Claudia Buch, a alemã de “mentalidade mais crítica” que vai supervisionar a banca europeia

  • Joana Abrantes Gomes
  • 16 Setembro 2023

Experiência da alemã no meio académico, na banca central, na estabilidade financeira e na gestão pesaram na escolha do Banco Central Europeu para dirigir o seu braço supervisor.

De professora universitária e diretora de um dos principais institutos alemães de investigação económica a membro do Conselho Alemão de Peritos Económicos e vice-presidente do Bundesbank, Claudia Maria Buch concentra grande parte da sua experiência profissional no meio académico.

Somente em março deste ano ganhou um lugar à mesa, enquanto representante da Alemanha, no Conselho de Supervisão do Banco Central Europeu (BCE), mas foi o suficiente para ganhar a corrida à candidata espanhola e ser a escolha para supervisionar mais de uma centena de bancos da Zona Euro.

A decisão foi anunciada na passada quarta-feira, num comunicado em que o BCE dá conta de que a votação (secreta) para o cargo de presidente do Conselho de Supervisão da instituição financeira registou “uma maioria a favor” da alemã. Será a segunda mulher a dirigir o braço supervisor do banco central, depois da francesa Danièle Nouy, que, entre 2014 e 2018, antecedeu o atual presidente, o italiano Andrea Enria.

Vista como uma disputa renhida, Claudia Buch derrotou Margarita Delgado, vice-governadora do Banco de Espanha, apesar de a comissão dos Assuntos Económicos e Monetários (ECON) do Parlamento Europeu, que em julho ouviu as duas candidatas à porta fechada, ter apoiado unanimemente a espanhola, segundo noticiou o jornal digital Politico esta quinta-feira.

“Não há dúvidas de que Claudia Buch é uma candidata altamente qualificada e com as competências adequadas para liderar o Mecanismo Único de Supervisão”, defendeu o eurodeputado alemão Markus Ferber, em declarações à Reuters, apontando, no entanto, que não deixa de ser “um pouco surpreendente” que o BCE tenha ido contra a recomendação do Parlamento Europeu.

De Paderborn a Frankfurt distam 48 anos

Nascida em março de 1966 (57 anos) em Paderborn, uma cidade no coração do maior centro industrial alemão, o estado de Renânia do Norte-Vestfália, Buch formou-se em Economia na Universidade de Bona (1985-1991), tendo obtido o Diplom-Volkswirtin (grau concedido na Alemanha a estudantes de Economia, equivalente a mestrado). Nesse período, concluiu um MBA (Master of Business Administration) de dois anos na Universidade de Wisconsin-Eau Claire, nos EUA.

Já com o “canudo” na mão, ingressou, ainda em 1991, no Programa de Estudos Avançados em Investigação de Política Económica Internacional no Instituto de Kiel para a Economia Mundial (IfW), onde, a partir de 1992, trabalhou como economista, com especialização na banca internacional e em regulação bancária, estabilidade financeira, integração financeira e investimento direto estrangeiro.

Depois do Doutoramento, concluído em 1996, na Universidade de Kiel, voltou ao IfW para liderar os grupos de investigação “Reformas Económicas na Europa Central e Oriental” (1996-1997) e “Mercados Financeiros” (1998-2001), tornando-se diretora desta última área até 2003. Buch adicionou ainda ao currículo um pós-doutoramento (2002), também em Kiel.

Claudia Buch

A carreira na docência, porém, teve início em 2004, mais a sul da Alemanha, na Universidade de Tübingen, como professora de Economia no curso de “Finanças Internacionais e Macroeconomia”. Até 2013, Claudia Buch foi ainda diretora do Instituto de Investigação Económica Aplicada (IAW) da mesma universidade, ano a partir do qual passou a lecionar na Universidade de Magdeburgo e presidiu ao Instituto de Investigação Económica (IWH) em Halle, um dos principais do país.

Entre 2008 e 2012, foi também presidente do Conselho Científico Consultivo do Ministério da Economia alemão e, nos dois anos seguintes, pertenceu ao Conselho Alemão de Peritos Económicos. Finalmente, em maio de 2014, Buch tornou-se vice-presidente do Deutsche Bundesbank, ficando responsável pelas áreas de supervisão bancária e financeira, estabilidade financeira, auditoria e administração, e membro do comité alemão de Estabilidade Financeira e da delegação do Bundesbank no G20 e no G7.

“Mentalidade mais crítica” para a supervisão bancária

São quase 40 anos, entre estudos e experiência académica e profissional, que estão na base da escolha do Banco Central Europeu para liderar o Mecanismo Único de Supervisão. Desde março que Claudia Buch se senta neste conselho, criado em 2014 em resposta à crise da dívida soberana que ameaçou o euro. A partir de 1 de janeiro do próximo ano, a alemã terá em mãos a supervisão das 110 maiores instituições financeiras da Zona Euro, que valem mais de 25 biliões de euros. Em Portugal, esta lista inclui a Caixa Geral de Depósitos, o Banco Comercial Português e o Novobanco– e o BPI e o Santander através das respetivas casas mãe.

Os especialistas argumentam que a principal tarefa no seu novo cargo será aperfeiçoar, e não revolucionar, a supervisão bancária, dando mais ênfase às características individuais dos bancos do que às regras gerais. No entanto, Buch já deixou algumas pistas do que esperar da sua liderança, que fazem antever uma abordagem mais rigorosa face a Enria.

Numa entrevista ao Financial Times, em julho, a candidata agora nomeada afirmou que era necessária uma “mentalidade mais crítica” na supervisão da banca, advertindo que esta ainda enfrenta riscos significativos devido às recentes perturbações macroeconómicas, designadamente a inflação elevada e a subida acentuada das taxas de juro.

Embora o setor, na Zona Euro, não tenha sofrido grande impacto com a turbulência bancária no início deste ano – que derrubou algumas instituições financeiras nos EUA e, na Europa, o Credit Suisse –, existe a possibilidade de criar-se um problema de estagflação, um período caracterizado por pouco ou nenhum crescimento económico, acompanhado de altas taxas de inflação.

Face às críticas dos bancos de que a supervisão se tornou dispendiosa e complicada, a tarefa de Claudia Buch poderá passar por simplificar o processo e, ao mesmo tempo, colocar a tónica nas alterações climáticas. Aliás, na entrevista ao jornal britânico, a vice-presidente do banco central alemão defendeu a necessidade de uma “mudança cultural” na supervisão bancária da Zona Euro, de modo a atrair mais pessoas “com um espírito crítico e que tomem as decisões necessárias para garantir que são tomadas medidas de supervisão”.

Buch tem agora pela frente uma audição pública na comissão dos Assuntos Económicos e Monetários do Parlamento Europeu, que terá de aprovar a escolha do BCE. Por fim, fica a faltar a confirmação do Conselho da União Europeia.

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