Fábricas portuguesas temem atrasos nas encomendas e subidas dos custos com greve nos portos
Cenário de mais oito dias de greve em janeiro assusta os industriais portugueses que dependem da via marítima para o abastecimento de matérias-primas e a exportação para destinos fora da Europa.
Seja para a importação de matérias-primas e de materiais que precisam de comprar para produzir, seja para a exportação das mercadorias para destinos extracomunitários, a greve dos trabalhadores nos portos portugueses está a começar a preocupar os principais setores industriais ouvidos pelo ECO. Temem atrasos nas encomendas e novos aumentos dos custos, sobretudo se a instabilidade laboral se mantiver nas próximas semanas nas infraestruturas portuárias.
A indústria da metalurgia e metalomecânica, a mais exportadora da economia portuguesa, com vendas a rondar os 22 mil milhões de euros em 2022, destina mais de 70% dos produtos vendidos no exterior aos mercados europeus, para os quais seguem “maioritariamente” por via terrestre. No entanto, para mercados com os Estados Unidos, que tem sido um dos de maior crescimento para a fileira, esta greve “poderá ter algum impacto”, reconhece Rafael Campos Pereira, porta-voz da principal associação do setor (AIMMAP).
Para outro setor fortemente exportador, como o têxtil e o vestuário, esta greve iniciada a 22 de dezembro, abrangendo os portos do continente, Madeira e Açores, e que se deve prolongar até ao final do mês de janeiro – estão agendadas paralisações de 24 horas nos dias 6, 9, 13, 16, 20, 23, 27 e 30 de janeiro – pode “trazer complicações substanciais ao normal funcionalmente do setor”, como salienta Mário Jorge Machado.
Se a situação não for ultrapassada, seguramente vai causar prejuízos relevantes ao bom funcionamento do setor, nomeadamente nas exportações.
O presidente da associação têxtil (ATP) relata que nesta transição de ano muitas empresas encerram para férias, “mas se a situação não for ultrapassada, seguramente vai causar prejuízos relevantes ao bom funcionamento do setor”. Sobretudo ao nível das exportações, se as mercadorias estiverem “prontas e a precisarem de ser expedidas”. No caso das importações de matérias-primas, confia que as fábricas “terão algum stock e, portanto, conseguirão fazer alguma gestão”.
Apesar de apenas 1% das exportações de peças serem feitas por via marítima, José Couto, presidente da Associação de Fabricantes para a Indústria Automóvel (AFIA), relata que “têm existido alguns problemas de planeamento dos processos de carga e desvio de navios”, dando o exemplo do Porto de Figueira da Foz, que no último fim de semana teve sete navios na fila de espera.
Os armadores vão passar este custo para os clientes, que só não transferem para os consumidores se quiserem ficar com prejuízo.
“Se os barcos demoram mais tempo, isto custa mais dinheiro aos armadores. Por exemplo, por cada dia de espera a mais são entre 10.000 e 12.500 euros por navio. Os armadores vão passar este custo para os clientes, que só não transferem para os consumidores se quiserem ficar com prejuízo”, dramatiza o responsável dos fabricantes de componentes para automóveis, notando que “neste momento ainda não há alternativas à exportação pela via marítima para fora da Europa”.
Com 81% das exportações a serem enviadas para clientes na Europa, mas com os EUA cada vez mais destacados na lista de exportações, os industriais do calçado, que viram o preço dos sapatos à saída da fábrica subir 5% no último ano, dizem estar “atentos” aos problemas que estão a avolumar nos portos portugueses. Ainda assim, Paulo Gonçalves, diretor de comunicação da associação (APICCAPS) que quer os empresários com estudos e a subcontratar mais no estrangeiro até 2030, indica que “para já não há qualquer sinal de alarme”.
Em cima das dificuldades que já estamos a viver, isto não vem trazer nada de positivo. É um processo que nos vem prejudicar a nível das exportações.
À sede da Associação das Indústrias de Madeira e Mobiliário de Portugal (AIMMP) ainda não chegaram oficialmente queixas dos empresários, mas o presidente, Vítor Poças, faz questão de declarar que “em cima das dificuldades que já [estão] a viver, isto não vem trazer nada de positivo”. “É um processo que nos vem prejudicar a nível das exportações. Cerca de 30% das exportações totais são para fora da Europa, o que implica o uso de barco”, completa o dirigente empresarial nortenho.
Outros setores industriais que têm igualmente vendas para fora da Europa, mesmo que representem uma quota minoritária no total, “protegem-se” através da utilização de outros portos europeus. É o caso dos moldes, que exporta 4% para o México e EUA, como reconhece o secretário-geral da CEFAMOL, Manuel Oliveira; e da indústria das duas rodas, representada pela ABIMOTA. Gil Nadais salienta que “grande parte das importações vêm através do Porto de Roterdão” e “para já” não sente os impactos da greve iniciada três dias antes do Natal.
Na semana passada, a Federação das Indústrias Agroalimentares (FIPA) advertiu que a manutenção da greve dos trabalhadores das administrações portuárias “coloca em causa o normal funcionamento da indústria agroalimentar, setor para o qual os portos do Continente [português], Madeira e Açores são a porta de entrada de matérias-primas no país”. Em comunicado, referiu ainda que a paralisação “compromete a exportação de bens” e o “cumprimento de prazos de entrega” de encomendas, situação que coloca em causa “relações futuras com o exterior”.
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