Maioria dos fundos de investimento perdeu mais de 10% no pior ano desde 2011

Mais de metade dos fundos de investimento registou uma rendibilidade negativa acima de 10% em 2022. O mau ano nos mercados também penalizou os montantes sob gestão, que baixaram 2.730 milhões.

Se detém um fundo de investimento mobiliário (FIM) há mais de um ano, a probabilidade de ter perdido dinheiro no ano passado é muito elevada. A desvalorização acentuada da generalidade das classes de ativos em 2022 provocou uma razia nos retornos destes produtos onde muitos portugueses aplicam as suas poupanças.

O mau ano dos mercados gerou também uma descida significativa nos montantes sob gestão da indústria, embora os resgates não tenham sido muito relevantes, evidenciando que os portugueses continuam a confiar em fundos na altura de investir.

Os dados da Associação Portuguesa de Fundos de Investimento, Pensões e Patrimónios (APFIPP) dão conta que entre o universo de 318 fundos de investimento mobiliário de várias categorias que estão constituídos no mercado português (inclui os desdobramentos de cada fundo), apenas 11 alcançaram um retorno anual positivo em 2022.

A rendibilidade efetiva foi negativa em 307 fundos de investimento mobiliário (97% do total), sendo que apenas 90 (menos de um terço) conseguiram fechar o ano com perdas de um dígito. Dito de outra forma, mais de metade dos FIM das gestoras de ativos portuguesas (179, ou 56% do total) registou uma perda superior a 10% em 2022. Em 11 o retorno negativo ficou mesmo acima de 20%.

A desvalorização dos ativos foi determinante para reduzir os montantes sob gestão da indústria de fundos de Portugal. Fecharam 2022 em 17.118 milhões de euros, uma descida de 2.730 milhões de euros (-13,8%) face ao fecho de 2021. A descida em 2022 foi a mais acentuada desde 2011, ano em que Portugal solicitou assistência financeira internacional, provocando um rombo de 3.402 milhões de euros no valor dos ativos geridos pelos FIM.

No que aos resgates diz respeito, o panorama não foi tão negativo. Atingiram 412 milhões de euros, abaixo do registado no último ano com fluxos negativos (-600 milhões de euros em 2018) e muito longe da fuga registada nos anos das últimas duas crises (2008 e 2011).

Este desempenho negativo reflete o comportamento dos mercados no ano passado, com a generalidade das ações e obrigações, que representam a grande fatia das carteiras dos fundos, a fecharem o ano com perdas de dois dígitos.

O índice do MSCI para medir o desempenho das ações mundiais desvalorizou 19,8% em 2022, com as ações norte-americanas (S&P500) também a perderem perto de 20%, enquanto as ações europeias registaram quedas menos acentuadas (Stoxx600 caiu 12,8%).

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Nas obrigações o descalabro foi ainda pior, tendo em conta que esta é uma classe de ativos de menor risco e por isso habitualmente com variações de menor amplitude. O índice da Bloomberg para medir o desempenho dos títulos de dívida a nível global recuou 16,25%, com as obrigações europeias a desvalorizarem 18,5% e as norte-americanas a caírem 12,6%. Foi de longe o pior ano deste século e um dos mais negativos que há memória.

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A escalada da inflação foi o denominador comum desta prestação negativa dos mercados, pois reduziu o poder de compra das famílias, aumentou os custos das empresas e pressionou os bancos centrais a efetuarem o aperto de política monetária mais agressivo em 40 anos.

Ações nacionais escapam a razia

Entre as 22 categorias de FIM da APFIPP, apenas quatro conseguiram uma rendibilidade efetiva positiva no ano passado. Os fundos de ações nacionais renderam 7,62% e os fundos de ações ibéricas fecharam com uma rendibilidade de 1,99%, espelhando o desempenho positivo da bolsa portuguesa (PSI ganhou 2,8%).

Não admira por isso que os fundos de ações nacionais e ibéricas representem mais de metade dos 10 fundos de investimento mobiliário com melhor desempenho do mercado português em 2022. O BPI Portugal (7,62%) foi o melhor destas duas categorias, ocupando o terceiro lugar do pódio geral.

O Montepio Euro Energy foi o fundo com melhor desempenho (15,56%), beneficiando com a valorização das ações das cotadas do setor energético. No lugar do meio do pódio ficou o BPI Brasil (14,35%), num ano em que a bolsa de São Paulo conseguiu um dos melhores desempenhos a nível mundial.

A BPI Gestão de Ativos BPI surge em destaque neste ranking, colocando três fundos de investimento mobiliário nos quatro mais rentáveis, sendo que mais nenhuma gestora consegue repetir a presença no TOP10.

13 categorias (mais de metade do total) sofreram perdas médias superiores a 10%, com os piores desempenhos a serem registados pelos FIM de ações. O facto de todas as variantes de fundos multi-ativos (incluindo os defensivos e moderados) terem registado rendibilidades negativas de dois dígitos mostra bem como 2022 foi desafiante para a indústria dos fundos.

Gestores batem mercado

A principal missão dos gestores de fundos passa por gerar retornos positivos aos clientes, mas o seu desempenho é aferido pela comparação com o retorno do mercado. Nesta métrica, a avaliação da maioria dos gestores é positiva, pois as variações foram quase sempre mais favoráveis do que as registadas pelos índices que servem de referência.

Os fundos de ações nacionais obtiveram uma rendibilidade efetiva média que quase duplicou a valorização do PSI. A desvalorização média dos fundos de obrigações internacionais ficou por metade da perda das obrigações globais, acontecendo o mesmo nos fundos de obrigações da Zona Euro.

A exceção aconteceu nos fundos de ações da América do Norte (-28,76%), que apresentaram um desempenho mais alinhado com o índice Nasdaq Composite (-33,1%), sugerindo um elevado peso das tecnológicas nas carteiras destes fundos.

2022 contagia retornos a cinco anos

Os fundos de investimento são produtos que devem ser analisados numa lógica de longo prazo, pelo que os retornos a cinco (e não a 12 meses) são a melhor opção para avaliar o seu desempenho. O investimento numa ótica de longo prazo permite mitigar os efeitos da volatilidade e períodos de retornos negativos nas variadas classes de ativos.

Mas 2022 não foi um ano qualquer, sendo que as desvalorizações acentuadas das ações e obrigações acabaram por contagiar os retornos dos FIM no horizonte a cinco anos, embora as perdas sejam bem mais contidas do que no último ano.

Entre os 178 fundos de investimento mobiliário constituídos no mercado português há mais de cinco anos, 127 apresentam uma rendibilidade anualizada negativa. Ou seja, apenas três em cada dez fundos gerou retornos anuais positivos neste espaço de tempo.

Entre os 51 que conseguiram rendibilidades positivas a cinco anos, apenas oito obtiveram ganhos acima de 5%. Nos fundos com retornos negativos, a esmagadora maioria perdeu menos de 2% ao ano.

O contágio da má performance de 2022 é sobretudo visível nos fundos de obrigações, uma vez que os títulos de dívida já tinham desvalorizado em 2021. Nos fundos de ações, apesar das fortes quedas no ano passado, os retornos a cinco anos continuam a ser positivos, validando a ideia que as ações são o ativo de eleição para investir numa lógica de curto prazo.

Os fundos de ações globais registam uma rendibilidade anualizada média de 7% nos últimos cinco anos, um retorno considerado atrativo para este horizonte temporal e mais alinhado com a média histórica em torno de 10%. Os fundos de ações da América do Norte ganham perto de 5% a cinco anos.

Nos fundos de ações europeias (+0,35%) e fundos de ações nacionais (+2,2%) as rendibilidades médias a cinco anos são bem mais modestas. Apesar das quedas em 2022 terem sido menos intensas, os ganhos nos anos de Bull Market também foram muito inferiores aos registados em Wall Street e outras bolsas mundiais.

Montantes sob gestão com maior queda em 11 anos

O mau desempenho dos mercados tornou inevitável uma redução nos montantes geridos pelas sociedades de fundos de investimento em Portugal. O valor passou de perto de 20 mil milhões de euros no final de 2021 (máximo de 2007), para 17.118 milhões de euros no fim do ano passado.

O saldo negativo, de 2.730 milhões de euros, é o mais acentuado desde 2011 (-3.403 milhões de euros), ficando ainda assim bem longe da sangria registada em 2008. No ano da crise financeira global, as carteiras dos fundos baixaram 11.419 milhões de euros.

A descida dos montantes sob gestão em 2022 também surge depois de três anos muito positivos na indústria em Portugal, com os valores geridos a aumentarem mais de oito mil milhões de euros neste período que foi muito favorável para os mercados.

Apesar da queda sofrida no ano passado, o valor sob gestão nos FIM portugueses é o segundo mais elevado desde 2009. O que evidencia como a indústria recuperou nos últimos anos depois dos momentos difíceis vividos durante a crise financeira e a crise de dívida na Europa.

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Investidores apostam nos fundos de ações

Não foi apenas a desvalorização dos ativos a justificar a descida dos montantes sob gestão. Os investidores também retiraram dinheiro dos fundos, embora a um ritmo muito inferior ao registado noutros períodos negativos nos mercados.

A diferença entre subscrições e resgates foi negativa em 412,5 milhões de euros no acumulado de 2022, apenas uma pequena parte das subscrições líquidas positivas acima de 4 mil milhões de euros registadas em 2021. Em 2018, ano em que os mercados também cederam, os resgates (líquidos de subscrições) totalizaram 600 milhões de euros. Em 2008 superaram 8 mil milhões de euros e em 2011 ascenderam a 2.625 milhões de euros.

Apesar das quedas acentuadas dos fundos de ações em 2022, os portugueses investiram nestes produtos no ano passado, denotando uma aposta de que os índices acionistas já atingiram o fundo no ano passado.

As subscrições líquidas de fundos de ações foram positivas em 373 milhões de euros, o que não foi suficiente para anular os resgates líquidos de 246 milhões de euros nos fundos de curto prazo, 128 milhões de euros nos fundos de obrigações e 412 milhões de euros nos outros fundos. Dentro dos fundos de ações, destacou-se a categoria de fundos de ações globais, que registaram subscrições líquidas de 358 milhões de euros em 2022.

Analisando apenas os fluxos de dezembro, é notória uma inversão de tendência, com subscrições líquidas totais de 247 milhões de euros, o que atenuou o saldo negativo do conjunto do ano e parece indiciar uma evolução positiva no arranque de 2023.

Os fundos de obrigações foram os grandes responsáveis por esta recuperação, pois atraíram subscrições líquidas de 210 milhões de euros. Os sinais de que a inflação já atingiu o pico e a economia global vai travar a fundo em 2023 reforçam a atratividade das obrigações, daí que os investidores estão a apostar forte na recuperação desta classe de ativos que sofreu perdas históricas em 2022.

Caixa Gestão de Ativos reforça liderança

A maioria das sociedades gestoras não ficou imune à queda nos mercados, com as seis primeiras do ranking em Portugal a verem os montantes sob gestão baixar face a 2021.

É o caso da Caixa Gestão de Ativos, que baixou 9,8% para 6.268 milhões de euros. Como a queda foi inferior à do mercado, a gestora da Caixa Geral de Depósitos reforçou a liderança, com a quota de mercado a aumentar 1,6 pontos percentuais para 36,6%.

Com 3.605 milhões de euros em ativos sob gestão, a IM Gestão de Ativos sofreu uma quebra de 16,3%, mas manteve a segunda posição. A BPI Gestão de Ativos fecha o pódio, sendo que tal como as gestoras nas três posições seguintes registou uma descida acima de 10% nos montantes sob gestão.

Entre as sociedades de menor dimensão, destacou-se a Casa de Investimentos com o maior crescimento percentual (48,6%) e a Invest Gestão de Activos com a maior subida em valor (15,4 milhões de euros).

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