspenda a entrada em vigor da distribuição eletrónica dos processos judiciais – e que inicie, “com caráter de urgência, reuniões com os representantes das magistraturas, dos oficiais de justiça e dos advogados, tendo em vista encontrar uma solução mais adequada, para evitar a entropia que esta vai gerar no sistema judiciário e às graves implicações para o seu normal funcionamento”, segundo comunicado do SMMP.
Considerando que a lei em causa foi aprovada e feita “à pressa”, com acordo dos grupos parlamentares do PSD e do PS, o SMMP acusa a tutela de não ter sido capaz de, “em tempo, apresentar uma proposta de alteração e de ter acabado por sucumbir perante as artimanhas de alguns advogados especialistas em encontrar buracos nas leis para empatar processos, ignorando o dever que do próprio estatuto profissional sobre eles impende de não promoverem diligências reconhecidamente dilatórias, inúteis ou prejudiciais para a correta aplicação da lei ou a descoberta da verdade”.
A portaria foi publicada em Diário da República (DR) a 27 de março. No final de fevereiro, a ministra da Justiça assegurava que até ao final da sessão legislativa seria entregue no parlamento uma proposta com alterações para tornar o procedimento de distribuição eletrónica de processos menos burocrático e mais transparente.
A lei relativa ao sorteio de processos pelos juízes estava por regulamentar há ano e meio e esta era uma das razões pelas quais julgamento do ex-primeiro-ministro José Sócrates estava parado. O antigo governante tem apresentado recursos sucessivos alegando que não aceita nenhum coletivo de juízes enquanto não houver o sorteio de todos esses juízes. A defesa de Sócrates entende que todos os juízes deveriam ser sorteados como constava de uma lei aprovada pelo parlamento em agosto de 2021 e que deveria ter sido regulamentada em 30 dias.
Em Junho do ano passado, o ex-primeiro-ministro pediu a nulidade da distribuição no Tribunal da Relação de Lisboa do recurso relativo à decisão instrutória do juiz Ivo Rosa no processo Operação Marquês, alegando não ter havido sorteio eletrónico de juiz.
Em requerimento dirigido à juíza desembargadora presidente da 9ª secção da Relação de Lisboa, Pedro Delille, advogado de Sócrates, afirmava que o processo foi “pura e simplesmente atribuído” à juíza desembargadora adjunta, “sem precedência do sorteio eletrónico e aleatório legalmente exigido”.
A ministra da Justiça esclareceu que o Governo tem de fazer uma portaria para regulamentar a lei já existente, “mas no decorrer da concretização dessa portaria, verificou-se que esta trazia uma complexidade muito grande e mais burocracia à distribuição” eletrónica dos processos.
Neste sentido, a ministra defendeu que “em nome da transparência e da celeridade, é preciso fazer melhorias” ao diploma, sendo precisamente nisso que o Governo “está a trabalhar”, com vista a propor tais alterações processuais à Assembleia da República “ainda nesta sessão legislativa, portanto, antes do verão”.
A título de exemplo, a ministra apontou que “a lei definia que passava a haver apenas uma distribuição (de processos) por dia” e no processo penal, “às vezes, não é possível haver só uma distribuição por dia, basta que haja presos e seja um ato urgente, às vezes, é preciso fazer outra distribuição” no mesmo dia.
O diploma data ainda do mandato de Francisca Van Dunem como ministra da Justiça. E previa que o sorteio eletrónico de processos passasse a ser presidido por um juiz, assistido por um oficial de justiça, um magistrado do Ministério Público e, se possível, por um advogado designado pela Ordem dos Advogados.
Aleatoriedade nos resultados e igualdade na distribuição do serviço foram duas das condições reforçadas no diploma. Esta lei surge após recaírem suspeitas sobre alguns dos sorteios dos processos mais mediáticos da Justiça portuguesa, a maioria atribuídos ao juiz de instrução Carlos Alexandre. Um desses sorteios – relativo ao processo da Operação Marquês, na fase da instrução – encontra-se atualmente em investigação no Ministério Público.
A partir de agora, os processos serão distribuídos por todos os juízes do tribunal, ficando sempre a listagem anexa à ata. Caso um processo seja distribuído a um juiz que esteja impedido de intervir, deve ficar “consignada em ata a causa do impedimento que origina a necessidade de fazer nova distribuição por ter sido distribuído a um juiz impedido”. Todas as operações de distribuição são obrigatoriamente documentadas em ata.
Os mandatários judiciais passam agora também a ter acesso à ata das operações de distribuição dos processos referentes às partes que patrocinam, podendo, a todo o tempo, requerer uma fotocópia ou certidão da mesma.
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