A Advocatus foi conhecer António Barreto Menezes Cordeiro, um dos rostos desta modernização de um escritório com reconhecido mérito académico.
No mês de setembro, o escritório de advogados Menezes Cordeiro passou a assumir-se como um novo player do mercado da advocacia portuguesa. Sendo assim a “primeira” de jurisconsultos a atuar no mercado nacional. Assegurando que quer quebrar as barreiras que a atividade da jurisconsultoria encerra, assume que esta “deve ser acessível a todos os advogados e empresas que busquem soluções de ponta, academicamente sustentadas e ajustadas à prática jurisprudencial”.
A equipa do escritório é formada pelos sócios António Menezes Cordeiro, António Barreto Menezes Cordeiro, Carlos Lacerda Barata e ainda pelo consultor Nuno Andrade Pissarra. A Advocatus foi conhecer António Barreto Menezes Cordeiro, um dos rostos desta modernização de um escritório com reconhecido mérito académico.
Como tem sido seguir as pisadas do seu pai?
Acima de tudo tem sido um privilégio. Julgo que qualquer filho que trabalhe na mesma empresa ou até na mesma área ou setor que os seus pais terá a mesma sensação. A possibilidade de aprender uma profissão ou uma arte com o nosso pai ou com a nossa mãe, com tudo o que isso significa – a vivência de experiências em conjunto, a afinação de estratégias processuais, a cumplicidade que advém da partilha do mesmo gabinete, etc. – é um enorme privilégio profissional e pessoal.
O Direito sempre foi a sua primeira opção?
A partir do momento em que alcancei maturidade suficiente para saber o que efetivamente queria seguir profissionalmente assumi o Direito como sendo a única opção. Não consigo identificar as razões que me empurraram para esse caminho. Não me recordo de o Direito ser tema de conversa em casa antes de eu entrar na faculdade e também não tenho memória de ter sido persuadido a candidatar-me à Universidade de Lisboa. Todavia, o facto de ambos os meus pais serem juristas terá, mesmo que inconscientemente, influenciado a minha decisão.
Mas, curiosamente, nunca pensei seguir a carreira académica. Fiz toda a Licenciatura de Direito sem essa ambição ou preocupação. Olhando para trás, julgo que a ausência dessa pressão acrescida foi decisiva tanto para desfrutar do curso, como para aproveitar a vida de estudante. Depois de concluir a Licenciatura fui para Londres tirar um LLM. Não com o propósito, uma vez mais, de seguir a vida académica, mas de aperfeiçoar os meus conhecimentos jurídicos e de alcançar um maior domínio da língua inglesa. De resto, o facto de ter um LLM no meu currículo surge, ainda hoje, como algo pouco comum na academia jurídica portuguesa. Apenas quando estava a elaborar a tese do LLM decidi que queria continuar a atividade de investigação. Ponderei continuar em Londres, estive quase a seguir para os Estados-Unidos, mas acabei por me inscrever no doutoramento na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Pelo caminho, tive uma passagem pela Cuatrecasas, enquanto estagiário. A entrada na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa apenas ocorre depois de entregar a tese de doutoramento. Na altura, a minha candidatura a assistente convidado surgiu como algo natural, em virtude das opções até então tomadas.
O passo que agora estamos a dar corresponde, por um lado, a uma exteriorização do modelo que temos vindo a desenvolver nos últimos anos e, por outro lado, a uma vontade de consolidar e estender este modelo para lá das fronteiras do Direito privado.
Como é pegar num escritório que é uma referência há décadas, sedimentada pelo nome do seu pai, e modernizá-lo?
Já há alguns anos que avaliávamos a possibilidade de constituir uma sociedade de jurisconsultos, ou seja, uma sociedade focada não na atividade de advocacia, mas nas diversas atividades que o mercado associa à figura do jurisconsulto. O processo de modernização, utilizando a sua expressão, foi delineado e assumido por mim, mas trata-se de uma estratégia conjunta, que recebeu, desde o início, o apoio material do meu pai e que se sustenta na sua enorme experiência e prestígio académico e profissional. A modernização da Menezes Cordeiro não corresponde a uma passagem de testemunho para uma nova geração, mas antes a uma colaboração de diferentes gerações. A capacidade de trabalho e a produção científica do meu pai continuam a ser incomparáveis e nada antevê que vá abrandar na próxima década.
Sinto alguma responsabilidade acrescida por liderar este processo de modernização. Mas o facto de se tratar de um projeto maduro e com provas dadas torna tudo natural.
Em que consiste, em concreto, este rebranding da vossa sociedade?
A Sociedade António Menezes Cordeiro e Associados foi fundada em 1996. A prática da advocacia assumiu sempre uma parcela pouco significativa da nossa atuação. O grosso sempre consistiu na elaboração de pareceres e na participação em arbitragens, em especial desempenhando a função de árbitro. O passo que agora estamos a dar corresponde, por um lado, a uma exteriorização do modelo que temos vindo a desenvolver nos últimos anos e, por outro lado, a uma vontade de consolidar e estender este modelo para lá das fronteiras do Direito privado.
A atividade dos jurisconsultos, em especial no âmbito da produção de pareceres, é, reconhecidamente, uma atividade de excelência, no sentido do resultado que é apresentado ao cliente final. Todavia, tanto a forma como essa atividade é apresentada ao exterior, como os procedimentos profissionais internos mantêm-se inalterados há longas décadas. Em certa medida, existe um paralelismo entre a modernização da Menezes Cordeiro e o processo que o sector da advocacia viveu com especial intensidade a partir da década de 90 do século passado, com a emergência de efetivas sociedades de advogados.
Repare-se que a Menezes Cordeiro não é uma sociedade de advogados, mas uma sociedade de jurisconsultos. Não pretendemos concorrer com as sociedades de advogados, mas antes modernizar as diferentes dimensões da atividade de jurisconsultoria. Em termos sucintos, podemos identificar três grandes áreas de atuação: primeira, a elaboração de pareceres e de notas legais; segunda, a participação em arbitragens na função de árbitro; e terceira, o acompanhamento processual, desde o aconselhamento da estratégia processual até à revisão de peças processuais.
Também o nosso público-alvo pode ser apresentado de forma tripartida: sociedades de advogados, advogados em prática individual e não juristas, nomeadamente entidades empresariais ou pertencentes ao terceiro sector. O nosso cliente final é sempre este último, mas, em regra, o contacto é intermediado por advogados que procuraram os nossos conhecimentos ou experiência. A maioria dos contactos advém das grandes sociedades, o que reflete, por um lado, a concentração do mercado, mas também, estou em crer, a dificuldade que alguns advogados em prática individual têm em nos contactar. Trata-se de outra barreira que pretendemos quebrar.
A ideia do novo projeto é tornar os pareceres jurídicos num produto não centrado num só jurista?
Esta é, sem dúvida, a parte mais inovadora da Menezes Cordeiro. Nos últimos anos, o Direito tornou-se, nomeadamente em virtude da enorme produção legislativa com origem em Bruxelas, muito especializado. É hoje muito mais difícil ao mesmo advogado ou académico manter-se atualizado em diferentes ramos jurídicos. Mas esta especialização, curiosamente, tem sido acompanhada de uma crescente ecleticidade dos litígios e das operações negociais. Isso há muito que é reconhecido pelas sociedades de advogados. Ora, no âmbito da elaboração e pareceres, nota-se cada vez mais que as matérias abrangidas pelos litígios ou pelas transações negociais exigem a participação de jurisconsultos com diferentes conhecimentos. O mercado tem ultrapassado isso recorrendo, de forma independente, a diferentes especialistas. Mas esta solução padece de uma grande fragilidade: os pareceres são elaborados autonomamente, sem que cada jurisconsulto tenha, muitas vezes, conhecimento do que foi defendido nos outros pareceres. Este modelo é igualmente pouco eficiente, na medida em que obriga cada jurisconsulto a enquadrar o litígio ou a transação negocial.
A Menezes Cordeiro propõe um novo modelo de análise jurídica: a autónoma, feita por especialistas de diferentes ramos jurídicos, a conjunta e a integrada. Preciso que me explique, na prática, como cada uma delas vai funcionar.
Nos últimos anos, começamos a colaborar, de forma mais estreita, com jurisconsultos de outras áreas, de forma a apresentar ao cliente final um parecer que cubra todas as áreas em concreto relevantes. Trata-se, até agora, de uma estratégia vencedora em todas as suas diferentes dimensões: pareceres mais completos e sustentados e mais eficientes, tanto do ponto de vista económico, como do ponto de vista do tempo exigido para a sua elaboração.
Numa perspetiva prática, recebido um pedido de parecer, o litígio ou a transação negocial são avaliados por jurisconsultos de diferentes ramos jurídicos, tantos quantos os necessários. Essa análise autónoma permite, ainda, a identificação de problemas ou de fragilidades que escaparam ao próprio cliente. Segue-se uma discussão conjunta quanto à melhor estratégia a seguir e subsequente a elaboração individual das correspondentes análises autónomas. Por fim, todas essas partes são integradas num documento único. Estou, naturalmente, a simplificar: o processo é particularmente dinâmico e participativo.
Nem todos os pedidos de pareceres que nos chegam justificam esta abordagem, naturalmente. Quando a matéria assume uma dimensão jurídica unidimensional, o parecer é elaborado apenas por um jurisconsulto. Todavia, mesmo nesses casos importa avaliar o eventualmente cabimento em incluir outros especialistas.
A atividade da jurisconsultoria está perfeitamente consolidada no mercado, bem como a atuação individual dos vários sócios e consultores da Menezes Cordeiro. Por outro lado, a nossa experiência dos últimos anos mostra que a elaboração de pareceres de forma conjunta é particularmente benéfica para o cliente final. A incógnita, aqui, é a que acompanha qualquer novo projeto: como irá o mercado responder? A médio prazo e assumindo que esta pergunta merece uma resposta positiva, pretendemos alargar o colégio de sócios a outros jurisconsultos, muitos dos quais já hoje colaboram connosco, de forma a cobrir todos os ramos jurídicos.
O nosso público-alvo são as sociedades de advogados, advogados em prática individual e não juristas, nomeadamente entidades empresariais ou pertencentes ao terceiro setor
Que mudanças prevê que possam acontecer no vosso dia-a-dia com a nova Lei das Associações Públicas Profissionais?
É difícil, para já, antever o impacto real, para mais antes das necessárias alterações ao Estatuto da Ordem dos Advogados. Todavia, não antecipo uma particular mudança no imediato. Não é expectável que, de um dia para o outro, o setor passe a ser dominado por sociedades multidisciplinares. É natural que com a passagem do tempo o mercado comece a testar nova soluções, eventualmente inspiradas na realidade espanhola. Em última análise, o futuro irá depender das vantagens que dessa multidisciplinariedade possam resultar para os potenciais clientes. Não apenas numa perspetiva económica ou de agilidade transacional, mas, essencialmente, dos resultados alcançados.
A multidisciplinaridade nos escritórios de advogados assusta-o?
O sector da advocacia é usualmente descrito como sendo muito conservador e avesso a mudanças. Tenho dúvidas de que esta caracterização seja correta. Numa perspetiva macro, o mercado da advocacia é hoje totalmente distinto do existente na década de 90. Em poucas décadas tornou-se irreconhecível. Quanto à colaboração entre advogados e profissionais de outras áreas, esta é antiga e tem-se adensado nos últimos anos, tanto no recurso a peritos, como na conjugação de esforços em grandes transações comerciais e financeiras.
As críticas que os advogados dirigem à multidisciplinariedade não devem ser interpretadas como meramente cooperativistas. A natureza da relação que se estabelece entre o advogado e o seu cliente assume contornos próprios e incomuns: o advogado, enquanto representante, age em nome do cliente. Ao assumir essa função, obriga-se a atuar sempre no melhor interesse do cliente e a colocar os interesses deste à frente dos seus interesses individuais. Se a natureza desta relação for posta em causa em virtude da multidisciplinariedade, os interesses dos clientes serão prejudicados.
Na questão dos estagiários – sendo professor na Faculdade de direito – acha que haverá uma maior resistência dos advogados aceitarem serem patronos, agora que serão estágios remunerados?
Julgo e espero que não. Esta visão da relação patrono e estagiário, em que este é pago pelos conhecimentos que o primeiro lhe transmite não se adequa à realidade contemporânea, nem à democratização do Ensino Superior e à democratização do acesso à profissão de advogado. Trata-se de uma concepção que pressupõe que o estagiário, sendo de uma classe privilegiada, não necessita de ser remunerado para viver com dignidade. Ora, na eventualidade de um advogado não conseguir pagar a estagiários que consigo trabalham, a resposta só pode ser: não deve acolher estagiários.
Como se faz a retenção de talento de jovens advogados em escritórios mais pequenos, quando os grandes escritórios têm melhores condições para oferecer?
Em princípio, os alunos mais talentosos irão rumar aos grandes escritórios. É natural que assim seja. Não apenas por razões económicas, mas também pela possibilidade de participarem em operações e litígios mais estimulantes e até pelas condições que hoje muitos grandes escritórios disponibilizam, nomeadamente no âmbito de licenças parentais. Aos escritórios com menores capacidades económicas, resta-lhes ser imaginativos no modo como cativam os jovens talentos, tanto do ponto de vista de progressão interna, como da possibilidade de conjugarem a vida de advogado com interesses não puramente profissionais, cada vez mais relevantes para as novas gerações.
Na academia vivemos hoje um problema idêntico, sendo cada vez mais complicado reter nas Faculdades de Direito os alunos mais promissores. O fim da figura do assistente, em virtude da Reforma de Bolonha, apenas permite que as Faculdades contratem os seus recém-licenciados a título de assistente convidado, sem vínculos efetivos e com ordenados muitíssimo inferiores aos praticados pelos grandes escritórios.
A nossa experiência dos últimos anos mostra que a elaboração de pareceres de forma conjunta é particularmente benéfica para o cliente final. A incógnita, aqui, é a que acompanha qualquer novo projeto: como irá o mercado responder?
A formação da Ordem dos Advogados está quase idêntica à de há 20 anos. Esta mudança que a LAPP trouxe, pode vir alterar esse status quo, de forma palpável?
Enquanto estagiário e, subsequentemente, enquanto professor, sempre considerei que a formação disponibilizada pela Ordem dos Advogados era excessiva e desconsiderava o conhecimento obtido pelos recém-licenciados nas Faculdades de Direito. Não se justifica reavaliar os estagiários em matérias que são ministradas em todos os Cursos de Direito do país. Para mais quando a abertura de novos cursos de Direito está dependente de um rigoroso processo de acreditação. Julgo que é uma oportunidade de ouro para rever a formação, de modo a focá-la em aspetos que não são ensinados na Licenciatura, com destaque para as matérias deontológicas.
De que forma a IA pode vir a alterar a forma de se trabalhar na advocacia?
A História mostra-nos que os desenvolvimentos tecnológicos têm um impacto tremendo em todas as profissões, sendo que a advocacia não é, seguramente, uma exceção. Os computadores pessoais, os correios eletrónicos e a internet, no geral, tiveram um enorme impacto no setor. A IA leva-nos, porém, para um novo patamar, na medida em que todos os exemplos referidos apenas permitiram ao advogado fazer o seu trabalho de forma mais rápida, cómoda e eficiente. A IA, dependendo, naturalmente, do software ou procedimento em causa, pode substituir-se ao advogado, não apenas no trabalho de pesquisa, como na determinação de estratégias processuais, análises jurídicas e económicas de contratos e, no limite, na própria elaboração de peças processuais. Não creio, porém, que corramos o risco de desaparecer: a atividade da advocacia, em especial a representação jurídica dos clientes e a sua defesa em juízo, manter-se-á monopólios do ser humano e só deixarão de o ser com a confluência de dois fatores: primeiro, a IA alcançar um estágio cognitivo idêntico ao do ser humano; e segundo, o sistema jurídico, em especial o processual, ser adaptado à representação não humana. Estamos muito longe dessa realidade.
Se fosse ministro da Justiça, quais seriam os três aspetos de reforma em que se concentraria?
Julgo que todos os portugueses que tenham um mínimo de atenção aos problemas sociais e políticos, numa aceção ampla, do nosso país, facilmente identificam na lentidão da Justiça o maior problema do setor. O impacto daí decorrente é enorme, tanto económica, como pessoalmente: são incontáveis as pessoas que têm as suas vidas em suspenso em virtude da demora das decisões dos nossos tribunais. É esta lentidão que justifica, mas que em caso algum legitima, as fugas de segredo de justiça e a transformação de incontáveis atuações das polícias criminais e do Ministério Público em espetáculos públicos que prejudicam a imagem de todos os envolvidos.
Para além do indispensável combate à morosidade na aplicação da Justiça, concentrar-me-ia, eventualmente em virtude da minha formação académica, numa reforma de fundo do procedimento legislativo. Destacaria, nesse âmbito, três pontos: primeiro, a constituição de uma entidade independente, idêntica à Law Commission inglesa, com competências para propor alterações legislativas de fundo; segundo, a obrigatoriedade de publicação de trabalhos preparatórios, que permitissem aos agentes jurídicos melhor interpretar e aplicar a lei; e terceiro, a criação de um portal interativo, semelhante ao hoje disponibilizado por algumas autoridades de supervisão europeias, em que o utilizador pode consultar, de forma intuitiva, todas as diferentes camadas legislativas e regulamentares em concreto relevantes. A intensa produção legislativa exige um novo modelo de codificação multidimensional. Julgo, por fim, que não resistiria a iniciar a reforma do Código Civil: a ambição de qualquer civilista.
A justiça tem sido utilizada como arma política?
A Justiça faz parte da Política, na sua aceção mais ampla e nobre, e os tribunais, enquanto órgãos de soberania, estão sujeitos ao escrutínio democrático. Neste sentido, parece-me óbvio que os agentes políticos debatam o estado da Justiça e a atuação dos tribunais e do Ministério Público. Todavia, se a questão tem um propósito mais cirúrgico, no sentido de: os órgãos judiciais agem por motivos políticos ou o Estado recorre a esses mesmos órgãos judicias com propósitos político-partidários, não tenho elementos que me permitam responder. Apenas constato, como qualquer cidadão atento, que a atuação dos agentes judiciais nem sempre beneficia a Justiça e os nossos interesses coletivos.
Na eventualidade de um advogado não conseguir pagar a estagiários que consigo trabalham, a resposta só pode ser: não deve acolher estagiários.
O direito é muito burocrata ainda?
Julgo que importa distinguir a formalidade e a rigidez intrínseca ao Direito, do conceito, depreciativo, de burocrata. Os dois primeiros aspectos são indispensáveis à existência do Direito e à aplicação da Justiça. A burocracia surge, nesse sentido, como uma defesa das partes e como uma garantia do Estado de Direito. As próprias exigências formais prosseguem idênticos propósitos. Presumo, porém, que se refira a um eventual excesso de formalidades e exigências processuais e procedimentais, usualmente associados ao sector público e que assumem, não raramente, dimensões kafkianas. Nessa perspetiva, tendo a concordar: a simplificação e modernização dos procedimentos administrativos, apregoada por todos os partidos e governos, não tem produzido os resultados que todos desejamos.
E as faculdades de direito são muito ‘burocratas’, conservadoras e muito iguais ao que eram há 20 anos?
Julgo que é importante distinguir três dimensões. A dimensão burocrática do sector público, a dimensão política, relativa à vida interna das instituições, e a dimensão académica. Em relação à primeira dimensão, as Faculdades de Direito padecem dos mesmos problemas que qualquer cidadão facilmente constata em relação ao sector público: falta de meios humanos e grandes obstáculos à introdução de reformas de fundo. Quanto à dimensão política, as Universidades Públicas são particularmente democráticas, com eleições periódicas para os seus vários órgãos. Por fim, em relação à dimensão académica, as Faculdades de Direito sempre foram muito abertas ao mundo lusófono e, por contraste, sempre se mostraram pouco interessadas no mundo anglo-saxónico. Esta realidade tem vindo a mudar e julgo que deve ser aprofundada. Todavia, as Faculdades de Direito assumem um papel no mundo lusófono que tende a ser ignorado pelos não juristas. Recorde-se, a título de exemplo, que o Código Civil português governa o dia-a-dia de 80 milhões de pessoas em 3 continentes distintos. Este elo comum – o único para além da língua portuguesa – deve ser preservado e trabalhado.
E o ensino do direito? O que mudou desde o seu tempo de estudante?
No geral mantém-se inalterado. Creio, de resto, que a reforma de Bolonha, pelo menos nos termos em que foi aplicada nas Faculdades de Direito, foi prejudicial ao ensino e à aprendizagem. Os estudantes de Direito necessitam de tempo para assimilar novos conhecimentos e necessitam de ganhar maturidade e experiência para avaliarem juridicamente os casos que lhes são apresentados.
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“Não pretendemos concorrer com as sociedades de advogados, mas antes modernizar a jurisconsultoria”, diz o advogado António Barreto Menezes Cordeiro
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