Patrões querem contrapartidas para salário mínimo de mil euros. Sindicatos acham possível ir mais longe
Caso vença as eleições, o socialista Pedro Nuno Santos promete salário mínimo de mil euros até 2028. Parceiros sociais não fecham a porta, mas os patrões exigem apoios à competitividade das empresas.
Se chegar a primeiro-ministro, Pedro Nuno Santos quer ver o salário mínimo em, pelo menos, mil euros até 2028. Os parceiros sociais não fecham, à partida, a porta a esse aumento, mas, em paralelo, as confederações patronais avisam que são precisas medidas para apoiar e incentivar a competitividade das empresas. Já os sindicatos sinalizam que o salário mínimo poderia até subir mais, com a CGTP a reivindicar os mil euros já este ano.
“O Governo atual havido definido como meta o aumento do salário mínimo nacional dos atuais 820 euros para 900 euros até 2026. Propomos que, no final da próxima legislatura, em 2028, o salário mínimo atinja, pelo menos, os 1.000 euros“, prometeu o novo secretário-geral do PS durante o congresso do partido, que acontece no passado fim de semana.
Depois de vários anos de congelamento, desde 2015 que o salário mínimo tem subido todos os anos, mesmo durante o período da pandemia. E em 2022 o Governo liderado por António Costa assinou um acordo com as confederações patronais e com a UGT, prevendo que chegaria a, pelo menos, 900 euros em 2026.
Contudo, a demissão do primeiro-ministro, na sequência de uma investigação judicial relacionada com negócios na área da energia, colocou em causa esse entendimento. Por outro lado, Pedro Nuno Santos já veio sinalizar que, caso vença as eleições antecipadas marcadas para 10 de março, a trajetória crescente do salário mínimo nacional é para manter.
“Definir quase a cepo um objetivo parece-nos que não é realista”, reage o presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP). Em declarações ao ECO, João Vieira Lopes não fecha a porta ao valor prometido pelos socialistas, mas deixa claro que só está “disposto a entrar na discussão” se forem também discutidas “outras medidas para melhorar a competitividade das empresas“.
Nunca gostamos muito de estar a marcar administrativamente estes objetivos. O salário mínimo tem de estar ligado ao aumento da produtividade, à inflação e ao crescimento da economia.
Aliás, o responsável lembra que os acordos que têm sido assinados em Concertação Social não têm versado apenas sobre os salários, mas sobre um conjunto de outras medidas. Sendo que o alívio da carga fiscal é, neste momento, uma das prioridades da CCP, a par de “incentivos fortes à capitalização e ao investimento“.
“Nunca gostamos muito de estar a marcar administrativamente estes objetivos. O salário mínimo tem de estar ligado ao aumento da produtividade, à inflação e ao crescimento da economia“, insiste João Vieira Lopes.
Na mesma linha, Armindo Monteiro, presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), realça ao ECO que, ao contrário do aumento do salário mínimo, “o crescimento da economia não se decreta, mas tem de ser construído“.
“A CIP já o disse: queremos uma economia mais competitiva que seja capaz de pagar melhores salários. Consideramos que é possível chegar a 2030 acima da média europeia do salário mínimo, se materializarmos um plano igualmente exigente que permita que a nossa produtividade do trabalho se aproxime da média europeia“, salienta o “patrão dos patrões”.
É possível chegar a 2030 acima da média europeia do salário mínimo, se materializarmos um plano igualmente exigente que permita que a nossa produtividade do trabalho se aproxime da média europeia.
Ou seja, tal como Vieira Lopes, Armindo Monteiro entende que o salário mínimo não deve ser discutido de modo solitário. “Estamos disponíveis para assinar um acordo de produtividade e rendimentos que vise esses dois objetivos interdependentes. Salários e produtividade são os dois lados da mesma moeda“, acrescenta o mesmo responsável.
A CIP decidiu ficar de fora do reforço do acordo de rendimentos assinado em outubro de 2023, porque considerou que este não tinha medidas suficientes para que as empresas conseguissem suportar, de forma sustentável, os aumentos salariais pretendidos pelo Governo.
Da parte dos agricultores, chega a mesma mensagem para Pedro Nuno Santos. Ao ECO, fonte oficial da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) afirma que “há ainda caminho por fazer” para que a promessa em causa “possa ser concretizável.
“Portugal tem de ambicionar crescer muito mais do que até agora neste século: na economia, na riqueza criada, no emprego, nas qualificações e, evidentemente, nos salários — incluindo naturalmente no salário mínimo, cujo aumento tem sido significativo nos últimos anos”, destaca a CAP.
“A intenção referida agora pelo novo secretário-geral do PS, na corrida às legislativas, não parece trazer propriamente grande novidade, pois estende a 2028 a tendência de crescimento observada nos anos anteriores. Contudo, importa frisar, por um lado, que a Concertação Social é a sede adequada para este que é um tema nacional, e não meramente de iniciativa e vontade partidária; E, por outro lado, que a subida dos salários, que é desejável, tem de ser sustentável para as empresas e deve estar articulada com o crescimento da economia, considerando nomeadamente a taxa de inflação e a produtividade, entre outros fatores”, detalha a CAP.
A Concertação Social é a sede adequada para este que é um tema nacional, e não meramente de iniciativa e vontade partidária. A subida dos salários, que é desejável, tem de ser sustentável para as empresas e deve estar articulada com o crescimento da economia.
Assim, para os agricultores, Pedro Nuno Santos deveria ter mencionado, a par do salário mínimo, as reformas tributárias e laborais “necessárias à criação de uma economia que crie mais riqueza e permita a valorização salarial dos trabalhadores”
“A CAP está naturalmente alinhada na necessidade de valorizar os salários, mas no seu devido tempo e modo e em sede própria. Na corrida às legislativas e à beira de um novo ciclo governativo, seria importante não menosprezar os mecanismos de concertação, tão relevantes para a estabilidade e paz sociais“, avisa a confederação liderada por Álvaro Mendonça e Moura.
O ECO também questionou a Confederação do Turismo de Portugal (CTP) sobre este assunto, mas esta decidiu não comentar, considerando que a trajetória do salário mínimo tem de ser tratada na Concertação Social, com o Governo que resultar da ida às urnas de 10 de março.
CGTP concorda com mil euros, mas exige-os em 2024
Da parte dos sindicatos, Sérgio Monte lembra que a UGT — a única central sindical que assinou o acordo de rendimentos com o Governo de António Costa — “sempre defendeu os mil euros até 2028“. Ou seja, a promessa agora firmada por Pedro Nuno Santos está alinhada com as pretensões desta central sindical, salienta o secretário-geral adjunto. “Só podemos concordar”, frisa.
Sérgio Monte admite, no entanto, que até pode haver condições para ir além dos mil euros. Algo que para a CGTP não é apenas uma hipótese, é uma certeza e uma urgência. Em declarações ao ECO, Ana Pires, membro da comissão executiva dessa central sindical, defende que a promessa de Pedro Nuno Santos “é claramente insuficiente”, até porque as “dificuldades colocam-se hoje” e os trabalhadores precisam de os aumentos salariais já.
A nossa proposta é que o salário mínimo atinja os mil euros em 2024. Não é com mil euros em 2028 que se vai dar resposta aos baixos salários.
“A nossa proposta é que o salário mínimo atinja os mil euros em 2024. Não é com mil euros em 2028 que se vai dar resposta aos baixos salários”, reivindica a sindicalista. Ana Pires considera que o salário mínimo é uma “alavanca importante para retirar trabalhadores da pobreza”. Mas o que ouviu de Pedro Nuno Santos “não faz crer que haja a inversão de rumo necessária”, lamenta.
Parceiros “não compreendem” proposta para salário médio
Na intervenção deste fim de semana, Pedro Nuno Santos aproveitou também para anunciar que, ganhando as eleições de março, pretende rever o acordo de rendimentos assinado em Concertação Social. Isto “de modo a que ao aumento do salário mínimo possa estar associado o aumento dos salários médios”, disse.
Sem mais detalhes ou explicações, esta ideia não está clara entre os parceiros sociais, já que os referenciais negociados na Concertação Social para os salários são apenas guias não vinculativos.
“Não faço ideia do que isso significa. O salário mínimo tem-se aproximado do salário médio, o que até nos causa dificuldades na negociação coletiva. Mas não compreendemos como é que podemos definir administrativamente o salário médio“, reforça o presidente da CCP. “Não somos fãs de fazer propostas genéricas sem fundamentos, mas já estamos habituados”, critica.
Nem entre os sindicatos esta proposta de Pedro Nuno Santos está a colher grande simpatia. Da parte da UGT, Sérgio Monte frisa que os aumentos dos vencimentos são feitos por negociação, e não por decreto-lei.
Já da parte da CGTP, Ana Pires nota uma “ausência imensa” no discurso do recém-eleito secretário-geral do PS: a negociação coletiva e as “normas gravosas” da lei laboral que estar a bloquear essa dinâmica entre empregadores e empregados. “Enquanto não houver pé de igualdade entre as partes, falar em negociação do salário médio é uma falácia“, assevera a sindicalista.
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