Não há tempo a perder. Quatro recomendações de Bruxelas
Portugal saiu do PDE e não entrou no procedimento por desequilíbrios macroeconómicos. Mas não quer dizer que a Comissão não tenha deixado alertas. Aqui ficam as principais recomendações de Bruxelas.
A manhã desta segunda-feira trouxe uma mão cheia de boas notícias: a Comissão Europeia recomendou a saída de Portugal do Procedimento por Défice Excessivo; a decisão foi unânime entre os comissários; e Bruxelas validou os planos portugueses no que toca a reformas estruturais, garantindo que o país não vai sair de uma vigilância reforçada só para a seguir entrar noutra. Mas… há sempre um mas. A Comissão Europeia deixou quatro recomendações específicas para o país, que resultam da análise aprofundada à economia portuguesa. E depois de já ter sido alvo de um aviso por ter dado passos curtos no passado, o ministro das Finanças, Mário Centeno, desta vez não pode fazer ouvidos de mercador.
“Baseada na avaliação dos compromissos de política de Portugal, a Comissão confirma a sua avaliação anterior de que, neste momento, não são necessários mais nenhuns passos no âmbito do Procedimento de Desequilíbrios Macroeconómicos”, lê-se no relatório com as recomendações específicas para Portugal. Na conferência de imprensa, o comissário Pierre Moscovici traduziu do bruxelês: quer dizer que o Programa Nacional de Reformas português foi analisado e que a Comissão concluiu que é “suficientemente ambicioso” para prevenir Bruxelas de “levar a cabo qualquer outro procedimento legal.”
Mas o facto de Portugal sair do PDE e não entrar no PDM — que é a nova sigla que o país vai ter de seguir — não quer dizer que não vá continuar sob o olhar atento de Bruxelas. “Vamos contudo manter um diálogo forte” com o Governo, avisou logo o comissário para os Assuntos Económicos e Financeiros. O ECO conta-lhe quais são as quatro áreas em que Centeno vai ter de pôr o pé no acelerador.
1 – Corrigir o défice de forma duradoura
O corte no défice para menos de 3% do PIB tem de ser estrutural. Isso quer dizer cumprir os requisitos do Programa de Estabilidade e Crescimento, “que se traduzem num esforço orçamental substancial para 2018.”
Nas Previsões de Primavera, a Comissão já tinha avisado que não identificava medidas de consolidação orçamental estruturais e que os cortes que estavam planeados para a despesa não estão suficientemente especificados pelo Governo.
Sobre 2017, a Comissão avisa que os compromissos do Executivo não chegam nem para cumprir a meta de corte estrutural do défice, nem a de redução da dívida — mesmo tendo em conta que o país beneficia de um período transitório de três anos. As autoridades comunitárias lembram até que “o Conselho é da opinião de que serão necessárias mais medidas em 2017 para cumprir as exigências do Pacto de Estabilidade e Crescimento.”
"A Comissão pretende fazer uso da margem aplicável de discricionariedade à luz do atual ciclo económico de Portugal.”
Contudo, adiantam que Bruxelas vai fazer uso da sua margem de avaliação discricionária, tendo em conta que a linha de orientação para todos o espaço comunitário aponta para a necessidade de ter em conta o atual ciclo económico. Por outras palavras, quer dizer que o esforço de consolidação deve continuar, mas que ele deve ser moderado pela necessidade de não colocar em causa a retoma económica. “Neste contexto, a Comissão pretende fazer uso da margem aplicável de discricionariedade à luz do atual ciclo económico de Portugal”, lê-se no relatório com as recomendações específicas para Portugal.
E como é que Portugal pode corrigir o défice de forma duradoura?
- A política orçamental deve contribuir para a retoma económica ao mesmo tempo que assegura a sustentabilidade das finanças públicas;
- Os esforços para terminar a revisão da despesa pública devem ser acelerados;
- O controlo da despesa deve ser reforçado, com correta orçamentação. É dado destaque ao setor da Saúde, pedem-se esforços para reduzir os pagamentos em atraso nesta área e para promover a sustentabilidade do sistema de pensões;
- Pedem-se metas de eficiência específicas para o setor empresarial do Estado, a tempo do Orçamento de 2018, que permitam melhorar os resultados líquidos destas empresas e reduzir o seu peso no Orçamento do Estado.
2 – Atenção ao mercado de trabalho
Sobre o mercado de trabalho a Comissão tem duas recomendações de base a fazer: uma sobre o tipo de contratos que a política do Governo deve promover, outra sobre os aumentos do salário mínimo. Mas há mais.
- “Promover a contratação sem termo, incluindo através da revisão do enquadramento legal”
Bruxelas salienta que o nível de contratos temporários ainda é elevado e nota que o programa desenhado este ano pelo Executivo para fomentar vínculos mais estáveis deve ter pouco impacto na redução da segmentação, já que deverá abranger poucas pessoas.
A Comissão repesca ainda uma crítica antiga: o despedimento individual de trabalhadores nos quadros continua a gerar custos elevados e incertos para as empresas. Isto acontece, em parte, porque os trabalhadores podem vir a ser reintegrados no seu posto de trabalho caso o despedimento venha a ser considerado ilícito e devido a ineficiências nos procedimentos legais, dizem as recomendações específicas.
- “Assegurar a ativação dos desempregados de longa duração.”
Mais de metade do desemprego é de longa duração e esta proporção não está a encolher com a recuperação económica, avisa Bruxelas. O desemprego jovem e de longa duração faz com que as pessoas percam gradualmente as suas competências, o que tem impactos negativos no crescimento potencial. A Comissão nota, porém, que o desemprego jovem está a cair, o que atribui a medidas anteriores como a Garantia Jovem que poderão ajudar a explicar porque é que o nível de jovens que não estudam nem trabalham fica abaixo da média europeia.
- “Em colaboração com os parceiros sociais, assegurar que os desenvolvimentos no salário mínimo não penalizam os trabalhadores menos qualificados.”
A subida do salário mínimo contribui para reduzir a pobreza de trabalhadores e tem um impacto positivo na procura, mas, por outro lado, também comporta riscos para o emprego, sobretudo quando estão em causa pessoas com qualificações baixas, avisa Bruxelas. Estes riscos ainda não se materializaram num contexto de recuperação mas continuam a ser um desafio, diz ainda.
3 – Acelerar os esforços no sistema bancário
A Comissão pede ao Governo que ponha o pé no acelerador para limpar os balanços das instituições financeiras, através de uma estratégia global para o problema do malparado. Bruxelas nota que a percentagem das PME portuguesas que não conseguiram aceder ao montante total de crédito que procuraram em 2016 aumentou para 42%, enquanto a média da Europa dá conta de um desagravamento deste constrangimento.
Neste campo, as recomendações são:
- Promover o desenvolvimento do mercado secundário para a venda de ativos tóxicos por parte dos bancos;
- Melhorar o acesso a capital, nomeadamente para as start-ups e as pequenas e médias empresas.
4 – Cortar custos administrativos
A Comissão quer ver um guião para reduzir os custos administrativos e as barreiras regulatórias até ao final de 2017. Quer também que a eficiência dos procedimentos de insolvência e de cobrança de impostos seja melhorada.
“Há barreiras regulatórias e administrativas no acesso à prestação de serviços em vários setores”, avisa a Comissão Europeia. Os comissários reconhecem que foram feitas reformas para tentar resolver estes constrangimentos, incluindo as questões relacionadas com as profissões reguladas, mas nota que esses esforços “ou foram interrompidos, ou revertidos.” E, por isso, estas são limitações à concorrência que prejudicam a economia.
No âmbito da Administração Pública, Bruxelas reconhece que o Simplex+ é “bastante ambicioso”, mas, mais uma vez, pede rapidez.
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