Da inflação ao caos nas cripto, 5 desafios do novo líder da CMVM

Luís Laginha de Sousa chega ao regulador da bolsa num contexto de turbulência nas bolsas e nas criptomoedas. Quer maior articulação com os outros supervisores e dar um impulso ao mercado de capitais.

No discurso de tomada de posse, o novo presidente da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) defendeu a continuidade do trabalho do antecessor “sem ruturas” – há um plano 2022-2024 acabado de apresentar. Luís Laginha de Sousa, que inicia agora funções, afirmou que, num cenário de recursos limitados, irá concentrar os esforços do regulador da bolsa “onde haja caminho para percorrer”.

Juros, inflação e guerra aumentaram riscos

A escalada da inflação e a subida dos juros pelos bancos centrais estão a colocar pressão nas bolsas, com a ameaça de uma forte correção dos ativos financeiros. Com a indefinição da guerra da Rússia na Ucrânia, a instabilidade nos preços da energia e o fantasma de uma recessão, os próximos tempos não se avizinham tranquilos para os investidores.

O Banco de Portugal reconheceu que os riscos para a estabilidade financeira aumentaram nos últimos meses, por conta do atual ambiente adverso.

Por sua vez, o ministro das Finanças, Fernando Medina, destacou o papel que os reguladores vão ter na proteção dos consumidores de produtos financeiros, com vista a assegurar a estabilidade do sistema nestes tempos mais conturbados.

Laginha de Sousa está ciente destes desafios e acrescentou dois elementos estruturais que vão dificultar a sua tarefa: a falta de poupança e as consequências que daqui resultam para o investimento e, em particular, para o investimento através mercado de capital; a baixa literacia financeira que caracteriza a população portuguesa, “que é especialmente importante quando conjugada com a crescente digitalização financeira e o aparecimento de novas ideias”.

Promover a agenda verde

Fernando Medina lembrou Laginha de Sousa que o mercado de capitais é crucial na otimização da alocação dos recursos financeiros. Com a agenda verde na ordem do dia, a bolsa tem um papel importante a desempenhar neste âmbito, como reconheceu o novo presidente da CMVM.

Laginha de Sousa destacou sobretudo os desafios relativos à letra “E” da sigla “ESG” – Environmental, Social and Corporate Governance (critérios ambientais, sociais e de governação), abordando “a necessidade de enfrentar as alterações climáticas e assegurar a transição energética” da economia.

Apresentação dos membros do Conselho de Administração da CMVM e da ASF - 28NOV22
Apresentação dos membros do Conselho de Administração da CMVM e da ASFHugo Amaral/ECO

Dinamizar bolsa para famílias e empresas

Laginha de Sousa já esteve do outro lado, quando foi presidente da Euronext Lisboa, que opera a bolsa portuguesa, entre 2010 e 2016. Sabe melhor do que ninguém as necessidades do mercado.

Quando tomou posse, ouviu o ministro das Finanças dizer que o mercado de capitais devia ganhar importância junto das famílias (como instrumento de captação de poupança) e das empresas (como forma de financiamento alternativo ao crédito bancário). Também Laginha de Sousa partilha dessa ideia: “O mercado de capitais é imprescindível para o desenvolvimento do país”, afirmou na sua intervenção.

Na verdade, a dinamização da bolsa é um desígnio antigo. Mas pode agora ganhar um novo impulso. Sem concretizar, Fernando Medina revelou que o Governo se prepara para anunciar um conjunto de medidas fiscais que vão apoiar as poupanças a médio de longo prazo – está em cima da mesa a redução do IRS nas mais-valias mobiliárias para que detiver os títulos por mais tempo.

Será uma boa notícia para os pequenos investidores que investem na bolsa e para as empresas que ali buscam financiamento.

Caos nas criptomoedas

A CMVM não tem as competências de regular as criptomoedas, mas não se tem cansado de lançar alertas aos consumidores sobre os riscos de investimento num mercado que mergulhou no caos nos últimos tempos, na sequência da falência de várias corretoras, incluindo a FTX.

O polícia dos mercados tem visto aumentar a sua esfera de atuação: regula não só a bolsa e os emitentes, como também passou a supervisionar sociedades gestoras de organismos de investimento coletivo, de fundos de titularização de créditos, empresas de investimento e auditores. Mas poderá vir a acumular ainda a supervisão dos criptoativos, no âmbito do processo legislativo europeu MiCA (market and crypto assets). O antecessor de Laginha de Sousa disse que fazia sentido a CMVM ser a autoridade competente.

Apresentação dos membros do Conselho de Administração da CMVM e da ASF - 28NOV22
Da esquerda para a direita: Fernando Medina (ministro das Finanças), Luís Laginha de Sousa (presidente da CMVM), Margarida Corrêa de Aguiar (presidente da ASF), Inês Drumond, Juliano Ferreira e Teresa Gil (administradores da CMVM) e Adelaide Cavaleiro e Diogo Alarcão (administradores da ASF).Hugo Amaral/ECO

Coordenação com outros supervisores

Medina afastou mudanças no modelo de supervisão financeira em Portugal. Mas não deixou de exigir aos três reguladores – CMVM, Banco de Portugal e Autoridade de Supervisão dos Seguros e Fundos de Pensões – maior coordenação e partilha de informação – um dos problemas identificados na queda do BES.

Laginha de Sousa, que sai do Banco de Portugal para liderar outro regulador, também salientou este aspeto: o reforço da articulação dos supervisores é “irreversível”, sendo importante para evitar que se criem “zonas de vazios” na supervisão que se possam traduzir em riscos para a estabilidade financeira em Portugal. É um caminho “irreversível”, apontou.

Para ele, todos têm de ter a noção clara de que, “apesar de haver três áreas de atuação distintas entre cada um dos supervisores, o país é o mesmo e um só” e lembrou que, “ainda que as responsabilidades possam ser passadas para um ou outro supervisor, as consequências da materialização dos problemas são suportadas por todos”.

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