Ambientalistas exigem moratória “imediata” à produção elétrica a partir de biomassa e apontam impactos

Ambientalistas alertam para os impactos da produção de eletricidade a partir de biomassa, em particular no caso das empresas do setor da celulose.

As associações ambientalistas querem que o Governo introduza uma moratória “imediata” sobre a nova capacidade de produção de eletricidade a partir de biomassa, e que estes projetos deixem de ser elegíveis aos subsídios de energias renováveis. Para os ambientalistas, as empresas da indústria papeleira estão a queimar madeira numa taxa superior em relação a qualquer outro setor em Portugal, e dizem que esta tecnologia é responsável por mais emissões poluentes do que as alternativas de geração de eletricidade com base em combustíveis fósseis, como as centrais de gás natural.

Esta terça-feira, Dia Internacional da Floresta, a Quercus, a Acréscimo, a Biofuelwatch, a Environmental Paper Network (EPN) e a Associação Nacional de Ambiente (IRIS) afirmam que as fábricas de celuloses estão a queimar mais madeira para produzir energia do que qualquer outro setor em Portugal.

As associações ambientalistas, argumentam que, apesar das duas empresas afirmarem que a queima de biomassa para produção de energia ajuda a combater as alterações climáticas e a reduzir o risco de incêndios florestais, a análise feita por estas associações revela o contrário. A The Navigator Company e a Altri, como representantes do setor em causa e detentoras de centrais de biomassa, foram contactadas pelo ECO/Capital Verde, mas não apresentaram o contraditório até à publicação deste artigo.

Segundo as associações, o setor da pasta e do papel em Portugal é responsável por quase 80% da eletricidade produzida anualmente em Portugal a partir da biomassa, o equivalente a 6% da produção total de eletricidade em Portugal. Para tal, revelam, o setor queimou 2,9 milhões de toneladas de biomassa em 2021, quase 60% das quais provenientes diretamente de operações de exploração florestal, “principalmente das extensas plantações de monoculturas de eucalipto em Portugal”, explicam. Segundo o relatório, mais de 70% de toda a biomassa queimada para produção de eletricidade em Portugal em 2021 foi classificada como resíduos de eucalipto.

Dessas toneladas, mais de um milhão era referente a biomassa florestal primária (ou seja, madeira retirada diretamente de florestas ou de plantações de árvores).

Nenhuma das empresas mencionadas neste relatório torna pública a informação sobre o abastecimento de biomassa, e todas se recusaram a fornecer informações como a quantidade e o tipo de biomassa que queimam”, escrevem as associações ambientalistas.

"Os incentivos à eletricidade a partir da queima de biomassa incentivam a intensificação da exploração florestal e a expansão das plantações de monoculturas de árvores, muitas vezes no lugar dos ecossistemas naturais. Estamos a ver esta tendência preocupante desenvolver-se, não só em Portugal, mas em todo o mundo”

Sophie Bastable, da Environmental Paper Network

Alexandra Azevedo, Presidente da Quercus, indica que nos últimos anos os “lucrativos” subsídios às energias renováveis encorajaram a construção de “grandes e ineficientes centrais termoelétricas dedicadas à queima de biomassa”. Exemplo disso, apontam, é a central elétrica de biomassa de 34,5 megawatts (MW) da Altri na Figueira da Foz, e a caldeira de biomassa da The Navigator Company, na mesma localidade, que substituiu uma central de cogeração (produção combinada de calor e eletricidade) a gás fóssil.

Em teoria, explicam, apenas a eletricidade produzida através da queima de resíduos florestais (tal prevê a legislação portuguesa) e subprodutos industriais é elegível para o regime de subsídios de Portugal. No entanto, segundo as associações, não é isso que acontece.

Na nota onde é citada, Alexandra Azevedo alerta ainda que “essas centrais precisam de muito mais madeira do que a que é produzida“, como os sobrantes florestais ou os resíduos de celulose, o que obriga a que “grandes quantidades de madeira adicional sejam trazidas diretamente das operações de exploração florestal”.

Ambas [Navigator e Altri] dependem de grandes volumes de biomassa lenhosa diretamente de sobrantes das operações florestais“, como ramos, pequenos troncos ou arbustos secos, “e têm sido financiadas como desenvolvimentos “verdes“, acusam as organizações.

Capacidade instalada de eletricidade de biomassa quase duplicou… e área ardida não diminuiu

Uma das justificações apresentadas pelas papeleiras com centrais de biomassa (existem 13 em Portugal) é que a prática reduz o risco de incêndio através da remoção de resíduos florestais em áreas de alto risco.

Contudo, os ambientalistas sublinham que existem muito poucas provas de que esta estratégia esteja a funcionar e citam um relatório elaborado para o Parlamento, em 2013. No documento, é referido que “a ideia de que a construção de centrais de biomassa por todo o país iria resolver decisivamente a redução do risco de incêndio…não corresponde totalmente à realidade“.

Desde 2007, que a capacidade instalada de eletricidade de biomassa quase duplicou em Portugal e a área ardida tem vindo a aumentar. Em 2017, atingiu o valor mais elevado.

"Se [a redução do risco de incêndio] fosse verdade, então a gravidade dos incêndios deveria diminuir à medida que mais biomassa florestal é queimada em centrais termoelétricas ou transformada em pellets de madeira. ”

Acréscimo, Biofuelwatch, EPN, IRIS e Quercus

Ambientalistas querem fim de subsídios e moratória sobre nova capacidade elétrica

As cinco associações rejeitam os benefícios ambientais defendidos pelas fábricas de celulose, argumentando que os dados recolhidos indicam que eletricidade produzida a partir de biomassa resulta “frequentemente” em maiores emissões do que os equivalentes de combustíveis fósseis. Além disso, alertam que a extração excessiva desta matéria-prima “está a prejudicar a saúde do solo” e a aumentar “a pressão para a expansão de perigosas plantações de eucalipto”.

Assim, defendem que deve ser introduzida “de imediato” uma moratória sobre a nova capacidade elétrica a partir de biomassa, defendendo também o fim da sua elegibilidade para subsídios de energias renováveis, privilegiando que esses apoios sejam redirecionados para o investimento em energias “verdadeiramente verdes” e no sequestro de carbono.

Além disso, pedem que as centrais de biomassa nas fábricas de celulose deixem de recorrer à biomassa florestal primária, isto é, qualquer matéria-prima lenhosa de origem vegetal que seja proveniente diretamente de florestas e plantações de árvores, e dependam apenas da biomassa secundária (subprodutos do processamento da madeira) para a produção de energia.

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