Indústria pede estímulos ao investimento nos mercados de capitais. “É preciso fechar os olhos e andar para a frente”

Indústria financeira alerta para a necessidade de promover medidas que promovam o acesso ao mercado de capitais e incentivem as famílias a desviar parte do dinheiro dos depósitos para a bolsa.

Um mercado de capitais desenvolvido pode reforçar a capacidade de financiamento das empresas e aumentar a produtividade, promovendo o crescimento do país e a riqueza das famílias, conclui um novo estudo independente sobre a dinamização do mercado de capitais em Portugal, encomendado pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) a um consórcio composto por três universidades. Estas conclusões foram recebidas pelos representantes do mercado com uma sensação de déjà vu, que pedem a tomada de decisões por parte do Governo para incentivar o recurso ao mercado pelas empresas e famílias.

“Cada vez que nós falamos com o Governo sobre isto, visitam, pensam no problema do benefício e de perda de impostos, mas de facto é preciso fechar os olhos e andar para a frente e dar de facto estímulos a este desenvolvimento, quer do mercado tributário, quer dos fiscais, quer de outras medidas”, defendeu João Pratas, presidente da Associação Portuguesa de Fundos de Investimento, Pensões e Patrimónios (APFIPP), a falar na conferência organizada pela CMVM esta quinta-feira na cidade de Braga, por ocasião da divulgação de estudo sobre a dinamização do mercado de capitais em Portugal.

Cada vez que nós falamos com o Governo sobre isto, visitam, pensam no problema do benefício e de perda de impostos, mas de facto é preciso fechar os olhos e andar para a frente e dar de facto estímulos a este desenvolvimento, quer do mercado tributário, quer dos fiscais, quer de outras medidas.

João Pratas

Presidente da APFIPP

O responsável pela associação que representa a indústria de fundos em Portugal, que contava com 21,4 mil milhões de euros em ativos sob gestão no final de março, alerta que é preciso trazer as pessoas para o mercado de capitais. “É preciso desviar parte do montante enorme que temos em depósitos, à ordem e a prazo, para uma coisa mais produtiva para a economia”, argumenta.

João Pratas afirma que o “desenvolvimento de fundos de pensões é extremamente importante, porque são investimentos a muito longo prazo, que as pessoas não mexem”, o que, diz, “é importantíssimo”, porque por um lado dá um reforço para a reforma, e por outro “é importante para dar estabilidade aos mercados financeiros”, uma vez que as pessoas não irão resgatar os investimentos ao mínimo sinal de alerta.

“Há uma sensação de déjà vu, aquele relatório apresentado, o relatório que nós fizemos quando eu estava no Governo. Quando fizemos o Capitalizar, detetámos muitos destes problemas”, referiu Manuel Caldeira Cabral, presidente do conselho estratégico da Startup Portugal e antigo ministro da Economia. Quanto a medidas que podem ser implementadas para incentivar o desenvolvimento do mercado, o ex-ministro concorda que não basta uma medida e lamenta que, enquanto esteve no governo, não se tenha ido mais longe, reconhecendo que as questões fiscais “são importantes”. “Há boas intenções e há depois o que se pode fazer”, acrescentou.

Manuel Caldeira Cabral, antigo ministro da Economia.Hugo Amaral

Caldeira Cabral reforçou que “é preciso que fundos como os fundos de pensões possam investir mais, por exemplo, em capital de risco”, destacou, acrescentando que “é preciso, por exemplo, que mesmo o Fundo de Segurança Social possa investir mais em ações e também em ações portuguesas”.

O responsável lembrou ainda que na nesta fase “de transição”, “a meio da ponte”, é preciso “um financiamento diferente para fazer coisas diferentes”. “A banca é muito boa a financiar quem já tem ativos, quem já tem um historial de crescimento”, não para uma empresa que quer triplicar em três anos, exemplificou, acrescentando: “O mercado de capitais é uma alavanca muito importante e também o capital de risco para as startups, para as empresas de crescimento rápido e com forte risco.”

A vantagem de estar no mercado é simplesmente a vantagem de conseguir aceder ao maior recurso produtivo, nas melhores condições.

Maria João Carioca

Co-CEO da Galp Energia

Em representação das empresas cotadas, Maria João Carioca, co-CEO da Galp Energia, defendeu as vantagens do capital. “Uma empresa precisa de capital. Pode dizer que faz a gestão apenas com recurso a capitais pessoais, capitais pessoais com capitais próprios, pode ignorar que a gestão de uma empresa apenas com capitais próprios sem introduzir dívida lhe dá um custo fiscal que se calhar se o conseguisse dimensionar não incorreria. Pode fazer tudo isso, mas uma empresa que tem um horizonte de crescimento, um horizonte temporal de investimento alongado, uma presença em setores com algum nível de risco — e não há setor económico que não tenha risco, todos eles têm –, uma empresa que tenha uma visão a prazo, precisa ter acesso a capitais próprios”, defendeu.

“Portanto, a vantagem de estar no mercado é simplesmente a vantagem de conseguir aceder ao maior recurso produtivo, nas melhores condições“, concluiu.

Ricardo Rio, Presidente da Câmara Municipal de BragaHugo Amaral/ECO

Ricardo Rio, presidente da Câmara Municipal de Braga, concordou que o mercado de capitais “tem que ser um veículo de apoio ao desenvolvimento da atividade económica, seja para fins de potenciar a inovação, seja para desenvolver todas as atividades, por exemplo, para concretizar os seus objetivos”. No entanto, o autarca reconheceu que os grupos empresariais portugueses têm revelado pouco interesse no mercado.

A título de exemplo, Rio realçou que há “cerca de 41 grupos económicos, 350 empresas, só no concelho de Braga, que por si só representam quase 4% do volume de exportações nacional”, com quase 30 mil empregos, volumes de faturação de perto de seis mil milhões de euros, volumes de exportações de mais de três mil milhões de euros, “e retirando mesmo deste grupo algumas das empresas, sendo as de maior dimensão, que tem obviamente uma dimensão internacional e que não estão presentes no mercado português, portanto que se financiam nos seus mercados de origem, as outras empresas, quase sem exceção, não têm uma ligação direta através do financiamento ao mercado de capitais”, lamentou.

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