Ordem dos Advogados em tribunal. Brasileiros contestam fim do acordo para inscrição no estágio
Advogados brasileiros contestam fim de acordo de reciprocidade para inscrição na Ordem dos Advogados sem estágio. Uma decisão tomada por Fernanda de Almeida Pinheiro em julho.
A Associação dos Advogados Estrangeiros em Portugal (AEEP) avançou com ações judiciais contra a Ordem dos Advogados para exigir a nulidade da decisão que extinguiu, unilateralmente, o acordo que permitia a inscrição de profissionais brasileiros em Portugal sem necessidade de estágio.
A decisão da Ordem portuguesa, tomada pelo Conselho Geral a 3 de julho, pôs fim a um acordo de reciprocidade com a congénere brasileira, o qual permitia, que profissionais brasileiros se inscrevessem na Ordem dos Advogados (OA) portuguesa sem necessidade de fazer estágio ou de prestar provas de agregação, acontecendo o mesmo com os profissionais portugueses que se inscrevessem na Ordem brasileira.
As ações judiciais interpostas no início de dezembro pela AAEP e por cerca de 50 advogados brasileiros, de acordo com o comunicado divulgado, pretendem ver reconhecida pelos tribunais portugueses a ilegalidade da revogação do acordo bilateral que, explicou à Lusa a vice-presidente da AEEP, Kissila Valle, apenas podia acontecer por iniciativa legislativa da Assembleia da República, e não por decisão unilateral de uma das partes.
“Esta Associação entende que este regime de reciprocidade continua a vigorar na ordem jurídica interna portuguesa, pelo que a deliberação do Conselho Geral enferma de nulidade”, defende a AEEP em comunicado.
Em resposta à Lusa, a OA insiste na legitimidade da sua decisão, afirmando que “irá apresentar a competente defesa em tribunal, apresentando a sua posição quanto a esta matéria, a qual foi perfeitamente legal e legítima, tal como foi reconhecido pela sua congénere brasileira”.
“Realçamos que atualmente nenhum advogado brasileiro se encontra impedido de se inscrever na OA, podendo fazê-lo nos mesmos termos que qualquer outro advogado estrangeiro oriundo de país fora da União Europeia, sendo totalmente bem-vindo pela Ordem dos Advogados, desde que cumpra os requisitos necessários”, lê-se na resposta.
A OA afirma que na sequência da sua decisão a 03 de julho a Ordem dos Advogados do Brasil “fez igualmente cessar o acordo no dia 05 de julho”, mas Kissila Valle disse à Lusa que no Brasil o acordo se mantém em vigor, continuando a ser aceites inscrições de advogados portugueses, ao contrário do que acontece nos Conselhos Regionais da OA, como o Porto, que apesar de aceitar a documentação entregue pelos advogados brasileiros sublinha que a competência de confirmar a inscrição é do Conselho Geral.
Aos candidatos brasileiros que continuam a tentar a inscrição ao abrigo do acordo de reciprocidade, o Conselho Regional do Porto responde com a “intenção de indeferir” o pedido tendo por base ter sido apresentado depois de 05 de julho, data da efetivação da revogação unilateral do acordo, segundo um ofício a que a Lusa teve acesso.
De acordo com o comunicado da AEEP, a decisão em relação à inscrição de cerca de 100 advogados brasileiros “vem sendo arrastada pelos Conselhos Distritais da Ordem dos Advogados portugueses violando assim direitos fundamentais destes advogados brasileiros” e “o protelar destes processos” se explica com a vontade de aguardar pelo novo enquadramento jurídico das ordens profissionais.
Os novos estatutos, vetados pelo Presidente da República, mas que podem vir a ser confirmados pela Assembleia da República, preveem o fim do acordo de reciprocidade, o que leva Kissila Valle a afirmar que “indiretamente, a bastonária lutou pela manutenção do acordo” ao ter-se batido pelo veto presidencial.
Para a AEEP, o fim unilateral do acordo de reciprocidade é uma decisão que “mancha a história secular que une o povo brasileiro e o povo português configurando um dos episódios mais tristes e menos edificantes na relação entre os dois países que se dizem ‘irmãos’”.
A AEEP, para além das ações em tribunal, pretende agendar novas reuniões com a Embaixada do Brasil em Portugal e com a Ordem brasileira, “esperando da parte destas entidades uma tomada de posição clara, firme de veemente repúdio a este comportamento unilateral por parte da Ordem dos Advogados portuguesa”, tendo Kissila Valle sublinhado que existem cerca de dois mil advogados portugueses inscritos no Brasil.
Em julho, a decisão da OA motivou duras críticas do presidente da Ordem dos Advogados brasileira, tendo a bastonária da AO, Fernanda de Almeida Pinheiro rejeitado as acusações de colonialismo e discriminação feitas pelo homólogo brasileiro, após a denúncia unilateral pela entidade portuguesa do acordo de reciprocidade que existia entre ordens de Portugal e Brasil.
Beto Simonetti, que disse que “a mentalidade colonial já foi derrotada e só encontra lugar nos livros de história”, falando em “discriminação e preconceito” contra profissionais brasileiros.
A bastonária da OA justificou o fim do acordo com as crescentes diferenças entre a legislação dos dois países, argumentando ainda que o acordo “estava a ser utilizado de forma distorcida” por advogados brasileiros, que, uma vez detentores de uma cédula profissional portuguesa, procuravam outros Estados-membros da União Europeia para exercer advocacia.
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