Euronext reforça no ESG com índice de biodiversidade e montra de dados
As empresas portuguesas elegíveis para o novo índice de biodiversidade da Euronext - Galp, EDP e Jerónimo Martins - não foram selecionadas. Destacam-se as empresas norte-americanas e japonesas.
A Euronext, que gere a bolsa de Lisboa e outras seis bolsas europeias, prepara-se para lançar uma série de iniciativas dentro do universo da sustentabilidade.
De acordo com um comunicado publicado esta quinta-feira, a Euronext vai avançar com um novo índice focado na biodiversidade, reforçar a oferta de formação sobre sustentabilidade nos mercados, aumentar a transparência com uma nova “montra” para os dados de sustentabilidade no seu site e criar ainda uma fundação dedicada a apoiar as causas sociais, ambientais e sociais.
“A sustentabilidade é uma parte crescente daquilo que fazemos na Euronext, porque está a ocupar mais espaço no mundo financeiro. É uma tendência que acreditamos que está aqui para ficar”, introduz a responsável de ESG e Finanças Sustentáveis na Euronext, Camille Leca, em declarações ao Capital Verde.
A dona da bolsa de Lisboa está a lançar várias novidades no âmbito da Semana da Sustentabilidade da Euronext, na qual dinamiza cerca de 40 eventos externos e internos, combinando conferências, workshops e webinars, dentro da temática do ESG – a sigla inglesa que se refere às preocupações ambientais, sociais e de governança.
Portugal de fora de novo índice de biodiversidade
O Euronext Biodiversity Enablers World Index não é o primeiro índice no âmbito da biodiversidade criado pela Euronext. É, aliás, o quarto dentro desta temática que é lançado este ano.
No entanto, este novo índice que a Euronext tem para apresentar traz novidades. É o primeiro no mundo — não entre os índices de biodiversidade, mas sim considerando qualquer tipo de índice — que usa o conceito de dupla materialidade, realça Camille Leca. Trata-se de um conceito inspirado nas mais recentes normas europeias de reporte de sustentabilidade, e que tem em conta não só o impacto que a empresa tem quanto ao tema em causa, como também as consequências do tema para a própria empresa.
No caso particular deste índice, é avaliada a forma como as empresas estão expostas à destruição da biodiversidade e o impacto que este tema tem nas suas receitas (as mais expostas são excluídas). Por outro lado, é medido o impacto que as empresas têm sobre a biodiversidade – se for positivo, podem integrar o índice.
À data, não existem empresas portuguesas que cumpram os requisitos para estar neste índice [Euronext Biodiversity Enablers].
Além da análise de dupla materialidade, as empresas são selecionadas com base na sua pontuação na Pegada de Carbono e Biodiversidade, e excluídas automaticamente se as receitas são provenientes da produção de plásticos, pesticidas e da produção ou consumo de óleo de palma não certificado.
Ao Capital Verde, a Euronext aponta que, na data de lançamento, o índice vai contar com um total de 121 empresas, selecionadas a partir do Euronext World Index, o qual tem 1.500 constituintes. Em destaque estão os EUA, que estão representados por 41 empresas no novo índice de biodiversidade, e o Japão, com 32 empresas selecionadas. A participação do resto dos países não ultrapassa um dígito.
Portugal fica de fora desta seleção porque, “à data, não existem empresas portuguesas que cumpram os requisitos para estar neste índice”, afirma fonte oficial da Euronext.
Camille Leca indica que, apesar de existirem três empresas portuguesas entre as 1.500 do Euronext World Index — Galp, EDP e Jerónimo Martins — “não significa necessariamente que estejam a ter um mau comportamento no que toca à biodiversidade”.
Significa que não cumprem os critérios ou, em alternativa, têm pares que cumprem os critérios e que têm um impacto mais positivo, uma vez que as pontuações são construídas para cada empresa em comparação com as do seu setor. “Não são as empresas que mais contribuem [para a biodiversidade], mas isso pode mudar”, indica. O índice deverá ser atualizado anualmente, com a próxima revisão a estar prevista para junho de 2024.
O índice estará disponível a partir desta quinta-feira. O investimento poderá ser feito através de produtos financeiros associados, que se espera que surjam após a publicação do índice.
Mais transparência entre os emitentes
A Euronext quer ser a primeira bolsa de valores a disponibilizar aos investidores os dados individuais não financeiros dos seus 1.900 emitentes, de forma padronizada, no seu site. Para isso, criou uma ferramenta a que chamou “My ESG Profile”, onde pretende ter acessíveis no site da Euronext os esforços de sustentabilidade dos emitentes para qualquer interessado. Esta iniciativa “aumenta a transparência nos mercados financeiros e visa combater o greenwashing”, defende a Euronext.
A maioria dos indicadores apresentados estarão alinhados com a regulamentação europeia, como a Taxonomia da UE, o Regulamento de Finanças Sustentáveis (SFDR) ou a Diretiva de Relatórios de Sustentabilidade Empresarial (CSRD).
A Euronext não vê esta ferramenta como mais um peso para as empresas cotadas, além do peso que a regulação lhes impõe. A responsável de sustentabilidade afirma que esta é uma forma de dar visibilidade ao trabalho que as empresas já terão de apresentar nos seus relatórios, cuja fatia relativa ao ESG muitas vezes não é lida, acredita.
A utilidade deste serviço para os investidores, defende a Euronext, passa pela cobertura de todas as empresas cotadas na Euronext, incluindo pequenas e médias empresas, “que podem não estar devidamente cobertas pelos grandes fornecedores”.
Um dos desafios principais que existe atualmente é a qualidade e comparabilidade dos dados. E a variabilidade dos reportes utilizados pelas empresas, que nem sempre são comparáveis, ou não se focam nas coisas mais essenciais.
No entender de Nuno Fernandes, especialista em finanças sustentáveis contactado pelo Capital Verde, “um dos desafios principais que existe atualmente é a qualidade e a comparabilidade dos dados. E a variabilidade dos reportes utilizados pelas empresas, que nem sempre são comparáveis, ou não se focam nas coisas mais essenciais”. “Existem muitos relatórios ESG que apenas ‘cumprem calendário’ e, embora longos e bonitos, não têm qualquer conteúdo concreto ou ambicioso”, assinala.
Após terem sido informadas desta iniciativa no passado mês de julho, as empresas cotadas serão convidadas, em meados de outubro, a reverem os seus perfis — acrescentando dados e confirmando aqueles que foram preenchidos pela Euronext em parceria com uma entidade especializada na recolha de dados, a Cofisem.
Até ao final do ano, os perfis deverão estar disponíveis para serem consultados pelo público, exceto se as empresas em causa optem por ocultar o seu. Os dados serão atualizados anualmente ou a pedido do emitente.
Cadeias de valor e reporte ESG em foco na formação
A Academy, a entidade da Euronext dedicada à formação, vai abrir duas novas formações nos próximos meses, tendo em conta a procura que reconhece da parte das empresas.
O primeiro tema é “Fornecimento responsável: A Sustentabilidade nas Cadeias de Valor”. A Euronext explica que as empresas têm mostrado a necessidade de aprender a avaliar a pegada carbónica, mas também social, das respetivas cadeias de fornecimento, assim como a necessidade de saber como descarbonizar esta cadeia.
Camille Leca sublinha que, além de ensinar as empresas a cumprirem com as novas exigências, o objetivo é ajudá-las a perceber como podem apoiar a cadeia de valor nesse caminho. A formação vai estar disponível nos dias 28 e 29 de setembro.
A recolha de informação ao longo da cadeia de fornecimento e até ao cliente final “é um dos desafios no cumprimento dos princípios ESG”, atesta Rina Guerra, gestora de portefólios de ações no Banco Carregosa, questionada pelo Capital Verde sobre os maiores desafios para os mercados de capital e para as empresas neste âmbito.
A complexidade e a constante evolução da regulação tornam difícil a sua implementação por parte das empresas e dos agentes económicos em geral. A aplicação de critérios técnicos exige recursos especializados que estas instituições ainda não dispõem.
O segundo tema dentro do qual a Euronext quer formar os emitentes é o reporte, que irá ser explorado nos dias 18 e 19 de outubro na formação “Reporte ESG em ação”. O objetivo é instruir as empresas sobre como fazer o reporte conforme os últimos desenvolvimentos em termos das diretivas.
Camille Leca afirma que os clientes da Euronext se mostram “um pouco perdidos, sem saber por onde começar” no que diz respeito ao reporte, até porque ainda não há muitos profissionais que tenham esta experiência. Ambas as formações são pagas, dando no final direito a certificação.
Rina Guerra também reconhece que “a complexidade e a constante evolução da regulação tornam difícil a sua implementação por parte das empresas e dos agentes económicos, em geral. A aplicação de critérios técnicos exige recursos especializados que estas instituições ainda não dispõem”, indica, para depois acrescentar que o cumprimento da taxonomia é difícil, em particular, para uma pequena empresa.
A gestora do Banco Carregosa acredita ainda que, “às empresas responsáveis pelas bolsas de valores, cabe a função de informar, sensibilizar e esclarecer os emitentes e os investidores, sobre a necessidade de disclosure e transparência em matérias de ESG”, ao mesmo tempo que servem “de ponte” entre as empresas locais e as autoridades pan-europeias, “por forma a que as necessidades e os desafios assinalados pelos primeiros, sejam tidos em conta, na medida do possível, pelos segundos”.
Uma última iniciativa avançada pela Euronext é a criação de uma fundação, que pretende promover o apoio às comunidades locais e aos projetos implantados em toda a Europa nas áreas da literacia financeira, da diversidade e inclusão e dos recursos marinhos.
Algumas das iniciativas vão passar por Portugal, assegura Camille Leca, mas para já a empresa prefere não divulgar os planos.
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