Canais de denúncia obrigatórios. Estarão as empresas já preparadas?

Desde sábado que as empresas são obrigadas a ter as regras internas conformes ao novo Estatuto do Denunciante. Canais de denúncia obrigatórios para empresas com mais de 50 colaboradores.

Desde sábado que as empresas com mais de 50 colaboradores têm de ter canais de denúncia para onde serão reportados comportamentos suspeitos dos colegas de trabalho. Seja a nível de suspeitas de corrupção, peculato ou mesmo situações de assédio.

Assim, no âmbito do Estatuto do Denunciante — publicado ainda no mandato de Francisca Van Dunem — torna-se vinculativa a adoção por todas as entidades públicas e privadas com mais de 50 trabalhadores de um programa de compliance, que inclua “a elaboração de um plano de prevenção da corrupção, a aprovação de um código de conduta, a disponibilização de um canal de denúncia”.

E estarão as empresas preparadas para isso?

A Advocatus falou com alguns advogados que falaram da situação, em concreto, dos seus clientes empresariais.

“Sim, creio que podemos dizer que, de um modo geral, os nossos clientes estão cientes dessa obrigação”, explica a advogada da Miranda, Catarina Veiga Ribeiro. “Desde o ano passado que temos desenvolvido um conjunto de iniciativas – partilha de informações jurídicas, questionários, formações one-to-one – com o objetivo de alertar e sensibilizar os nossos clientes para estas obrigações”.

“Não só os clientes da DLA Piper Portugal estão cientes disso e desejam atuar em conformidade com a Lei, como (ainda) estamos a desenvolver todos os esforços para os ajudar nesse processo”, segundo explicou Paulo Saragoça da Matta, sócio da DLA Piper. “Desenhámos um programa e um protocolo específicos para tal propósito, que disponibilizamos não só aos nossos clientes como a todas as empresas que queiram implementar as novas obrigações legais“, concluiu.

“Acreditamos que os nossos clientes cumprirão as obrigações durante este mês de junho (estamos aliás com vários projetos em mãos e a serem ultimados) sendo que alguns de entre eles já tinham instalada uma política interna de denúncias – que naturalmente requer alguma adaptação a este novo pacote legislativo – na medida em que são filiais nacionais de pessoas coletivas com sede em países estrangeiros, onde esta obrigação (por força do US Foreign Corrupt Practices Act, do UK Bribery Act ou outra legislação semelhante) já era aplicada de forma consistente”, concluiu Catarina Veiga Ribeiro.

“Grande parte dos nossos clientes empresariais de maior dimensão vinha já adotando mecanismos que visavam a possibilidade de apresentação de denúncias e a proteção de quem as fazia”, explica João Lima Cluny, advogado sénior da Morais Leitão. A resposta à Lei 93/2021 foi, assim, nestes casos, uma reanálise dos sistemas já implementados e um reforço das medidas necessárias à proteção daqueles que apresentam denúncias. Estou convencido e tenho verificado que, em especial das grandes empresas, existe uma preocupação relevante e que as consciências estão alerta para esta matéria. Já em empresas de média dimensão admito que, apesar do esforço que se tem verificado na divulgação desta legislação, ainda haja algum desconhecimento/alheamento”, concluiu.

O que diz o Estatuto do Denunciante?

  • As matérias que podem fazer parte destas futuras denúncias reportam-se a casos como utilização indevida de meios financeiros, furto, violação de qualquer dever de confidencialidade, fraude, peculato ou suborno;
  • Já a própria relação de trabalho do colaborador, como violações de orientações internas, licenças médicas (baixas) não estão, à partida, incluídas no sistema de proteção de denunciantes.
  • Se a denúncia se referir a situações como, por exemplo, delitos graves ou condições do próprio local de trabalho, como seja o assédio sexual e outros conflitos graves, já podem ser alvo destas denúncias;
  • Este canal pode ainda funcionar como uma forma interna de gestão de riscos, condições de trabalho, segurança e mesmo expectativas e liberdade de todos aqueles que diariamente colaboram para o futuro da organização.

Quem pode ser considerado denunciante?

  • A pessoa singular que denuncie ou divulgue publicamente uma infração com fundamento em informações obtidas no âmbito do seu trabalho (mesmo que entretanto tenha saído dessa empresa), independentemente da natureza desta atividade e do setor em que é exercida.
  • Bem como as infrações baseadas em informações conhecidas durante o processo de recrutamento ou durante outra fase de negociação pré-contratual;
  • Neste contexto, poderão ser considerados denunciantes, designadamente: os trabalhadores do setor privado, social ou público, os prestadores de serviços, contratantes, subcontratantes e fornecedores, bem como quaisquer pessoas que atuem sob a sua supervisão e direção, os titulares de participações sociais e as pessoas pertencentes a órgãos de administração ou de gestão ou a órgãos fiscais ou de supervisão de pessoas coletivas, incluindo membros não executivos. E ainda voluntários e estagiários, remunerados ou não remunerados.

Que ‘castigo’ terão as empresas incumpridoras?

  • A lei estabelece um quadro punitivo para o incumprimento das medidas previstas nesta Lei, com contraordenações graves e muito graves, puníveis com coimas que podem chegar aos 250 mil euros no caso de pessoas coletivas e 25 mil euros no caso de pessoas singulares.

Como é o denunciante protegido contra eventuais retaliações?

  • A Diretiva sobre Proteção de Denunciantes (Whistleblower) exige a proibição total de qualquer forma de retaliação.
  • Uma denúncia não deve originar um tratamento desfavorável ou reações contra o denunciante.
  • Nem os denunciantes (ou quaisquer outros) que cumpram as condições da lei podem ser objeto de retaliação, tentativa de retaliação ou ameaças de retaliação. Caso isso aconteça, os próprios denunciantes terão direito a uma indemnização;

Quem gere este canal de denúncia?

  • O empregador pode optar por ser responsável pelo canal internamente. Neste caso, deve ser selecionada uma pessoa independente da empresa (ou departamento) que recebe os alertas e se encarrega do contacto com o denunciante;
  • Ou então ter uma entidade externa responsável pelo canal. Será essencial garantir o conhecimento e experiência na área do Direito Laboral e RGPD, para além do domínio da própria Diretiva e Lei do Whistleblower.

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