África do Sul v. Israel: a decisão do TIJ no combate à apatia moral do mundo ocidental?
O mundo em geral e o ocidente em particular, tem assistido, impávido e sereno à violação do direito humanitário na contra-ofensiva contra o Hamas.
A decisão do Tribunal Internacional de Justiça (TIJ) sobre o pedido de medidas provisórias com vista a proteger o povo palestiniano em Gaza, apresentado pela África do Sul em 29 de Dezembro de 2023, era relativamente expectável e veio, como não podia deixar de ser, condenar a opção de uma realpolitik assumida pelo Estado de Israel, na resposta militar que sucedeu aos ataques de 7 de Outubro de 2023, perpetrados pelo Hamas.
O Tribunal Internacional de Justiça é o principal órgão jurisdicional da Organização das Nações Unidas (ONU) e a sua função primordial é resolver conflitos jurídicos a ele submetidos por Estados e emitir pareceres sobre questões jurídicas apresentadas pela Assembleia Geral das Nações Unidas ou pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas, distinguindo-se do Tribunal Penal Internacional, nomeadamente pelo facto de este último apenas ter competência para julgar indivíduos e não Estados.
A decisão do TIJ sobre a verificação de indícios da prática de genocídio pelo Estado de Israel na Faixa de Gaza baseou-se fundamentalmente no número de palestinianos mortos, feridos e deslocados desde o início do conflito, bem como nas declarações de diversas organizações humanitárias e na retórica de desumanização usada por autoridades israelitas.
Com efeito, sublinhou aquele tribunal que mais de 25 mil palestinianos morreram, 63 mil ficaram feridos e aproximadamente 1.7 milhões sofreram uma deslocação interna forçada.
No que à retórica israelita diz respeito, o tribunal transcreveu algumas das declarações que espelham a desumanização em curso, nomeadamente do ministro da defesa israelita que prometeu um “cerco completo” à Faixa de Gaza, deixando o povo palestiniano – que apelidou de “animais humanos” – “sem electricidade, comida e combustível”, e do presidente de Israel, o qual referiu que o país iria continuar em guerra até conseguir “partir a espinha dorsal” de todos os palestinianos.
Os juízes do TIJ não deixaram de relembrar a importante declaração do subsecretário-geral da ONU para os assuntos humanitários que retira qualquer dúvida acerca da real situação dos palestinianos na Faixa de Gaza: “Gaza tornou-se simplesmente inabitável. A sua população assiste diariamente a ameaças à sua própria existência – enquanto o mundo assiste.”.
De facto, o mundo em geral e o ocidente em particular, tem assistido, impávido e sereno à violação do direito humanitário na contra-ofensiva contra o Hamas, assistindo-se à inédita situação de um conflito sem refugiados, uma vez que os palestinianos estão encurralados, não podendo sair de Gaza.
Ora, apesar de hediondos, os ataques do Hamas de 7 de Outubro não podem legitimar a punição colectiva da população de Gaza que se tem verificado desde então nem justificar a inércia ética do ocidente perante as atrocidades cometidas pelo governo de Israel, a qual faz perigar a confiança nos valores democráticos da justiça, da liberdade e igualdade para todos os cidadãos, independentemente da sua localização geográfica ou etnia.
A pergunta final deste artigo apresenta-se, pois, como óbvia: depois desta decisão do mais alto tribunal das Nações Unidas, irá a comunidade internacional continuar a normalizar o horror do que se passa em Gaza?
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