CIP critica “amarras” dos prémios isentos de IRS. UGT avisa para risco de “cavalo de Troia”

Prémios de produtividade isentos de IRS foram uma das medidas da CIP que o Governo acolheu no novo acordo de Concertação, mas Armindo Monteiro critica condições. Já a UGT defende-as.

Depois de um ano a reivindicá-lo, a Confederação Empresarial de Portugal (CIP) conseguiu que a isenção fiscal dos prémios de produtividade fosse acolhida pelo Governo. Mas ficaram estipuladas condições que não agradam aos empregadores. “Amarra” foi mesmo a palavra escolhida pelo presidente da CIP, Armindo Monteiro, para descrever esta quarta-feira esses requisitos, na Conferência Anual do Trabalho, promovida pelo ECO. Já do lado dos trabalhadores, Sérgio Monte, secretário-geral adjunto da UGT, deixou claro que esses “travões” são importantes, para que os prémios não sirvam de “cavalos de Troia” e para que não desincentivem os aumentos salariais.

“Era importante haver a possibilidade de as empresas pagarem ao trabalhador prémios de produtividade. Mas se estabelecemos a regra de que é preciso, primeiro, aumentar todos os trabalhadores por igual coloca-se uma amarra“, sublinhou o patrão dos patrões, num painel dedicado ao novo acordo tripartido sobre valorização salarial e crescimento económico.

De acordo com a proposta de Orçamento do Estado para 2025, os prémios de produtividade estão isentos de IRS e de contribuições sociais apenas se o empregador aumentar o seu salário médio em, pelo menos, 4,7%, e se for essa também a subida média dos ordenados que estão, neste momento, abaixo da média da empresa.

São essas condições que o presidente da CIP critica, atirando que, no Estado, estão a ser negociados reforços remuneratórios em torno de 2%, enquanto no setor privado o referencial é mais do dobro (4,7%).

Este prémio não pode substituir aumentos salariais. Por isso, a nossa proposta é que todos os trabalhadores com este prémio teriam de ter, primeiro, um aumento salarial. O que não faz sentido é ter de aumentar todos para atribuir um prémio a alguns. Estamos a impedir que alguns que têm um bom desempenho tenham o prémio“, alertou o presidente da CIP.

Em contraste, o secretário-geral adjunto da UGT alertou que “o ideal” seria as empresas terem regulamentos internos que assegurassem que os prémios são avaliados e atribuídos de forma o mais objetiva possível, não sendo, porém, essa a realidade portuguesa. “Os prémios e a avaliação de desempenho são arbitrários, são irregulares, são quando a empresa quer”, argumentou Sérgio Monte, que salientou que haveria também o risco de os empregadores usarem estes prémios isentos de IRS como “cavalo de Troia”.

O risco que há aqui, e sabemos da capacidade inventiva dos negociadores no terreno, é que esta rubrica pecuniária pudesse ser um cavalo de Troia, que no futuro canalizassem para aí os aumentos porque estão isentos de impostos e contribuições.

Sérgio Monte

Secretário-geral adjunto da UGT

“O risco que há aqui, e sabemos da capacidade inventiva dos negociadores no terreno, é que esta rubrica pecuniária pudesse ser um cavalo de Troia, que no futuro canalizassem para aí os aumentos porque estão isentos de impostos e contribuições“, afirmou.

E, em resposta à intervenção de Armindo Monteiro, deu o exemplo do setor bancário – que foi “ajudado por todos nós” – e agora que está “a dar lucros, está a oferecer aos trabalhadores [aumentos de] 3%“.

Já o advogado David Carvalho Martins, fundador e managing partner da DCM Littler, defendeu que, ainda que perceba as preocupações dos sindicatos, poderia ter ficado salvaguardado de outro modo que o prémio não será confundido com aumentos salariais. “Esse travão já estaria na outra medida do salário médio”, explicou.

“Tudo o que sejam prestações extraordinárias, todo este esforço adicional, devia haver do lado do Estado uma visão mais amigável na tributação“, assinalou o mesmo, referindo-se não apenas aos prémios, mas também ao trabalho suplementar.

Salário médio mais longe do mínimo?

Da esquerda para a direita, Sérgio Monte, secretário-geral adjunto da UGT, Armindo Monteiro, presidente da CIP, e David Carvalho Martins, managing partner da DCM Littler, intervêm num painel da Conferência Anual do Trabalho by ECO.

A isenção fiscal dos prémios de produtividade foi uma das medidas que ficou no novo acordo tripartido sobre valorização salarial e crescimento económico, ao qual o secretário-geral adjunto da UGT deixou elogios, esta quarta-feira. “Estamos satisfeitos com este acordo e esperamos que dinamize a negociação coletiva”, disse Sérgio Monte, na conferência promovida pelo ECO.

Na visão deste sindicalista, o entendimento vai contribuir para que se contrarie o achatamento entre o salário mínimo e o salário médio, tendo destacado que uma novidade positiva é que os referenciais para os aumentos remuneratórios passarão a ser aplicado diretamente nas tabelas, em vez de na massa salarial.

Se não tivéssemos a perspetiva de que é o ponto de partida, não teríamos aderido ao acordo, porque, como está, peca em ambição, em necessidade e no sentido de oportunidade.

Armindo Monteiro

Presidente da CIP

Já da parte da CIP, Armindo Monteiro começou por frisar que, em qualquer acordo, é preciso confiança, compromisso e concretização, deixando claro que, se não tivesse a perspetiva que este entendimento é “um ponto de partida”, a confederação que lidera teria voltado a ficar de fora. “Não teríamos aderido, porque o acordo, como está, peca em ambição, em necessidade e no sentido de oportunidade“, declarou o patrão dos patrões.

Armindo Monteiro aproveitou ainda para deixar o recado que o atual desenho do acordo traz “uma evolução tímida nalguns casos e noutros casos mais uma lógica de fixar clientelas eleitorais do que desenvolver a economia como é preciso“.

E se o cenário político fosse outro, garante a CIP, teria sido mais exigente. “Nesta negociação, sentimos que havia um quarto elemento, que foi o Parlamento. O Governo não tinha a disponibilidade negocial, porque não tem a maioria parlamentar. Por isso, os parceiros sociais deram uma latitude bastante grande para que seja possível encontrar esta maioria parlamentar“, sublinhou, numa altura em que a viabilização do Orçamento do Estado para o próximo ano continua por garantir.

Temos um acordo amplo e que deve ser ouvido pelos agentes políticos. Deve fazê-los refletir.

David Carvalho Martins

Fundador da DCM Littler

Por sua vez, David Carvalho Martins deixou elogios ao acordo, dizendo que o país está melhor com ele do que sem ele, e apelou a que os agentes políticos olhem para ele. “Deve fazê-los refletir sobre as soluções aqui encontradas. E naturalmente que será bom haver Orçamento para as implementar“, realçou.

Ainda assim, notou que há margem para melhorias. Por exemplo, há um conjunto de prestações laborais que “ainda são muito penalizadas em termos fiscais”, como o já referido trabalho suplementar. Além disso, o advogado entende que, quanto às compensações pelo teletrabalho, podia também haver aqui uma oportunidade para as rever.

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