Como os países europeus estão a tributar os “lucros caídos do céu”

O Governo está a estudar qual o benefício que outros países estão a ter com a imposição de impostos sobre os lucros excessivos. Saiba como os países europeus estão a implementar a windfall tax.

A subida acentuada da inflação a nível global obrigou os países a avançarem com medidas para mitigar o impacto da subida dos preços nas famílias e empresas. O fardo está a incidir nos orçamentos, até porque a subida da inflação está também a beneficiar os cofres públicos, devido à maior coleta de impostos.

Mas os governos estão também a recorrer a outras formas para financiar os programas anti-inflação. A tributação dos lucros excessivos das empresas que estão a ganhar com a alta dos preços está a ser implementada por vários países europeus, embora de forma algo avulsa e menos frequente do que, à partida, seria expectável tendo em conta o debate sobre o tema. Entre as maiores economias europeias, só Itália, Reino Unido e Espanha anunciaram medidas neste sentido.

Windfall profit tax, que numa tradução livre significa imposto sobre “lucros caídos do céu”, entrou para o léxico dos mercados e da política este ano e o debate tem crescido de tom nas últimas semanas, à medida que várias empresas estão a anunciar um forte aumento dos lucros.

O debate sobre os “lucros caídos do céu” está instalado em praticamente todos os países europeus, sendo que apesar de muito ruído e apelos nesse sentido por parte de várias entidades internacionais, poucos são os que têm medidas concretas no terreno e já estejam a cobrar impostos.

O tema regressou à agenda em Portugal, depois do primeiro-ministro ter revelado, na semana passada, que o Governo está a “estudar e analisar profundamente” uma windfall tax sobre o setor petrolífero, embora descartando impostos extra sobre a banca e as elétricas. António Costa disse esta sexta-feira que “não será razoável” aplicar uma sobretaxa sobre quem já paga duas “sobretaxas”, como é o caso da banca, e também afastou o mesmo em relação ao setor elétrico, pois já está a contribuir para o esforço de redução dos preços com o mecanismo ibérico. “Depois há setores onde esses sobreganhos ainda não estão a ser devidamente socializados. É o caso das petrolíferas. Estamos a estudar e a analisar atentamente”, disse o primeiro-ministro, em reação ao pedido do presidente do PS, Carlos César.

As 13 cotadas do índice PSI obtiveram lucros conjuntos de 1.455 milhões de euros entre abril e junho, o que representa um aumento de 86% face ao segundo trimestre de 2021. EDP, Galp Energia e EDP Renováveis atingiram lucros de 846 milhões de euros, o que representa 58% do total do índice e um crescimento de mais de 100%.

Há um estudo que estamos a fazer para perceber qual é o benefício efetivo que outros países que já adotaram ou anunciaram adotar medidas deste tipo estão, efetivamente, a ter. Adotar uma medida só para dizer que adotamos uma sobretaxa e depois isso se traduzir em nada ou quase nada, não faz sentido.

António Costa, primeiro-ministro

Petrolíferas mundiais com lucros recorde

À boleia da valorização acentuada dos preços do petróleo e subida pronunciada das margens de refinação, grande parte das petrolíferas mundiais estão a anunciar lucros recorde. Tendo em conta apenas as cinco maiores – as “Big Five” BP, Chevron, Exxon Mobil, Shell e TotalEnergies –, os lucros totalizaram 60 mil milhões de dólares no segundo trimestre. Isto depois de no primeiro trimestre os resultados líquidos, tendo em conta um espetro mais alargado de companhias, terem atingido 100 mil milhões de dólares.

A forte subida da remuneração das petrolíferas aos seus acionistas está a aumentar a pressão pública para que sejam implementados impostos extraordinários sobre o setor. As “Big Five”, só no segundo trimestre, anunciaram programas de recompra de ações no valor de 25 mil milhões de dólares, além de um aumento médio de 10% nos dividendos.

Dificilmente será aprovada uma windfall tax nos Estados Unidos, mas o tema também tem marcado a agenda. Ficou célebre a frase de Joe Biden, a assinalar que a “Exxon está a fazer mais dinheiro do que Deus”, sendo que o presidente dos EUA também exigiu que as empresas baixassem os preços dos combustíveis de forma imediata.

Nas produtoras de eletricidade a tendência também tem sido de aumento robusto nos lucros, ainda que a crise energética originada com a guerra na Ucrânia tenha efeitos positivos e negativos nos resultados. A subida dos preços da eletricidade beneficia as companhias, mas a valorização muito acentuada dos preços do gás natural penaliza as fabricantes que recorrem a esta matéria-prima para produzir eletricidade.

Há outros setores que estão a conseguir um crescimento mais acentuado nos lucros, embora o efeito não seja tão direto da guerra na Ucrânia. Os 10 maiores bancos europeus consolidaram lucros de 13,9 mil milhões de euros no segundo trimestre, o terceiro valor mais elevado nos últimos 10 anos. Depois de anos de resultados anémicos, este aumento nos lucros dos bancos europeus surge numa altura em que as taxas de juro estão a subir, com os bancos centrais a agravarem a política monetária para combater a alta da inflação.

O Banco Central Europeu, segundo avançou o Financial Times, deverá implementar medidas para impedir que os bancos europeus obtenham lucros excessivos com a normalização da política monetária, mas também há países que estão a recorrer aos impostos sobre a banca para financiar os apoios às famílias e empresas.

O debate sobre os “lucros caídos do céu” está instalado em praticamente todos os países europeus, sendo que apesar de muito ruído e apelos nesse sentido por parte de várias entidades internacionais, poucos são os que têm medidas concretas no terreno e já estejam a cobrar impostos.

O tema também tem marcado a agenda em Portugal, sendo que o governo de António Costa nunca afastou totalmente novas medidas fiscais sobre as empresas, mas não tem (ainda) qualquer proposta nesse sentido. As 13 cotadas do índice PSI obtiveram lucros conjuntos de 1.455 milhões de euros entre abril e junho, o que representa um aumento de 86% face ao segundo trimestre de 2021. EDP, Galp Energia e EDP Renováveis atingiram lucros de 846 milhões de euros, o que representa 58% do total do índice e um crescimento de mais de 100%.

Os governos europeus têm “luz verde” da Comissão Europeia para avançar com impostos sobre lucros excessivos. A medida faz parte de um pacote anunciado em março por Bruxelas com propostas para os países europeus combaterem o impacto da subida dos preços da energia. “Os Estados-membros podem considerar medidas sobre ‘lucros caídos do céu’ e, de forma excecional, capturar esses ganhos para os redistribuir pelos consumidores”, assinalou a Comissão Europeia, exigindo que a medida seja proporcional e temporária.

Os impostos sobre os “lucros caídos do céu” também têm o conforto de entidades como a OCDE, Agência Internacional de Energia (AIE) e ONU. António Guterres considerou “imoral” que as empresas associadas ao petróleo e gás natural estejam a obter lucros recorde com a atual crise energética, apelando à tributação destes “lucros excessivos” e ao uso do valor arrecadado para “apoiar as pessoas mais vulneráveis nestes tempos difíceis”.

A discussão sobre os impostos a aplicar aos lucros excessivos está longe de ser um exclusivo da Europa e também de gerar consenso, entre os especialistas e os governos. Vários países europeus, como Alemanha e a França, defendem um caminho diferente da tributação direta às empresas. Poucos são os que já avançaram com medidas concretas e estão a tributar as companhias e mesmo entre estes os métodos são distintos.

Em Portugal, António Costa revelou que o Governo vai estudar “qual é o benefício efetivo que outros países que já adotaram ou anunciaram adotar medidas deste tipo estão, efetivamente, a ter”. O ECO sistematiza de seguida o que cada país europeu já implementou (ou não) e o que pretende anunciar nos próximos tempos para cobrar impostos sobre os “lucros caídos do céu”.

A pioneira Itália

O Governo liderado por Mario Draghi foi o primeiro, entre as maiores economias, a avançar com impostos sobre os lucros excessivos das empresas de energia, servindo de modelo para outros países. Itália anunciou em março uma taxa adicional de imposto de 10% sobre os ganhos extraordinários e em maio, no âmbito de um novo pacote de ajuda às famílias e empresas, aumentou a taxa para 25%.

Este tributo é aplicado sobre as empresas que vendem e/ou produzem eletricidade e gás metano, extraem e/ou vendem gás natural e produzem e/ou distribuem produtos petrolíferos. Incide também sobre as empresas que importam eletricidade, gás metano, gás natural e produtos petrolíferos de outros países da União Europeia para revenda.

As empresas que obtiveram um aumento acima de 10% e superior a 5 milhões de euros na margem de lucro, entre outubro de 2021 e abril deste ano, face ao período homólogo, têm de pagar o imposto. 40% do valor é cobrado até ao final de junho e o resto até novembro. O Governo italiano estimou encaixar 11 mil milhões de euros com esta medida, mas o plano não está conforme o previsto. Segundo noticiou a Reuters, citando o Tesouro Italiano, a maioria das empresas não terá pagado a tempo, contribuindo para gerar um défice de 9 mil milhões de euros nas contas públicas. António Costa referiu-se especificamente ao caso italiano, salientando que o país “já reviu a medida, pois a receita estava muito aquém do esperado”.

O agravamento da taxa de 10% para 25% foi aprovado já em agosto, no âmbito de um novo pacote de 17 mil milhões de euros para contrariar os efeitos da alta da inflação. No início do ano já tinha sido implementado um pacote de 35 mil milhões de euros.

Com a dificuldade crescente para obter financiamento nos mercados e numa altura de crise política com a queda do governo de Mario Draghi, impostos adicionais sobre as empresas não estão colocados de parte. Em junho, deputados de diversos partidos avançaram com uma proposta para taxar os lucros dos bancos com a negociação de energia. Com as eleições legislativas à porta, não faltarão medidas semelhantes nos programas dos partidos.

Reino Unido fica-se pelo petróleo do Mar do Norte

No país sede de algumas das maiores petrolíferas mundiais (BP e Shell), o governo de Boris Johnson anunciou, a 26 de maio, a imposição de uma windfall tax de 25% sobre os lucros da atividade das empresas que exploram petróleo e gás natural do Mar do Norte. A taxa acresce ao imposto de 40% que já incide sobre estas companhias, o que compara à taxa de 19% para a generalidade das empresas britânicas.

A medida acabou por ser aprovada em julho, já em plena crise política, e com algumas alterações ao projeto-lei. Foi adicionada uma data-limite para o fim deste imposto extraordinário (final de 2025) e as empresas podem reduzir o valor a pagar tendo em conta o investimento efetuado no aumento da produção. A medida vai gerar um encaixe de 5 mil milhões de libras este ano, financiando a maioria do apoio de 8 mil milhões de libras às famílias britânicas mais pobres.

A queda de Boris Johnson como primeiro-ministro travou a possibilidade de o imposto ser alargado a outras atividades, nomeadamente as produtoras de energia elétrica. O que não impede que a medida regresse com nova liderança em Downing Street, uma vez que os lucros elevados da elétrica Centrica entraram na campanha dos candidatos a substituir Boris Johnson. Foi Rishi Sunak que implementou a windfall tax sobre as petrolíferas. Liz Truss já afastou a intenção de estender o imposto às elétricas.

Espanha alarga imposto à banca

Espanha optou por uma solução diferente para financiar as medidas de apoio às famílias, aplicando o imposto sobre os “lucros caídos do céu” a todo o setor energético e também à banca. O objetivo passa por angariar 7 mil milhões de euros em dois anos, que serão pagos pelas 20 grandes empresas com presença em Espanha.

Se em Itália e Reino Unido o imposto incide sobre os lucros, o governo de Pedro Sánchez optou por aplicar uma taxa de 1,2% sobre as receitas domésticas das companhias do setor energético com uma faturação acima de mil milhões de euros. Em dois anos, a medida deve render 4 mil milhões de euros.

Os restantes 3 mil milhões de euros resultam da taxa de 4,8% que será aplicada sobre as comissões e a margem financeira dos bancos, um indicador que é apurado tendo em conta a diferença entre os juros cobrados nos empréstimos e os juros pagos nos depósitos.

A lei que vai entrar em vigor no próximo ano proíbe as empresas alvo de passarem o aumento de imposto para os clientes, sob pena de serem sancionadas em 150% do valor que tenham repercutido. Falta ainda saber se o BCE aprova o imposto adicional sobre os bancos, algo que o governador do Banco de Espanha dúvida. Os bancos e as energéticas em Espanha pagam uma taxa de IRC (30%) acima de outros setores.

Hungria generaliza imposto sobre lucros excessivos

O governo do ultraconservador Viktor Orban é dos mais radicais, tendo decidido em maio alargar a uma série de setores o imposto que incide sobre lucros excessivos que já estava a ser cobrado às empresas de energia e banca. Companhias áreas, seguradoras, empresas de telecomunicações, retalho e outros setores menos penalizados pela pandemia também vão pagar um imposto extra, o que deverá render 2 mil milhões de euros aos cofres públicos da Hungria.

As taxas de imposto diferem consoante o setor. A MOL, principal empresa de eletricidade e petróleo do país, é uma das mais castigadas, com a taxa sobre os lucros a subir de 25% para 40% a partir do início de agosto.

Imposto na Grécia chega aos 90%

A Grécia também avançou em maio com um imposto sobre os lucros excessivos, embora esteja concentrado nas produtoras de eletricidade no país. A taxa é de 90% sobre os “lucros caídos no céu” no período entre outubro de 2021 e março de 2022, que o regulador do país calcula em mais de 900 milhões de euros.

O encaixe será direcionado pelo Governo grego para ajudar as famílias mais carenciadas. O primeiro-ministro Kyriakos Mitsotakis classificou este imposto extra como o pagamento de um “dividendo solidário” das elétricas à sociedade.

Roménia tributa receitas extra

Na Roménia, a windfall tax sobre as empresas de energia elétrica está em vigor desde o inverno no ano passado. As receitas obtidas com a venda de eletricidade acima de 90 euros por MWh, entre novembro de 2021 e abril de 2023, são alvo de uma taxa de 80%, sendo esta a forma que o governo encontrou para limitar os preços cobrados pelas empresas às famílias.

As companhias com centrais elétricas a combustíveis fósseis ficam isentas destas medidas. A italiana Enel, uma das maiores no país, já ameaçou cancelar o investimento previsto de 2 mil milhões de euros, criticando o facto de as energias renováveis serem alvo deste imposto extraordinário.

Polónia “ameaça” bancos e energia

O governo polaco está a equacionar impostos extra sobre a banca e o setor energético, mas por motivos diferentes. Para as produtoras de energia estatais está em estudo um windfall tax semelhante ao que foi implementado no Reino Unido ou Itália, admitiu recentemente o primeiro-ministro. Mateusz Morawiecki também pediu à Noruega que partilhe parte dos lucros que está a obter com a crise energética, com os restantes países europeus.

No caso da banca, a ameaça deve-se ao facto de as instituições financeiras não estarem a aumentar a remuneração dos depósitos em linha com as subidas de juros implementadas pelo banco central. Com a inflação em máximo de 25 anos, a autoridade monetária já elevou a taxa de referência para 6,5% e são estimados mais aumentos.

Jaroslaw Kaczynski, antigo primeiro-ministro e atual líder do partido que apoia o Governo (Lei e Justiça), ameaçou com a imposição de um imposto extra se a banca não subir os juros dos depósitos. Para apoiar as famílias polacas a lidar com o aumento do custo de vida, o governo polaco já avançou com uma medida que permite uma moratória de oito meses, no espaço de dois anos, no pagamento das prestações do crédito à habitação.

Irlanda estuda imposto sobre empresas de energia

O orçamento da Irlanda para 2023, que vai ser anunciado em setembro, deverá contemplar um imposto sobre os “lucros significativos” que estão a ser registados pelas empresas do setor energético, admitiu o primeiro-ministro Micheál Martin.

O modelo está a ser estudado pelos assessores do governo, sendo que Micheál Martin não deu a decisão como fechada, adiantando que uma windfall tax tem pontos positivos e negativos. Acrescentou que os lucros da estatal ESB podem regressar aos cofres do estado devido ao pagamento de dividendos.

Bélgica segue com a taxa de 25%

Na Bélgica é mais certo que a windfall tax vai mesmo avançar, sendo que a proposta foi já apresentada e deverá fazer parte do orçamento a apresentar no outono. Segundo Tinne Van der Straeten, será aplicada uma taxa de 25% sobre os lucros excessivos das empresas de gás e eletricidade, bem como as traders de petróleo.

O imposto será calculado todos os trimestres e terá em conta as diferenças nas receitas entre os períodos. Só serão tributados os lucros adicionais superiores a 100 mil euros, ou que representem um crescimento acima de 10%.

Alemanha teme impacto na inflação

A Alemanha é um dos países mais penalizados pela crise energética, mas o Governo de Olaf Scholz tem rejeitado qualquer tipo de aumento de impostos para financiar os gastos públicos relacionados com o aumento da inflação, inclusive a nacionalização da elétrica Uniper.

A subida dos preços é precisamente um dos argumentos que têm sido avançados pelo ministro das Finanças para rejeitar esta opção. Christian Lindner adverte que aumento de impostos sobre empresas em específico pode resultar num aumento dos preços na Alemanha e escassez de produtos.

O ministro, do partido liberal FDP, adiantou ainda que não é possível identificar claramente o que é um lucro excessivo e qual será o efeito de tal medida. Esta opinião não é unânime entre os partidos da coligação que apoiam o governo alemão. O ministro da economia, Robert Habeck, e vários membros do seu partido (Verdes) já defenderam publicamente a imposição de um imposto sobre os lucros extra.

França prefere pressionar as empresas

Em França, a windfall tax também não vingou, pelo menos para já. O Governo tem optado por uma estratégia diferente, pressionando as empresas que estão a beneficiar com a crise a partilhar os benefícios com os clientes.

O executivo solicitou a empresas como a TotalEnergies (petróleo), Engie (eletricidade) e CMA CGM (transporte marítimo) para ajustarem os preços, sendo que o ministro das Finanças, Bruno Le Maire, afirmou recentemente que este método está a ser eficiente, ficando agradado com a resposta das empresas. A TotalEnergies, maior petrolífera do país, comprometeu-se a reduzir os preços dos combustíveis em 500 milhões de euros por ano.

Ainda assim, deputados de vários partidos (incluindo o liderado pelo presidente Emannuel Macron) avançaram com uma proposta para a imposição de uma windfall tax, que acabou por ser rejeitada pelo Parlamento no final de julho. A iniciativa não morreu, sendo que depois da pausa de verão os deputados pretendem debater o assunto.

França optou ainda por nacionalizar a EDF, investindo perto de 10 mil milhões de euros para controlar a elétrica, por forma a ganhar uma maior margem de manobra na gestão da crise energética.

Costa admite medida que Medina considerou “condenada ao fracasso”

Depois de ao longo dos últimos meses ter adotado um discurso algo errático sobre este tema, o primeiro-ministro deu um sinal forte de que as petrolíferas em Portugal deverão ser alvo desta tributação extra. Um capítulo mais concreto, num percurso marcado por avanços e recuos que vale a pena recordar.

Logo depois de ter tomado posse como ministro da Economia, António Costa Silva admitiu uma windfall tax em Portugal. Recuou poucos dias depois, assinalando que era uma hipótese mais teórica do que prática. A mudança de posição surgiu depois do ministro das Finanças ter afastado totalmente a medida durante o debate do Programa de Governo, em maio, considerando que era uma iniciativa condenada ao fracasso. Assinalou mesmo que aplicar o modelo italiano em Portugal resultaria num encaixe de apenas um milhão de euros.

Contudo, Fernando Medina efetuou declarações bem diferentes em julho, depois de Espanha ter avançado com a tributação aos lucros excessivos. O ministro das Finanças admitiu analisar a proposta espanhola, avisando que uma taxa deste tipo tinha de ser proporcional e traduzir-se numa receita com significado.

As declarações de António Costa, na semana passada, mostram que o tema dos impostos sobre os “lucros caídos do céu” vai certamente ser um dos pontos fortes da preparação do Orçamento do Estado para 2013.

O Presidente da República já se mostrou favorável a esta opção, caso não haja maior responsabilidade social das companhias. Os partidos de esquerda têm pressionado o Governo e o presidente do PS, Carlos César, pediu ao Executivo que vá “mais além” no reforço dos apoios às famílias e empresas e nos impostos que são cobrados a “umas quantas grandes empresas que, no presente contexto inflacionário, revelam lucros excessivos ou, no mínimo, excecionalmente elevados”.

Umas quantas grandes empresas que, no presente contexto inflacionário, revelam lucros excessivos ou, no mínimo, excecionalmente elevados, e que deviam ser objeto de uma colecta fiscal extraordinária, pelo menos na componente que não se destine ao reinvestimento

Carlos César, presidente do PS

O primeiro-ministro aceitou o repto, revelando que o Governo não está a desconsiderar “a situação de que há empresas cuja atividade tem vindo a beneficiar anormalmente pelo aumento dos preços”, pelo que “está a estudar e a analisar atentamente” se aplicará uma sobretaxa aos ganhos extraordinários das petrolíferas.

Contudo, António Costa deixou os bancos e as elétricas de fora, sendo mais dúbio sobre o setor da distribuição, onde é “mais duvidoso saber onde está o sobreganho ou se há sobreganho”.

As empresas de energia em Portugal já pagam um imposto extra. A contribuição extraordinária sobre o setor energético (CESE) foi introduzida em 2014 e persiste oito anos depois. Na banca, existe uma contribuição extraordinária desde 2011 e há dois anos foi criado o adicional de solidariedade.

O primeiro-ministro assinalou que “a nossa situação não é totalmente comparável com outros países. Se já se paga uma segunda sobretaxa, se calhar já não é razoável exigir uma terceira sobretaxa”. Acrescentou que em algumas empresas “já temos taxas, sobretaxas e sobre sobretaxas”, referindo-se claramente à banca.

No que diz respeito às elétricas, “parte dos sobreganhos (…) já estão a ser utilizados para financiar o mecanismo ibérico, [que] tem permitido todos os dias às empresas pagarem menos do que pagariam sem o mecanismo. Os sobreganhos que as elétricas deviam estar a ter estão a contribuir para preços mais baixos e evitar défices tarifários no futuro”, considerou.

Agora que também Portugal vai estudar a criação de um imposto sobre os “lucros caídos do céu”, o Governo tem vários modelos para se inspirar, embora poucos resultados concretos para escolher a melhor solução.

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

Como os países europeus estão a tributar os “lucros caídos do céu”

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião