Portugal deu bónus fiscal de 23,5 milhões a combustíveis derivados de óleo de palma

Já proibidos em vários países, os biocombustíveis à base de óleo de palma e derivados estão a crescer em Portugal. E desde o ano passado com direito a benefício fiscal.

Portugal atribuiu benefícios fiscais a 45,8 milhões de litros de biocombustíveis obtidos a partir de resíduos de óleo de palma em 2022, cuja produção é uma das principais causas da desflorestação e perda de habitats no planeta.

De acordo com dados do Laboratório Nacional de Engenharia e Biologia, que é a entidade responsável pelo cumprimento da certificação da sustentabilidade dos biocombustíveis, foram importados 38,23 milhões de litros produzidos a partir de efluentes de palma e 7,17 milhões a partir de cachos de palma vazios. A estes valores soma-se ainda uma pequena quantidade (362 mil litros) produzida em Portugal a partir de efluentes de palma.

Todo este biocombustível, que é incorporado no gasóleo, beneficiou de uma isenção do Imposto Sobre Produtos Petrolíferos, Contribuição do Serviço Rodoviário e Taxa de Carbono, num total de 0,51335 por litro. O que significa que o bónus fiscal foi de 23,5 milhões de euros.

Os cachos vazios e a água residual produzida no processo de obtenção do óleo de palma (efluentes) integraram em janeiro do ano passado a lista das chamadas matérias-primas avançadas, onde são usados resíduos em vez de matérias-primas agrícolas, com o Decreto-Lei n.º 8/2021. As mexidas na legislação visaram a correta transposição de alguns artigos da diretiva europeia 2009/28, sobre a promoção da utilização de energia proveniente de fontes renováveis. Ou seja, foi a pressão da Comissão Europeia que obrigou a mudar as regras.

Esta não foi a única alteração. O Orçamento do Estado de 2021 (OE2021) mexeu no artigo 90.º do Código dos Impostos Especiais de Consumo, concedendo a isenção total de imposto para os biocombustíveis avançados e para os gases de origem renovável. O benefício fiscal incentivou a importação, que duplicou no ano passado para 72.618 milhões de litros. Destes, 62,5% corresponderam a biocombustíveis derivados de óleo de palma.

Além das quantidades já referidas, há 22,5 milhões de litros de combustível com base em oleína de palma (sem direito a benefício fiscal), dos quais 12,7 milhões são referentes a importações e 9,7 milhões a produção nacional. Ao todo foram 68,3 milhões de litros com origem em óleo de palma e subprodutos.

Uma evolução que vai até contra o artigo 318º da lei do Orçamento do Estado daquele ano, onde se diz que o “Governo diligencia no sentido de restringir a produção e comercialização de combustíveis ou biocombustíveis que contenham óleo de palma ou outras culturas alimentares insustentáveis a partir de 1 de janeiro de 2022, promovendo a utilização de biocombustíveis sustentáveis, como a reciclagem de óleos alimentares usados”. No entanto, não foi criada qualquer disposição legal neste sentido.

A associação ambientalista Zero divulgou no final de dezembro um comunicado onde afirma que o “Governo não cumpriu a promessa inscrita no Orçamento de Estado para 2021 de restrição à produção e comércio de biocombustíveis a partir de óleo de palma”. E dá o exemplo dos Países Baixos, Áustria, Dinamarca e França como países que baniram o uso do óleo de palma para a produção de biocombustíveis. A Alemanha vai introduzir a proibição em 2023.

A segunda diretiva das energias renováveis (REDII), que deveria ter sido transposta até 1 de julho de 2021, vem desincentivar o uso do óleo de palma e soja, ao categorizá-los como tendo um elevado risco de provocar desflorestação e emitirem mais gases com efeito de estufa do que os combustíveis fósseis.

Esta não foi a única evolução que contrariou a intenção original do Governo. O relatório do 0E2021 justifica as isenções fiscais para os biocombustíveis avançados com o menor impacto ambiental e a “valorização dos recursos nacionais e a redução das importações”. Aconteceu exatamente o oposto, com a já mencionada duplicação das compras ao exterior entre 2020 e 2021.

“Não sendo ilegal, não era certamente o objetivo do legislador”, aponta Jaime Braga, secretário-geral da Associação Portuguesa de Produtores de Biocombustíveis. “Há melhores formas de aplicar o dinheiro do Estado”, acrescenta, recomendando uma alteração à legislação.

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