Líder dos advogados de Lisboa recusa-se a testemunhar em julgamento. Ministério Público já está a investigar
Em causa uma audiência de julgamento que decorreu a 28 de Junho em que o advogado foi chamado como testemunha num processo que envolvia uma funcionária da delegação de Sintra da Ordem dos Advogados.
O presidente do Conselho Regional de Lisboa (CRL), João Massano, tem um inquérito a decorrer no Ministério Público (MP) contra si por alegada desobediência à lei. Em causa uma audiência de julgamento que decorreu a 28 de Junho deste ano – no Tribunal de Trabalho de Cascais – em que o advogado foi chamado como testemunha num processo que envolvia uma funcionária da delegação de Sintra da Ordem dos Advogados (OA). Fonte oficial da PGR não respondeu, em tempo útil ao pedido de esclarecimento do ECO mas fonte do MP garantiu que o inquérito já deu entrada.
Chamado a depôr, o líder dos advogados de Lisboa da OA recusou-se a responder à questão da juíza, alegando o segredo profissional que vincula os advogados. Mas a magistrada não teve esse entendimento – defendendo que o advogado estava na sessão de julgamento enquanto membro do CRL da Ordem dos Advogados. “A posição assumida pela testemunha, de recusa de responder à pergunta que lhe foi formulada sobre as tarefas exercidas pela autora da ação na delegação de Sintra da OA não se afigura legítima, considerando que tal matéria não diz respeito às atribuições estatutárias da Ordem dos Advogados mas a uma relação laboral estabelecida entre a mesma delegação do CRL e a trabalhadora”, explica a magistrada na ata, a que o ECO teve acesso.
Contactado pelo ECO/Advocatus, João Massano explica que “resulta com meridiana clareza de uma interpretação literal da norma do art.º 92.º, n.º 1, al. b), do Estatuto da OA que, tendo tido conhecimento dos factos exclusivamente em virtude do cargo que ocupo e das funções por mim exercidas na Ordem dos Advogados, estou obrigado ao segredo profissional. Poderá eventualmente não ser assim numa análise casuística dos factos concretamente em causa, ponderando-se, convenientemente, o teor do facto (nem tudo o que é revelado ao advogado é, em si, um segredo) a forma como o conhecimento do facto chegou ao advogado, quem o revelou e em que quadro fáctico, as circunstâncias do conhecimento e da revelação. Por isso, nnão podia deixar de zelar pelo cumprimento estrito do EOA, acautelando o dever de guardar sigilo profissional/funcional que, em tese e em abstrato, sobre mim recaía”, diz o advogado.
João Massano explica ainda que, três dias antes da sessão de julgamento em que iria testemunhar – a 25 de junho – enviou um requerimento para que lhe fosse dado conhecimento dos factos sobre os quais se pretendia que depusesse. ” Sobre esse seu requerimento recaiu um despacho pelo qual se indeferiu o requerido pela testemunha, por nenhum fundamento válido se vislumbrar em tal pedido”. Criticando ainda a juíza do juízo de Cascais dizendo que “estava vedado à Meritíssima Juiz decidir pela ilegitimidade da escusa invocada sem ouvir previamente o Órgão da Ordem dos Advogados estatutariamente competente para se pronunciar acerca do sigilo, ainda que tal parecer possa não ser vinculativo. Não competindo assim à Meritíssima Juiz decidir, sem mais, pela ilegitimidade da escusa, dizendo que não tem dúvidas. Em primeiro lugar, ao contrário do que consta no segundo dos despachos recorridos, a matéria em causa relacionada com as relações laborais estabelecidas entre os trabalhadores da Ordem dos Advogados, designadamente das respetivas Delegações, e os seus Órgãos, diz respeito às atribuições estatutárias da Ordem dos Advogados”.
Já em Julho, o Tribunal Administrativo de Lisboa decidiu não dar seguimento ao pedido do Conselho Regional de Lisboa (CRL) da Ordem dos Advogados (OA), numa providência cautelar pedida pela instituição liderada por João Massano. Em causa a elaboração de um regimento para os trabalhadores do CRL sem alegadamente ter competência estatutária adequada, o que gerou conflito com o Conselho Geral da OA, liderado pela bastonária Fernanda de Almeida Pinheiro.
Pelo que, no caso concreto, “não se mostra verificado o pressuposto do periculum in mora de que depende a adoção da presente instância cautelar, porquanto, sem a alegação de factos concretos, ao Tribunal não é possível aferir da constituição de uma situação de facto consumado e/ou da produção de prejuízos de difícil reparação. Pois que, o fundado receio a que a lei se refere é o receio apoiado em factos que permitam afirmar, com objetividade e distanciamento, a seriedade e a atualidade da ameaça e a constituição de uma situação de facto consumado. Não bastam, pois, simples dúvidas, conjeturas ou receios meramente subjetivos ou precipitados, assente numa apreciação ligeira da realidade”, pode ler-se no acórdão do tribunal, a que o ECO/Advocatus teve acesso.
O pedido de apreciação feito pelo CRL ao tribunal administrativo surge depois de, em Junho, o Conselho Superior da Ordem dos Advogados ter recebido uma participação disciplinar contra João Massano, acusado pelo Conselho Geral da Ordem de “violar normas éticas”. A participação disciplinar surgiu por o CRL iniciativa de elaborar um regimento de atribuições e competências para os trabalhadores do CRL. Iniciativa que contou com a oposição da bastonária Fernanda de Almeida Pinheiro por considerar que extravasava as competências do CRL, uma vez que, alegou, estatutariamente a Ordem é uma única entidade. Neste sentido, caberia ao Conselho Geral elaborar o regimento para depois ser aplicado em todos os conselhos regionais. O CRL não se conformou e avançou então avançou para o tribunal administrativo com uma ação contra o CG.
Contactado pelo ECO/Advocatus, na altura, João Massano alegou que “o Tribunal não apreciou a questão de direito que opõe os dois órgãos da Ordem dos Advogados. Assim, o tribunal não fez qualquer apreciação sobre a ilegalidade da mencionada deliberação, nem mesmo num juízo meramente perfuntório e sumário, o qual apenas irá ter lugar na ação principal que está a correr os seus termos no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa”, disse o advogado. “Ao que acresce que a sentença proferida é passível de recurso, estando o Conselho Regional de Lisboa a proceder à sua análise cuidada para decidir sobre uma eventual interposição de recurso da mesma. O Conselho Regional de Lisboa mantém, por isso, a mais profunda convicção de que a deliberação do Conselho Geral é ilegal, violando as regras do Estatuto da Ordem dos Advogados, numa visão centralista desrespeitadora da autonomia dos órgãos regionais”, conclui o líder do Conselho Regional de Lisboa.
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