TC vai analisar arguição da PGR que defende anulação do acórdão sobre metadados
O Tribunal Constitucional irá analisar a arguição da Procuradora-geral da República em que é defendida a nulidade da decisão daquele tribunal sobre a lei dos metadados e depois proferir uma decisão.
O Tribunal Constitucional irá analisar a arguição da Procuradora-geral da República em que é defendida a nulidade da decisão daquele tribunal sobre a lei dos metadados e depois proferir uma decisão, disse à Lusa fonte oficial.
“O Tribunal Constitucional confirma que deu entrada uma arguição de nulidade da autoria da Procuradora-Geral da República relativa ao Acórdão n.º 268/2022 (Processo n.º 828/2019). O processo está a correr os seus termos e será proferida uma decisão”, informou fonte oficial do Palácio Ratton.
A procuradora-geral da República, Lucília Gago, defendeu na segunda-feira que a decisão do Tribunal Constitucional (TC) sobre a lei dos metadados é nula, por entender haver “contradição entre a fundamentação e o juízo de inconstitucionalidade”.
“A procuradora-geral da República arguiu a nulidade da decisão em referência por considerar existir contradição entre a fundamentação e o juízo de inconstitucionalidade que recaiu sobre o art.º 4º da Lei n.º 32/2008 de 17 de julho, em particular no que concerne à conservação dos dados de base e IP”, lê-se numa resposta da PGR enviada à Lusa.
A notícia foi avançada pelo Público, que refere que Lucília Gago, representante máxima do Ministério Público, numa decisão rara, assinou uma peça processual, remetida esta terça-feira ao TC, na qual defende a nulidade da decisão deste tribunal relativa à lei dos metadados, que impõe a proibição com efeitos retroativos de recolha deste tipo de informação para investigação criminal.
“Complementarmente, requereu a nulidade da decisão por omissão de pronúncia sobre a fixação de limites aos efeitos da mesma, requerendo que seja declarada a eficácia apenas para o futuro”, adianta ainda a nota da PGR.
O TC anunciou em 27 de abril ter declarado inconstitucionais as normas da chamada “lei dos metadados” que determinam a conservação dos dados de tráfego e localização das comunicações pelo período de um ano, visando a sua eventual utilização na investigação criminal.
Num acórdão proferido no dia 19, o TC entendeu que guardar os dados de tráfego e localização de todas as pessoas, de forma generalizada, “restringe de modo desproporcionado os direitos à reserva da intimidade da vida privada e à autodeterminação informativa”.
O possível impacto desta decisão nos processos com recurso a metadados na investigação criminal desde 2008 está já a ser questionado por diferentes agentes do setor judiciário e foi inclusivamente comentado pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que sublinhou a posição “muito firme” dos juízes do TC.
“O problema é o seguinte, o Tribunal Constitucional entende que a Constituição é muito fechada. Quando ela foi aprovada era muito fechada e muito restritiva e, portanto, tem mantido em sucessivas decisões uma posição muito firme que é não permitir uma lei que dê o acesso aos chamados metadados para efeitos de investigação criminal internacional”, disse Marcelo Rebelo de Sousa.
Já esta terça-feira, o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) tinha defendido que a decisão do TC vinha impossibilitar a investigação criminal, nomeadamente no que diz respeito aos crimes informáticos, acusando ainda o TC de desproteger as vítimas destes crimes.
Por outro lado, o bastonário da Ordem dos Advogados, Luís Menezes Leitão, rebateu as críticas às possíveis consequências do acórdão do TC sobre o uso de metadados e lembrou que a investigação criminal tem de respeitar a Constituição.
Governo a analisar efeitos práticos e jurídicos
Por sua vez, o Ministério da Justiça informou estar a analisar “do ponto de vista prático e jurídico” o acórdão do Tribunal Constitucional sobre a lei dos metadados, o qual tem “relevante impacto na investigação, deteção e repressão de crimes graves”.
Em esclarecimento enviado à Lusa, o Ministério da Justiça refere que o dito acórdão, de 19 de abril, reveste de “força obrigatória geral”, pelo que é “apto a ter um impacto relevante na investigação, deteção e repressão de crimes graves”.
Por essa razão – adianta – o acórdão e os seus efeitos está “a ser analisado do ponto de vista prático e jurídico pelo Ministério da Justiça, designadamente, através da Polícia Judiciária, no sentido de aferir da viabilidade de apresentação de propostas de alteração legislativas que possam mitigar os referidos impactos, no respeito pela Constituição e pelas decisões do Tribunal Constitucional”.
Em retrospetiva, o Ministério da Justiça lembra que a Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, transpôs para a ordem jurídica nacional a Diretiva 2006/24/CE do Parlamento e do Conselho Europeu, de 15 de março de 2006, relativa à conservação de dados gerados ou tratados no contexto da oferta de serviços de comunicações eletrónicas publicamente disponíveis ou de redes públicas de comunicações.
“Esta diretiva foi declarada inválida por decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia, no acórdão de 8 de abril de 2014”, recorda ainda o ministério agora dirigido por Catarina Sarmento e Castro.
Esta terça-feira, uma notícia do Observador recorda que a provedora de Justiça tentou convencer em janeiro de 2019 o Governo de António Costa a alterar tal norma, invocando para o efeito dois acórdãos do Tribunal da Justiça da União Europeia (UE) de 2014 e 2016, acrescentando que “nada foi feito e [que] agora milhares de processos de investigação criminal correm perigo de vida depois de o TC ter largado a bomba da inconstitucionalidade com efeitos retroativos da lei aprovada em 2008”.
Lembra também que a então ministra Francisca Van Dunem, a quem foi dirigida a recomendação da provedora de Justiça, não só defendeu a constitucionalidade da lei, como disse expressamente que: “a decisão do Tribunal de Justiça da UE não deverá afetar as investigações nacionais”.
“Temo não ser possível que o Governo possa lograr apresentar ao Parlamento uma proposta de lei com essa aspiração”, devido ao “calendário legislativo” — uma referência às eleições legislativas de outubro de 2019 — e à “complexidade de alteração legislativa” da lei dos metadados, disse na altura na ministra, citada pelo Observador.
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