Presidente da ATP defende que Portugal “não está condenado a ser um país de baixo rendimento e pouca criação de riqueza”

Para resolver problema do salário médio é preciso que as empresas ganhem dimensão, mas enquadramento hoje não incentiva esse crescimento. Diagnóstico foi feito por Mário Jorge Machado e Pedro Brinca.

O presidente da Associação Têxtil e Vestuário de Portugal (ATP), Mário Jorge Machado, defendeu esta quarta-feira que Portugal “não está condenado” a ser um país de “baixo rendimento e pouca criação de riqueza”, mas alertou que para fazer a economia crescer e os salários aumentar são precisas reformas, nomeadamente na fiscalidade e na lei do trabalho.

Na Conferência Anual do Trabalho, que foi promovida pelo ECO, também o economista Pedro Brinca sublinhou que os portugueses não são “geneticamente inferiores do ponto de vista da capacidade de criar riqueza”, mas em termos culturais e políticos há entraves a isso, argumentou.

Não estamos condenados a ser um país de baixo rendimento e pouca criação de riqueza. Mas já vimos em muitos locais que somos, sobretudo, resultado do contexto em que estamos“, salientou Mário Jorge Machado, num painel dedicado ao crescimento do salário médio em Portugal.

O também administrador da Estamparia Adalberto precisou que “os empresários e os trabalhadores são diretamente impactados pelo contexto legislativo que o país tem”, referindo-se, nomeadamente, à lei do trabalho, aos acordos que são feitos na Concertação Social e à fiscalidade.

No que diz respeito especificamente à lei do trabalho, o responsável defendeu a introdução de flexibilidade, frisando que hoje, num mercado de trabalho rígido, mais de 90% dos trabalhadores estão na mesma empresa há mais de três anos, ainda que as maiores oportunidades de aumentos salariais estejam, regra geral, associadas às mudanças de emprego.

“Na questão laboral, precisávamos de flexissegurança, porque as pessoas têm de sair de um trabalho, mas também têm de ter apoio para quando ficam sem emprego“, acrescentou o presidente da ATP.

Temos um tecido empresarial extremamente atomizado. Se a Europa compara mal com os Estados Unidos, Portugal compara de forma catastrófica com a União Europeia.

Pedro Brinca

Economista

Já Pedro Brinca, economista e professor da Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa (Nova SBE), chamou a atenção para a dimensão das empresas. “Temos um tecido empresarial extremamente atomizado. Se a Europa compara mal com os Estados Unidos, Portugal compara de forma catastrófica com a União Europeia. Temos mais 50% de emprego em microempresas que a média europeia”, realçou o especialista.

E de que modo é que isso impacta os salários? Ora, enquanto o valor acrescentado bruto médio de um trabalhador numa microempresa é de 21 mil euros, numa grande empresa é de 84 mil euros, explicou o economista. “Os empregos que de facto pagam bem estão nas grandes empresas“, notou Pedro Brinca.

E atirou: “Não estamos condenados ao fado de baixos salários e de baixa produtividade, mas é como aquela pessoa que pede a Deus para ganhar a lotaria, e Deus um dia diz-lhe para comprar o bilhete. Se queremos subir salários, temos de fazer por isso“.

Na mesma linha, Mário Jorge Machado vincou que hoje “vemos um discurso muitas vezes virado contra os grandes grupos económicos“, quando a tendência deveria ser a oposta.

É ridículo um país ter apenas 1.300 grandes empresas. É ridículo que este país não permita que as empresas cresçam para que sejam grandes.

Mário Jorge Machado

Presidente da ATP

É ridículo um país ter apenas 1.300 grandes empresas. É ridículo que este país não permita que as empresas cresçam para que sejam grandes“, enfatizou o presidente da ATP, que adiantou que, enquanto nas grandes empresas o salário médio ronda os dois mil euros, mas empresas com menos de 100 trabalhadores anda em torno de mil euros.

Para resolver o problema da escala empresarial, Pedro Brinca recomendou uma reflexão sobre o enquadramento fiscal. Como está, hoje a mensagem é que “ganhar escala não compensa”, disse.

“Se calhar, o melhor seria mesmo OE cair e haver eleições”

Com a viabilização do Orçamento do Estado para 2025 ainda por garantir, o economista Pedro Brinca projetou, na conferência promovida pelo ECO, que o país arrisca ficar com “uma espécie de Orçamento que nem é carne, nem é peixe”, uma vez que as “principais medidas emblemáticas” já caíram.

Pior, essa poderá ser a tónica para o resto da legislatura, daí que entenda que, “se calhar, o melhor seria o Orçamento do Estado cair e haver eleições legislativas”, novamente.

“Existe uma narrativa sobre as responsabilidades desta falta de estabilidade. Podia ser que essa narrativa produzisse um Parlamento com uma maioria estável, que conseguisse ter a força para ter as políticas que são precisas“, sublinhou.

Por sua vez, o presidente da ATP prevê que esta “será uma legislatura que vai acontecer pouca mudança”. “Haver uma clarificação em termos de dar oportunidade a quem quer mudar, vejo como muito positivo. As eleições são sempre uma altura para os portugueses dizerem se querem ou não fazer mudanças“, rematou.

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