Carlos Alexandre já entregou candidatura para Relação. Será o fim do protagonismo do super juiz?

O magistrado já entregou a candidatura a juiz-desembargador, depois de duas décadas na instrução criminal, em que mandou prender Sócrates, Salgado, Rendeiro, Luís Filipe Vieira ou Duarte Lima.

Resistiu e resistiu. Mas acabou por ceder. O juiz Carlos Alexandre, 61 anos, já entregou o pedido de promoção a desembargador do Tribunal da Relação, esta quinta-feira, às 10.45. Uma decisão que, a concretizar-se, será o fim do protagonismo — e de um ciclo — do chamado por muitos de super-juiz, depois de quase duas décadas no Tribunal Central de Instrução Criminal, em que mandou prender José Sócrates, Ricardo Salgado (em casa), Duarte Lima, Manuel Pinho, Oliveira e Costa, Luís Filipe Vieira ou os principais arguidos do processo dos Vistos Gold.

Os resultados do concurso da entrada ou não no Tribunal da Relação de Carlos Alexandre, a cerca de três anos da reforma, deverão sair em março de 2023. Caso seja promovido, assumirá o cargo de desembargador mas só em setembro de 2023.

Foi em janeiro deste ano que tudo mudou para Carlos Alexandre. Habituado ao protagonismo que o Ticão lhe garantia — apesar de em entrevista à Sic ter revelado que não gostava dos holofotes — a 4 de janeiro entrou em vigor a lei que determina que este Tribunal passasse a ter uma composição com mais sete juízes, depois de se fundir com o Juízo de Instrução Criminal de Lisboa.

No “Ticão” existiam, até esta mudança, dois juízes em funções, Carlos Alexandre, em exclusividade até 2015, e Ivo Rosa, desde 2015, e que levou a que todos os processos “mediáticos” transitassem para as suas mãos. Para este tribunal — na fase de instrução — foram parar os processos mais mediáticos da Justiça portuguesa como a Operação Marquês, caso GES/BES, BPP/João Rendeiro, Face Oculta, Operação Furacão, entre outros.

Já a Estratégia Anticorrupção de Francisca Van Dunem sublinhava que a perceção das decisões do ‘Ticão’ “é agravada pela circunstância de os processos que ali correm terem um grau de mediatização acrescido, pela gravidade dos factos”, aliada ao que a titular da pasta, à data, chamou de “pessoalização” das decisões. O aumento do número de magistrados afetos à realização das missões do Tribunal Central de Instrução Criminal “é a solução consensualmente apontada. Impõe-se, pois, reponderar a composição do Tribunal”, diz o documento. Desta forma, esbateu-se a pessoalização que aquele tribunal tinha e que dava origem, na opinião pública, à ideia de que cada processo era decidido em função da pessoa que o tramita, e não em função de critérios objetivos da lei.

O juiz Carlos Alexandre, após a sua audição relativamente à Operação Fizz, no Campus de Justiça, em Lisboa, 13 de março de 2018. JOÃO RELVAS/LUSAJoão Relvas/LUSA 13 Março, 2018

Carlos Alexandre ordenou a detenção do antigo primeiro-ministro — realizada a 21 de novembro de 2014, às 23:00 no Aeroporto de Lisboa, com câmaras de televisão a assistir. O início da Operação Marquês, quando ainda havia apenas três pessoas em contacto com o processo (o juiz, o procurador do Ministério Público responsável pelo processo, Rosário Teixeira, e o inspetor que liderava a equipa de investigação das finanças no MP, Paulo Silva), ficou assim manchado com uma nuvem de dúvidas de quem teria sido o autor das fugas de informação.

Conhecido também por ser mais próximo das teses da acusação — com alguns advogados de defesa desses mega processos a admitirem que muitos dos despachos do juiz de instrução são meros copy paste dos textos do Ministério Público – o super juiz esteve também sob suspeita de abuso de poder aquando a distribuição do processo relativo à Operação Marquês. Mas em maio, a Relação de Lisboa (TRL) considerou que não houve abuso de poder no que toca à distribuição manual do processo da Operação Marquês, que acabou por ficar nas suas mãos e sem ter sido feito uma sorteio eletrónico, como manda a lei. Sendo assim, a decisão foi de não pronúncia.

Antes, também o Conselho Superior de Magistratura (CSM) havia realizado um processo de averiguações e um procedimento de inquérito que culminaram em arquivamento. No entanto, o advogado do ex-primeiro-ministro, Pedro Delille, criticou então o órgão máximo de gestão e disciplina da magistratura judicial por ter admitido a violação do princípio do juiz natural.

As suas rivalidades com Ivo Rosa — que também já pediu a sua promoção para a Relação — são há muito públicas e notórias. Enquanto estavam sozinhos no Ticão, a frieza entre ambos era uma constante. Sendo que em janeiro deste ano, Carlos Alexandre chegou a acusar Ivo Rosa de colocar em perigo a vida de agentes encobertos da Polícia Judiciária.

O despique destes dois juízes não começou aqui. Anteriormente, Ivo Rosa também acusou Carlos Alexandre por este ter deixado muitos despachos em atraso no processo BES, entre eles um sobre o arresto de uma conta bancária de Maria João Salgado, mulher de Ricardo Salgado. Carlos Alexandre considera assim que o seu colega do Ticão cancelou “ações encobertas (…), apelidando de ilegais, colocando agentes encobertos em risco de vida”. Segundo a revista Sábado, estas decisões foram posteriormente anuladas pelo Tribunal da Relação de Lisboa, “considerando que eram atos ilegais e ordenando a reposição da cadeia de prova, através deles obtida”, referiu Carlos Alexandre.

 

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