Da corrupção ao branqueamento de capitais. Estes são os crimes em causa nas buscas à Altice

Corrupção no setor privado, fraude fiscal agravada, falsificação e branqueamento são os crimes de que a Altice e "altos responsáveis" são suspeitos. A moldura penal pode ir até aos 12 anos de prisão.

Dezenas de buscas domiciliárias e não domiciliárias foram levadas a cabo pelo Ministério Público esta quinta-feira. O alvo foi a Altice Portugal e, segundo a CNN, “alguns dos mais altos responsáveis” por suspeitas de crimes de corrupção no setor privado, fraude fiscal agravada, falsificação e branqueamento de capitais. Ao todo estes crimes oscilam entre um e 12 anos de prisão.

Segundo a CNN, está em causa uma alegada simulação de negócios e ocultação dos proveitos na alienação de património “milionário”, como imóveis, da antiga PT. A CNN avança que um dos negócios suspeitos é a venda de quatro prédios em Lisboa por cerca de 15 milhões de euros, tendo os compradores ligações a um circuito empresarial que foi criado em Braga, na Zona Franca da Madeira e no Dubai, e com relações com o empresário Hernâni Vaz Antunes, familiares e sócios.

Assim, o Ministério Público investiga se o alegado esquema lesou a Altice Internacional e o Estado português, uma vez que podem não ter sido tributados os montantes devidos.

Um dos crimes em causa é o de corrupção no setor privado. Em comunicado, o Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) não especifica se é ativa ou passiva. Caso seja corrupção ativa pode ir até cinco anos de prisão. Já se for passiva a pena pode ir até oito anos.

O crime de corrupção ativa no setor privado é punida com pena de prisão até três anos ou com pena de multa. Segundo o artigo 9.º da Lei n.º 20/2008, de 21 de abril, destina-se a “quem por si ou, mediante o seu consentimento ou ratificação, por interposta pessoa der ou prometer a pessoa prevista no artigo anterior [trabalhador do setor privado], ou a terceiro com conhecimento daquela, vantagem patrimonial ou não patrimonial, que lhe não seja devida, para prosseguir o fim aí indicado”.

Mas se o comportamento criminal tiver como objetivo prejudicar a concorrência ou um prejuízo patrimonial para terceiros, o agente é punido com pena de prisão até cinco anos ou com pena de multa até 600 dias.

Por outro lado, no crime de corrupção passiva no setor privado (artigo 8.º da Lei n.º 20/2008, de 21 de abril), o trabalhador do setor privado que, por si ou, mediante o seu consentimento ou ratificação, por interposta pessoa, “solicitar ou aceitar, para si ou para terceiros, sem que lhe seja devida vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua promessa, para um qualquer ato ou omissão que constitua uma violação dos seus deveres funcionais é punido com pena de prisão até cinco anos ou com pena de multa até 600 dias”.

Caso o ato cause uma distorção da concorrência ou um prejuízo patrimonial a terceiros, o crime de corrupção passiva no setor privado pune o agente com pena de prisão de um oito anos.

Outro dos crimes em “cima da mesa” é o de branqueamento de capitais. Este crime é um processo que tem por objetivo a ocultação de bens, capitais ou produtos com a finalidade de lhes dar uma aparência final de legitimidade, procurando, assim, dissimular a origem criminosa de capitais, bens ou produtos. O agente que incorra neste crime é punido com pena de prisão de dois a doze anos, segundo o artigo 368.º-A/ do Código Penal (CP).

Ainda assim, a lei refere que quando houver reparação integral do dano causado ao ofendido, sem dano ilegítimo a um terceiro, a pena é especialmente atenuada.

Enquanto crime público, a falsificação ou contrafação de documentos (artigo 256.º do CP) pune o agente com pena de prisão até três anos ou com pena de multa. Neste crime está em causa a intenção do agente de “causar prejuízo a outra pessoa ou ao Estado”, de “obter para si ou para outra pessoa benefício ilegítimo”, ou de “preparar, facilitar, executar ou encobrir outro crime” através de várias formas, entre elas a de “fabricar ou elaborar documento falso” ou “abusar da assinatura de outra pessoa para falsificar ou contrafazer documento”.

Caso a falsificação recaia sobre documento autêntico ou com igual força, a testamento cerrado, a vale de correio, a letra de câmbio, a cheque ou a outra documento comercial transmissível por endosso, ou a qualquer outro título de crédito, a pena de prisão vai de seis meses a cinco anos e a pena de multa de 60 a 600 dias. Mas caso seja funcionário e o crime decorra no exercício das suas funções, o agente é punido com pena de prisão de um a cinco anos.

O quarto e último crime em causa nesta investigação é o de fraude fiscal qualificada, que segundo o artigo 104.º do Regime Geral das Infrações Tributárias, é punível com pena de prisão de um a cinco anos para pessoas singulares e multa de 240 a 1.200 dias para pessoas coletivas.

Constitui fraude fiscal as “condutas ilegítimas” que visem a não liquidação, entrega ou pagamento da prestação tributária ou a “obtenção indevida de benefícios fiscais, reembolsos ou outras vantagens patrimoniais suscetíveis de causarem diminuição das receitas tributárias”, lê-se no artigo 103.º do Regime Geral das Infrações Tributária

A fraude fiscal pode ter lugar por “ocultação ou alteração de factos ou valores que devam constar dos livros de contabilidade” ou das “declarações apresentadas ou prestadas a fim de que a administração fiscal especificamente fiscalize, determine, avalie ou controle a matéria coletável”; por “ocultação de factos ou valores não declarados e que devam ser revelados à administração tributária”, e ainda pela celebração de “negócio simulado”.

Uma vez que está em causa fraude qualificada, tem de estar ainda verificada uma das seguintes circunstâncias pelo agente: “tiver conluiado com terceiros que estejam sujeitos a obrigações acessórias para efeitos de fiscalização tributária”; “for funcionário público e tiver abusado gravemente das suas funções; “tiver socorrido do auxílio do funcionário público com grave abuso das suas funções”; “falsificar ou viciar, ocultar, destruir, inutilizar ou recusar entregar, exibir ou apresentar livros, programas ou ficheiros informáticos e quaisquer outros documentos ou elementos probatórios exigidos pela lei tributária”; “usar os livros ou quaisquer outros elementos referidos no número anterior sabendo-os falsificados ou viciados por terceiro; “tiver sido utilizada a interposição de pessoas singulares ou coletivas residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável”; “tiver conluiado com terceiros com os quais esteja em situação de relações especiais”.

A mesma pena de prisão, de um a cinco anos para pessoas singulares e multa de 240 a 1.200 dias para pessoas coletivas, é ainda aplicável quando a fraude tiver lugar mediante a utilização de faturas ou documentos equivalentes por operações inexistentes ou por valores diferentes ou ainda com a intervenção de pessoas ou entidades diversas das da operação subjacente.

Nesta investigação, o Ministério Público está a ser coadjuvado pela Autoridade Tributária e Aduaneira e Polícia de Segurança Pública.

Ao ECO fonte oficial da empresa confirmou as buscas. “A Altice confirma que foi uma das empresas objeto de buscas pelas autoridades em cumprimento de mandado do Ministério Público no âmbito de processo de investigação em curso. A Altice encontra-se a prestar toda a colaboração que lhe é solicitada. A Altice Portugal estará sempre disponível para quaisquer esclarecimentos”, disse.

Segundo a CNN, um dos visados será o cofundador Armando Pereira, que atualmente é responsável da Altice Europa, estando a ser realizadas buscas na sua quinta no Gerês. De acordo com o Correio da Manhã, as autoridades aproveitaram o facto de o número dois da Altice, que reside em França, se ter deslocado a Portugal de férias para o ouvirem e efetuarem estas diligências. O mesmo jornal diz que a casa de Hernâni Vaz Antunes, parceiro de negócios de Armando Pereira, também foi alvo de buscas.

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