CIP quer que recibos de vencimento mostrem tudo o que o empregador paga

Reunião de Concertação Social será sobre melhoria dos rendimentos. "Patrão dos patrões" avisa que encontro não deve servir para discutir apenas o salário mínimo e pede ambição para fomentar economia.

A Confederação Empresarial de Portugal (CIP) vai propor na reunião de Concertação Social desta quarta-feira que os recibos de vencimento mostrem tudo o que o empregador paga ao trabalhador, isto é, além do salário, os impostos e contribuições para a Segurança Social.

“Um recibo de vencimento com mais detalhes é uma das medidas que vamos levar à Concertação Social, posso avançar já. Vai contribuir para uma maior clarificação. É importante que o trabalhador saiba quanto está a contribuir para o Orçamento do Estado e quanto é que a empresa está a pagar“, adiantou o presidente da CIP, Armindo Monteiro, em declarações ao ECO.

Há um ano, numa conferência de imprensa em reação à proposta de Orçamento do Estado que acabara de ser apresentada pelo Governo de António Costa, o “patrão dos patrões” tinha indicado aos jornalistas que a CIP estava a pedir às empresas de software de contabilidade que adaptassem os sistemas para que os recibos de vencimento mostrassem “tudo o que os empregadores pagam”.

Na altura, a medida acabou por não ser discutida na Concertação Social, mas Armindo Monteiro avança agora ao ECO que vai apresentá-la na reunião desta quarta-feira ao Governo, às demais confederações empresariais e aos sindicatos.

A intenção, ressalva o presidente da CIP, não é tornar este recibo de vencimento mais detalhado obrigatório, mas promovê-lo como ferramenta para fomentar a “literacia e clareza nas relações de trabalho“, até porque, alerta, o “salário líquido está bastante afastado do salário bruto“.

No mesmo sentido, importa lembrar que, recentemente, sete grandes empresas (incluindo a Altice, a BA Glass, a EDP e a José de Mello) alteraram o modelo dos seus recibos de vencimento para deixar claro o salário bruto pago ao trabalhador, os descontos a que este está sujeito (a taxa variável de retenção na fonte de IRS e os 11% para a Segurança Social) e os encargos que o empregador tem de suportar (23,75% para a Segurança Social).

O objetivo desta iniciativa (promovida no âmbito da Associação Business Roundtable) foi “clarificar os custos associados à remuneração e alertar para as mudanças necessárias para aliviar o elevado nível de encargos sobre o trabalho”, dando “visibilidade aos encargos totais das empresas com os salários dos seus colaboradores”.

Uma reunião para discutir mais do que o salário mínimo

Armindo Monteiro, presidente da CIP, em entrevista ao ECO - 15DEZ23
Armindo Monteiro, presidente da CIP, em entrevista ao ECOHugo Amaral/ECO

Na ordem de trabalhos da reunião da Concertação Social desta quarta-feira, há dois grandes pontos: apresentar as perspetivas económicas para o próximo ano e discutir a melhoria dos rendimentos e da competitividade.

“Espero que seja uma reunião com uma agenda ambiciosa. Espero que não discutamos apenas o salário mínimo. Quando se discute o salário mínimo, estamos a discutir uma economia de mínimos“, reage o presidente da CIP.

Em conversa com o ECO, Armindo Monteiro salienta também que espera que “cada um consiga deixar as ligações partidárias cá fora” e que os parceiros sociais sejam capazes de “propor transformações”, em vez de ficar apenas presos à agenda do Executivo.

Da parte da CIP, além do novo recibo de vencimento, vai ser proposta (novamente) a possibilidade de os empregadores avançarem com o pagamento de um 15.º mês de salário isento de contribuições e impostos.

Neste momento, já é possível receber um mês extra de salário (além dos tradicionais 14), mas recentemente o Fisco revelou que entende que esses valores devem ser sujeitos a retenção na fonte de IRS. “A forma como a Autoridade Tributária interpretou a medida é absolutamente terrível. Se a ideia é estar isento, como é que a Autoridade Tributária entendeu que deveria ser englobado? É como dizer que o subsídio de refeição também deveria ser englobado“, entende Armindo Monteiro.

E atira: “É preciso assumir que este valor está, de facto, isento. É para entregar às pessoas. Não é para pôr dinheiro no cofre do Estado“.

Da parte dos sindicatos, a CGTP tem defendido que, se as empresas têm folga, devem apostá-la em aumentos salariais, e não em pagamentos extra.

Já a UGT não fecha a porta à medida proposta pela CIP, mas quer ver, primeiro, os contornos concretos. “O 15.º mês pode ser um cavalo de Troia para onde se canalizam todos os aumentos futuros“, teme o secretário-geral adjunto, Sérgio Monte, em declarações ao ECO.

De resto, esta medida do 15.º mês de salário era uma das cerca de 30 propostas que compuseram o pacto social apresentado pela CIP ao Governo anterior. Outra era a criação, de forma faseada até 2025, de uma taxa única de IRC de 17%.

Este imposto tem sido, porém, um dos focos mais polémicos da discussão política em torno do Orçamento do Estado para 2025. É que em julho, o ministro das Finanças anunciou que o Governo iria avançar com uma redução da taxa de IRC de 21% para 19% em 2025 (atingindo 17% em 2026 e 15% em 2027).

Mas, na rentrée do PS, Pedro Nuno Santos deixou claro que nunca viabilizará um Orçamento do Estado que inclua o IRC do Governo. O PSD sinalizou, entretanto, que está disponível para modelar a sua medida para viabilizar o Orçamento do Estado para 2025.

Confrontado com este cenário, Armindo Monteiro afirma que, para a CIP, a “discussão do IRC não é tática política. É uma racionalidade económica“, considerando a proposta apresentada no último ano mantém-se adequada. “Não há nenhuma razão para não ser uma prioridade“, defende.

Salário mínimo volta a subir

Sérgio Monte, da UGT, fala aos jornalistas após a reunião do Conselho Económico e Social. MANUEL DE ALMEIDA/LUSA

Conforme avançou o ECO em exclusivo, o Governo prepara-se para propor aos parceiros sociais um salário mínimo nacional de 860 euros para 2025, acima dos 855 euros previstos no acordo de rendimentos celebrado em Concertação Social.

Da parte dos empresários, o ECO tentou ouvir a Confederação do Turismo de Portugal (CTP) e a Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), mas não foi possível.

Já da parte da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), João Vieira Lopes sublinha que o tema costuma ser discutido quando já são conhecidos os dados económicos do terceiro trimestre. Também Armindo Monteiro, da CIP, preferiu não comentar, para já, o valor, atirando, contudo, que é importante lembrar que o empresário nunca paga “apenas” o valor do salário mínimo, ou seja, somam-se as contribuições para a Segurança Social.

Em contraste, do lado dos sindicatos, Tiago Oliveira, da CGTP, insiste num aumento para mil euros, para fazer face ao “aumento brutal do custo de vida”. “Temos perto de 800 mil trabalhadores com o salário mínimo nacional. Temos 19 grupos económicos que têm mais de 34 milhões de euros de lucros por dia limpos. Se o que for proposto for a continuidade da política de baixos salários, obviamente que a CGTP irá tomar uma posição sobre esta matéria“, avisa o sindicalista.

Quanto à UGT, o secretário-geral Mário Mourão já defendera uma subida para 890 euros em 2025 e Sérgio Monte confirma ao ECO que essa será a proposta que será levada à Concertação Social.

O secretário-geral adjunto espera, contudo, que o Governo não chegue à Concertação Social com um “valor fechado”, mas com um ponto de partida, acreditando, assim, que ainda é possível ir além tanto dos 855 euros do acordo de rendimentos, como dos 860 euros que o Governo deverá levar à reunião desta quarta-feira.

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