BRANDS' CAPITAL VERDE Pires de Lima: “Temos apenas seis anos para fazer a transformação acontecer”

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  • 5 Julho 2024

Presidente do BCSD Portugal assinalou a urgência de acelerar a neutralidade carbónica, lembrando que as empresas devem ter em conta os riscos e oportunidades da sustentabilidade no seu negócio.

O relógio não para e a cada volta que o ponteiro dá, há mais emissões de gases com efeito de estufa que viajam até à atmosfera. E o calendário definido pela Comissão Europeia para a neutralidade carbónica é claro: reduzir 55% das emissões até ao final desta década, antes de atingir a neutralidade em 2050 (2045 no caso português). “Na Europa, estamos a fazer um trajeto que gostávamos que fosse um exemplo para o mundo, porque as nossas emissões, entre 1990 e 2021, reduziram-se 30% e, entre 2005 e 2021, 14%”, começou por enquadrar António Pires de Lima na abertura da Conferência BCSD Portugal 2024, que decorreu dia 3 na Cordoaria Nacional, em Lisboa.

O presidente do BCSD lamenta “o ritmo ainda insuficiente de redução”, em particular fora da Europa, mas destaca a evolução positiva de Portugal nesta matéria. “Depois de ter atingido um pico em 2005, tem vindo a reduzir de forma significativa e constante as emissões de gases com efeito de estufa. Conhecemos uma redução de um terço desde 2005”, apontou. Porém, faltam “ainda dois terços de caminho” que é preciso percorrer com cada vez mais celeridade.

Empresas onde a diversidade é uma regra, há maior competitividade e melhores resultados

António Pires de Lima

Presidente do BCSD Portugal

Na Europa, que “anda com o mundo às costas” em matéria de sustentabilidade, a transição energética está a dar frutos num esforço em que Portugal se tem afirmado. Vale a pena lembrar que, em 2023, 61% da energia teve origem em produção renovável, tendo sido possível, durante seis dias seguidos, assegurar todo o consumo nacional. O desafio, porém, está no setor dos transportes.
“Hoje, [os transportes] valem 30% [das emissões], em 2023, e há uns anos o peso dos transportes nas emissões era inferior a 20%. É o único setor que tem vindo a aumentar em número absoluto de emissões. Todos têm diminuído as suas emissões, até a indústria e a agricultura”, afirma Pires de Lima.

A este nível, o também líder do grupo Brisa identifica duas prioridades: a transição para a mobilidade elétrica, com o aumento de carregadores disponíveis em todo o país, e um compromisso sério com a ferrovia. “Há um mix de políticas públicas que, do nosso ponto de vista, não tem sido suficientemente ambicioso, tanto na execução da ferrovia como na transição para a mobilidade elétrica do automóvel, para assegurar que o setor dos transportes diminui substancialmente a sua pegada carbónica”, reitera.

Empresas como game changers

Além das questões ambientais em que a atividade do BCSD Portugal – que conta já com 191 associados – se centra, os outros domínios da sigla ESG têm ganho cada vez mais preponderância. Num estudo levado a cabo com a EY, o BCSD Portugal concluiu que, entre os seus associados, o acesso “é razoavelmente paritário”, mas Pires de Lima sublinha que “as mulheres continuam a ser tratadas, em alguns caos, de forma diferente”.

Quando o tema são promoções, apenas um terço diz respeito às trabalhadoras – ainda que representem 50% da força laboral – e continua a existir maior número de “homens em funções de liderança do que mulheres”. “A distribuição de funções de topo é cerca de três quartos de homens e um quarto de mulheres”, exemplifica o presidente. As disparidades salariais, mesmo entre as empresas que compõem a associação, “podem ir entre 0% e 20% e não estão justificadas por competências diferentes e experiências diferentes”. O caminho, lembra Pires de Lima, deve ser feito em direção à paridade e diversidade porque “empresas onde a diversidade é uma regra, há maior competitividade e melhores resultados”. “Temos apenas seis anos para fazer a transformação acontecer. Sabemos o que fazer e temos de o fazer já”, rematou.

Reconhecer o privilégio é o primeiro passo

João Günther Amaral, Chief Development Officer da Sonae, assume que despertou para o tema da diversidade e inclusão nos locais de trabalho em 2019, quando percebeu que “tinha dois blindspots enormes” e um deles era “o privilégio”. “Apercebi-me que tendo 50 anos, sendo branco, sendo homem heterossexual, vindo de uma família de classe média alta, que me tinha sido entregue, desde muito cedo, uma oportunidade diferente da que é entregue a todas as outras pessoas. Se não fosse branco, se não fosse homem, se não tivesse tido a oportunidade que tive, tinha sido muito mais difícil”, acredita.

Alinhado com as políticas do grupo, liderado por Cláudia Azevedo, Günther Amaral tem procurado implementar medidas que promovam a diversidade entre os colaboradores. “Estamos a trabalhar claramente o eixo do género. Queremos chegar a 2026 com 45% de mulheres nos cargos de liderança da empresa toda. Partimos de 32% em 2019, estamos hoje nos 40%”, destaca. Em simultâneo, a organização está a trabalhar as dimensões das culturas, deficiências, gerações e da comunidade LGBTQIA+, mas o trabalho nem sempre é fácil. “É preciso criar exemplos positivos, é preciso passar pelas dores de cometer erros e comunicá-los. Isto leva-nos a um caminho de aprendizagem”, assegura.

No Grupo Nabeiro, existe também um esforço para criar ambientes de trabalho mais diversos. “Temos uma força de vendas muito masculina, mas temos outras áreas em que é o oposto. As áreas de marketing são mais femininas. Temos vindo a fazer um percurso que é hoje mais equilibrado”, garante Rita Nabeiro, CEO da Adega Mayor.

Carlos Mota Santos, CEO do Grupo Mota-Engil, atua num setor tradicionalmente dominado por homens, mas lembra que se trata de “uma empresa familiar” e de “uma família matriarcal”. O objetivo, diz, é atingir 30% de mulheres em cargos de gestão até 2026 e sublinha que os programas para a promoção de igualdade dentro de portas são comuns a todas as 30 geografias em que a organização está presente.

Financiar a economia sustentável

A nível comunitário, o Banco Europeu de Investimento (EIB na sigla em inglês) tem “metade” dos 88 mil milhões de que dispõe para “encaminhar para a transição energética e redução de emissões”, assegura João Fonseca Santos, responsável da instituição em Portugal. A entidade, detida pelos 27 Estados-membros, trabalha em parceria com bancos e outras organizações para financiar projetos inovadores e, muitas vezes, ideias disruptivas com maior risco. “Conseguimos financiar projetos com maior risco que normalmente os bancos tradicionais não conseguem, pelo menos com as mesmas condições”, aponta, reiterando o compromisso de apoiar as empresas nacionais rumo à sustentabilidade.

Pretendemos criar uma comunidade que faça tudo aquilo que o BCSD Portugal já faz: que colabore, que partilhe boas práticas, que se junte, que desenhe soluções de forma colaborativa

Filipa Pantaleão

Secretária-geral do BCSD Portugal

“Temos um desafio enorme pela frente. Acho mesmo que as parcerias são a única forma de conseguirmos avançar nestes temas”, perspetiva Ursula Woodburn, diretora do CISL Europe. Embora consciente da complexidade do caminho, Woodburn defende que é preciso que todos contribuam mesmo que os objetivos do Acordo de Paris comecem a parecer difíceis de atingir. “Temos de reconhecer que fomos muito longe. Isso deve continuar a motivar-nos para avançarmos nesta frente”, diz.

Programa de aceleração da sustentabilidade

Filipa Pantaleão, secretária-geral do BCSD Portugal desde o início do ano, apresentou a iniciativa CSOCircle, uma comunidade que reúne profissionais que atualmente ocupam o cargo de Chief Sustainability Officer (CSO) ou similares, para ajudar as empresas a impulsionar a sua estratégia de ESG.

“Sabemos que é importante. Existe uma nova função, os CSO, muito recentemente criada e é importante porque vai permitir não só desenhar a governança de forma mais ativa, mas trabalhar em espírito de comunidade”, explicou a responsável. “Pretendemos criar uma comunidade que faça tudo aquilo que o BCSD Portugal já faz: que colabore, que partilhe boas práticas, que se junte, que desenhe soluções de forma colaborativa”, detalhou Filipa Pantaleão.

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