“Tentar fixar preços é querer prateleiras vazias”, diz Cláudia Azevedo
Dona dos supermercados Continente defende apoios aos produtores para enfrentarem aumentos de preços e ajudas para subir rendimento das famílias, que estão a comprar menos e bens de menor valor.
Os preços dos produtos nos supermercados foram o foco da conferência de imprensa de resultados anuais da Sonae. A atribuição de ajudas aos produtores e às famílias por parte do Estado é uma das medidas proposta pela líder da dona do Continente, Cláudia Azevedo, para enfrentar a inflação alta nestes bens. A gestora manifestou-se também contra todas as medidas que interfiram na formação de preços nas prateleiras das lojas, depois de um ano em que o Continente teve uma margem de lucro líquido de 2,7%.
“Tentar fixar preços dá sempre mau resultado: um produtor português que tem de melhorar os seus fatores de produção não vai querer vender a uma cadeia portuguesa com os preços fixos. Vai vender para fora. Um produtor estrangeiro não vai vender a Portugal com margens tão baixas. O resultado final de uma política dessas é ter as prateleiras vazias. Isso ninguém quer”, atacou a presidente executiva do grupo Sonae, Cláudia Azevedo, durante a apresentação de resultados. A medida, de caráter temporário, tem sido defendida pelos partidos Chega, PCP e Bloco de Esquerda.
O grupo Sonae garante que não tem estado a ganhar com a inflação alta e deu como exemplo a margem de lucro líquido de 2,7% do Continente (isto é, assumindo que o volume de negócios é igual a 100%, descontando desse valor os custos das mercadorias; os custos com pessoal; os custos com transportes, limpeza e segurança; custos de energia; e amortizações, juros e impostos, sobra uma margem de 2,7% para a empresa). A descida deste desempenho deveu-se, sobretudo, ao aumento de 45,6% nos custos da energia, no montante de mais 30 milhões de euros, detalhou o responsável financeiro da Sonae, João Dolores.
O custo das mercadorias teve um agravamento de 10,6%. Sem detalhar os produtos onde houve maiores subidas na compra aos fornecedores, o responsável financeiro apontou para as categorias de alimentos “de base agrícola, nos frescos e em bens essenciais. Para tentar equilibrar as contas, houve alimentos em que a Sonae teve ganhos “abaixo da margem média, tentando compensar noutros produtos para corresponder às necessidades dos clientes portugueses”.
Tentar fixar preços dá sempre mau resultado: um produtor português que tem de melhorar os seus fatores de produção não vai querer vender a uma cadeia portuguesa com os preços fixos. Vai vender para fora. Um produtor estrangeiro não vai vender a Portugal com margens tão baixas. O resultado final de uma política dessas é ter as prateleiras vazias. Isso ninguém quer
Apesar de o volume de negócios da Sonae MC ter aumentado 9,6% em número comparável de lojas, a inflação alimentar foi de 13%. Com menos rendimentos nas famílias, a empresa assume que há uma “queda de volumes e uma mudança no conjunto de produtos vendidos”, efeito sentido com ainda mais força no início de 2023. “Os clientes estão a restringir os produtos consumidos“, indicou João Dolores. Os consumidores estão a apostar mais em bens de marca própria e em artigos de menor valor.
“As nossas pessoas dedicam todo o seu tempo a trabalharem para termos preços mais baixos e descontos em cartão. A crise é séria e estamos a fazer tudo o que conseguimos para ajudar as famílias”, sinalizou Cláudia Azevedo.
Apoios a famílias e controlo “acima da ASAE”
Insistindo que a distribuição não é culpada pelo aumento de preços, a líder da Sonae defende que a cadeia alimentar “tem tido uma atitude muito responsável” e que “faz sentido [introduzir] medidas do lado dos produtores, com fertilizantes e energia, e das famílias, para aumentar o poder de compra”.
Ainda sobre o Estado e o reforço inspeções da ASAE sobre os supermercados, Cláudia Azevedo dirige-se ao Governo sobre a atribuição de responsabilidades pelo aumento de preços: “fazemos muito mais controlo do que a ASAE e até beneficiamos mais o cliente. Somos um país em que mais dos 50% dos produtos são comprados com promoção”. Para a líder da Sonae, culpados da inflação alta “serão o Presidente da Rússia, a China e a seca”.
A Sonae fechou as contas do ano passado com lucros de 342 milhões de euros, 27,7% acima do registado no ano anterior. No entanto, o resultado líquido atribuível aos acionistas excluindo os itens não recorrentes diminuiu quase 17%, para 179 milhões de euros. Ainda assim, a empresa admite vir a pagar um “valor marginal” do imposto extraordinário sobre eventuais lucros excessivos do setor da distribuição.
“Nós não reconhecemos o conceito de lucros excedentários. Se são lucros de uma empresa que investe no país, que cria emprego, que abre novas lojas, como é o nosso caso, sinceramente, não nos parece correto estar a considerar esses lucros como lucros excedentários. Nos últimos quatro anos abrimos, no retalho alimentar, mais de 200 lojas em Portugal, investimos mais de 800 milhões de euros em Portugal, criámos mais de 5.000 empregos. Investindo, é natural que os lucros também subam, do ponto de vista absoluto. Estar a penalizar quem investe no país parece-nos um mau princípio”, avaliou João Dolores.
Na visão de Cláudia Azevedo, esta contribuição é um “novo imposto sobre o crescimento”, que “só existe” em Portugal e na Hungria, país com o qual a gestora “não gostava de estar em muitas categorias”
Plano de abertura de lojas mantém-se
Apesar do contexto inflacionista e da diminuição das margens de negócio, o grupo da Maia vai manter o plano de abertura de 20 novos supermercados para 2023. A principal aposta será nas lojas Bom Dia, de maior proximidade junto dos consumidores, “expandindo a rede de forma mais capilar”, sinalizou o responsável financeiro.
Sobre um eventual abrandamento da taxa de inflação, embora haja expectativa “é difícil saber quando é que vai acontecer”. João Dolores adianta: “Tudo vamos fazer, enquanto a inflação estiver neste nível, para tentar absorver parte dessa inflação e proteger as famílias portuguesas desse impacto.”
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