Salário do talento tech em Portugal dispara cerca de 40%. Mas sete em cada dez profissionais consideram mudar de trabalho
O salto remuneratório sem precedentes deixa o salário anual destes profissionais nos 44.449 euros. Não é suficiente para reter o talento, sobretudo quando se compete com empresas além-fronteiras.
Os salários na indústria tecnológica portuguesa dispararam 36,5%, em comparação com o valor remuneratório médio no ano passado. Um salto sem precedentes que deixa o salário médio anual bruto destes profissionais nos 44.449 euros. Ainda assim, o aumento salarial (sentido por cerca de 80% dos inquiridos) parece não ser suficiente para reter o talento: cerca de sete em cada dez profissionais considera mudar de emprego nos próximos três meses. Valor que sobe entre os que trabalham num regime 100% presencial no escritório, com quase nove em cada vez a admitirem esta intenção. São também estes que recebem menos e que, no ano passado, sofreram até mesmo cortes salariais. O gap salarial entre homens e mulheres agravou-se: os homens ganham, em média, mais 31,2% do que as mulheres, revela o relatório “Deep-dive into the Portuguese tech market”, elaborado pela Landing.Jobs, em parceria com a Volkswagen Digital Solutions.
“Nunca vi um salto salarial desta dimensão. Certamente que o fenómeno do trabalho remoto e de termos profissionais portugueses a trabalharem, a partir de Portugal, para empresas no estrangeiro teve um enorme efeito no aumento dos salários”, começa por explicar Pedro Moura, chief marketing officer da Landing.Jobs, durante a apresentação, esta quarta-feira, do relatório.
Linguagens melhor remuneradas
De 2021 para 2022, os salários dos profissionais no setor tecnológico deram um salto de quase 40%, para os 44.449 euros brutos por ano. Mas nem todos os profissionais na indústria tech viram o mesmo impulso nos seus rendimentos. As funções de gestão são as melhor remuneradas, mas developer roles solutions architect, business applications e devOps estão também no topo da lista.
Mobile (78,5%), back-end (73,6%) e data science (68,6%) têm sido as áreas que mais aumentos salariais têm dado. Já em termos de linguagens de programação, a as linguagens de nicho lideram a guerra salarial, mas o Elixir — uma linguagem de programação funcional executada na máquina virtual do Erlang — ganha a taça. A WebAssembly é, por sua vez, a linguagem de programação mais mal paga.
Salários variam com região…
A nível geográfico, são os profissionais que trabalham na Área Metropolitana de Lisboa que mais ganham, com um salário médio anual bruto de 48.497 euros. Por outro lado, é nas ilhas da Madeira e dos Açores que estão os rendimentos mais baixos do setor (30.073 euros brutos por ano).
“Apesar do gap que existe entre a remuneração praticada em Lisboa e outras regiões, é possível concluir que, face ao ano passado, esta diferença encurtou. Parece que o fenómeno remote está a reduzir esse gap entre regiões de Portugal”, salienta Pedro Moura.
… e com o tipo de relação contratual
Olhando para o tipo de vínculo contratual, é possível concluir que, à semelhança do que a Landing.Jobs já dava conta no ano passado, os contractors continuam a sair privilegiados desta equação. Em média, estes profissionais, que escolhem outro tipo de vínculo profissional, caracterizado por uma maior flexibilidade e independência, em que se trabalha para um projeto de cada vez, ganham mais 57% do que os que escolhem trabalham em regime full-time, um regime ainda mais convencional. Uma vantagem superior ainda àquela que a tecnológica liderada por Diogo Alves de Oliveira apurou em 2021 (que, na altura, era de 54%).
Gap salarial entre homens e mulheres aumentou
No que toca a igualdade salarial, fica evidente, uma vez mais, o fosso entre os géneros registado na indústria tecnológica. Os homens ganham, em média, mais 31,2% do que as mulheres, uma diferença significativamente agravada desde o ano passado.
“A diferença é 15% superior à registada no ano passado (e 8% superior à registada em 2020). O fosso salarial entre géneros é maior nas funções de gestão (35%) do que nas funções de desenvolvimento (32,1%)”, lê-se no relatório da Landing.Jobs.
Quase 20% dos profissionais tech em Portugal trabalham além-fronteiras
Há ainda outro fator que determina os profissionais que ganham os salários mais chorudos. A minoria de profissionais que ainda trabalha em regimes 100% presenciais no escritório (6%) é também aquela que recebe menos ao final do mês (29.197 euros brutos por ano) e que teve cortes salariais no ano passado (na ordem dos 0,8%). “Estes apenas 6% que têm trabalhos 100% presenciais não estão numa boa posição”, resume Pedro Moura
O relatório deixa ainda claro que praticamente totalidade dos profissionais tech em Portugal (99%) querem trabalhar remotamente, seja em modelos híbridos ou 100% remotos. Além disso, estão altamente motivados para trabalhar remotamente para uma empresa localizada fora do país. Essa é uma possibilidade para 80% dos profissionais, enquanto 74% equaciona mesmo trabalhar para uma organização noutro continente conclui a Landing.Jobs. É que as empresas no estrangeiro pagam 46,8% mais do que as empresas em Portugal, e o salário continua a ser o principal motor de carreira, valorizado por 21,3% dos inquiridos, seguindo-se o work-life balance, referido por 17,8% dos inquiridos.
Esta ambição de trabalhar para empresas localizadas noutros países já está mesmo a materializar-se. Atualmente, 18,6% dos profissionais tech em Portugal trabalham remotamente para uma empresa além-fronteiras. “Esta é, talvez, a grande mudança no pós-Covid”, considera o chief marketing officer da Landing.Jobs.
80% dos profissionais querem trabalhar remotamente para uma empresa fora de Portugal, enquanto 74% equaciona mesmo trabalhar para uma organização noutro continente. É que as empresas no estrangeiro pagam 46,8% mais do que as empresas em Portugal, e o salário continua a ser o principal motor de carreira, valorizado por 21,3% dos inquiridos.
A Europa é o continente para o qual a maioria deste talento português trabalha, com destaque para o Reino Unido, França e Alemanha. No entanto, os Estados Unidos também ganham terreno.
Encontrar um equilíbrio entre a vida profissional e a vida privada é a principal razão (25,4%) para estes profissionais abraçarem trabalhos noutros países, seguindo-se o salário (21,7%). De salientar, contudo, que cerca de 50% prefere continuar a viver em Portugal e trabalhar de forma completamente remota, evitando a relocalização. “Isto é muito interessante porque Portugal é o país da Europa a partir de onde as pessoas mais querem trabalhar. É um país acolhedor, diria que é mesmo um bom país para viver”, defende Pedro Moura.
Com a adoção em massa do trabalho à distância, muitas barreiras geográficas e culturais foram derrubadas, permitindo que os talentos tecnológicos trabalhassem à distância, não só para as empresas portuguesas, mas também para as empresas além-fronteiras.
“As empresas estrangeiras sabiam disto, e fizeram movimentos agressivos na contratação de talentos tecnológicos portugueses para trabalharem remotamente a partir de Portugal. Um impressionante 18,6% dos profissionais da tecnologia em Portugal trabalham remotamente para uma empresa além-fronteiras, com tendência a crescer. Isto tem causado enormes impactos tanto na disponibilidade de talentos locais como nos salários, um impacto que as empresas locais estão a começar a perceber”, alerta a Landing.Jobs no relatório.
Por outro lado, a tecnológica deixa claro que as empresas portuguesas ainda não abraçaram a globalização do trabalho, recorrendo ainda em pouca medida à aldeia global de talento. “Apenas 8,9% da mão de obra portuguesa provém de outros países, contra uma média de 12% na Europa e 38% na América do Norte. Esta é uma das formas de lidar com a escassez de talentos tecnológicos locais.”
Sete em cada dez querem mudar de emprego. Os que trabalham em modelos 100% presenciais serão os primeiros a sair
O número de profissionais que já trabalham de forma remota para empresas localizadas noutros países só tem tendência para aumentar, defende a tecnológica, sobretudo se tivermos em conta as intenções de mudar de emprego demonstradas pelo talento tech. Quase sete em cada dez profissionais de tecnologia em Portugal estão a considerar mudar de emprego nos próximos três meses, uma proporção em linha com a registada nos restantes países europeus. Os trabalhadores em regimes 100% presenciais serão os primeiros a sair, com quase nove em cada dez a confirmar essa vontade.
Um impressionante 18,6% dos profissionais da tecnologia em Portugal trabalham remotamente para uma empresa além-fronteiras, com tendência a crescer. Isto tem causado enormes impactos tanto na disponibilidade de talentos locais como nos salários, um impacto que as empresas locais estão a começar a perceber.
“Estes são, seguramente, sinais dos tempos que correm. Não há dúvida de que o trabalho remoto, nas suas muitas formas, já não é um nice-to-have, mas sim mandatório”, pode ler-se no documento.
Neste momento, o tempo médio de permanência na mesma empresa varia de 1,4 anos, para profissionais com entre um e três anos de experiência, a quatro anos, para profissionais com mais de nove anos de experiência. Nesta missão de retenção de talento, as scale-ups têm sido melhor sucedidas (5,1/10), ao contrário do setor público, onde a insatisfação é mais evidente (8,4/10).
As conclusões apresentadas no relatório da Landing.Jobs resultaram de um inquérito a 2.082 profissionais de tecnologia residentes em Portugal. Este, por sua vez, faz parte um inquérito global a 6.568 profissionais de tecnologia que esteve aberto ao público entre janeiro e março de 2022.
Consulte o relatório completo aqui.
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