Amazon reverte teletrabalho, mas em Portugal ganha terreno

  • ECO
  • 9 Outubro 2024

Empresas internacionais de vários setores estão a reverter o teletrabalho. Em Portugal, o trabalho remoto aumentou no contexto de pós-pandemia e há um crescimento do modelo de trabalho híbrido.

Algumas empresas estão a reverter o teletrabalho e a pedir aos trabalhadores para voltar ao escritório, como a Amazon, que pediu aos trabalhadores para regressar de forma total ao trabalho presencial a partir de janeiro do próximo ano. No entanto, em Portugal, o trabalho remoto tem aumentado desde 2022, e os especialistas esperam a prevalência do trabalho híbrido no futuro.

Várias grandes empresas de diferentes setores têm pedido, no último ano, aos seus funcionários para regressarem ao trabalho presencial. Além da Amazon, os bancos Goldman Sachs e JPMorgan Chase, as tecnológicas Apple e Meta e a fabricante automóvel Tesla avançaram nesse sentido.

Também em Portugal esta situação também tem acontecido, afirma Soraia Duarte, secretária-geral adjunta da UGT: “sim, há empresas em Portugal que estão a reverter o teletrabalho e a exigir o regresso dos trabalhadores aos locais de trabalho, embora essa tendência varie conforme o setor e a cultura organizacional”.

Mas no segundo trimestre deste ano, de acordo com dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), 20,2% das pessoas empregadas em Portugal encontrava-se em teletrabalho, ou seja, cerca de um milhão de pessoas. Estes dados apontam para um crescimento de três pontos percentuais, face ao final de 2022, como mostra o gráfico abaixo.

Teletrabalho tem aumentado em Portugal

Fonte: INE

As investigadoras Ana Alves da Silva e Eugénia Pires, do Laboratório Colaborativo para o Trabalho, Emprego e Proteção Social (CoLabor), referem, perante estes números, que “a tendência atual é não só a da consolidação do recurso ao teletrabalho, como até de um ligeiro crescimento nos últimos anos, já em contexto de pós-pandemia”.

As investigadoras detalham que, entre as várias profissões, os especialistas em áreas de informação e de comunicação são os que mais estão a recorrer ao teletrabalho (73,7%), seguidos dos trabalhadores de financeiras e seguros (57,1%).

Fim do teletrabalho? Nem tanto

Depois da experiência de trabalho remoto proporcionada pela pandemia, as empresas portuguesas estão agora a ajustar os seus modelos, isto é, não voltando totalmente atrás, estão a experimentar modelos híbridos.

“O que se tem verificado, quer em Portugal, quer internacionalmente, é que algumas empresas, após a experiência acumulada, estão a readaptar os seus modelos, passando sobretudo para modelos híbridos”, aponta Rafael Rocha, diretor-geral da Confederação Empresarial de Portugal (CIP).

As investigadoras do CoLabor identificam, além disso, que também tem havido uma subida do regime híbrido nas profissões que normalmente não são compatíveis com o teletrabalho a 100%, como “a de assistente social, a de psicólogos ou outros profissionais das atividades de saúde humana e de apoio social”.

A lei do trabalho deve ser mais flexível, por forma a propiciar às empresas instrumentos que lhes permitam ajustar as suas políticas laborais à volatilidade do mercado e da conjuntura.

Rafael Rocha

Diretor-geral da CIP

Nesta transição dos trabalhadores de teletrabalho para o regime híbrido, Soraia Duarte, da UGT, alerta que é essencial “garantir a igualdade de tratamento para todos os trabalhadores ao nível dos salários, acesso à formação e progressão na carreira”. E adiciona ser necessário garantir que “o teletrabalho seja voluntário e reversível”.

Já Rafael Rocha, da CIP, adverte que “a lei do trabalho deve ser mais flexível, por forma a propiciar às empresas instrumentos que lhes permitam ajustar as suas políticas laborais à volatilidade do mercado e da conjuntura”.

Neste momento, a lei do trabalho portuguesa determina que o trabalho à distância depende do “sim” do empregador, mas há exceções. Em situações de violência doméstica e nos casos em que haja filhos até aos três anos, o trabalhador pode fazê-lo, sem que o empregador o possa contrariar, desde que as funções sejam compatíveis.

O futuro é híbrido

O futuro do trabalho é 100% presencial, como quer a Amazon? Os especialistas projetam que em Portugal o regime de trabalho híbrido deverá prevalecer, o que permite, como refere a UGT, “um equilíbrio entre a flexibilidade do teletrabalho e o presencial”.

Por sua vez, Luís Miguel Ribeiro, presidente do conselho de administração da Associação Empresarial de Portugal (AEP), sublinha que a “decisão de reverter o teletrabalho terá influência na atratividade laboral, nomeadamente na fixação de talento, sobretudo das camadas mais jovens”. Isto “tendo em conta que vivemos um período de intensa concorrência pelas competências dos trabalhadores, que estão a ser cada vez mais desafiados pelas novas tecnologias, em particular pela inteligência artificial”, aponta.

De resto, todos os especialistas ouvidos pelo ECO apontam vantagens e desvantagens no trabalho à distância. Por exemplo, “um impacto positivo nos territórios do interior (menos desenvolvidos do ponto de vista socioeconómico)”, segundo o presidente da AEP, “ao permitir fixar pessoas nesses territórios, contribui para estimular a criação de riqueza e, consequentemente, reduzir as assimetrias territoriais”. Também a poupança no espaço de escritórios, de acordo com as investigadoras do CoLabor.

A decisão de reverter o teletrabalho terá influência na atratividade laboral, nomeadamente na fixação de talento, sobretudo das camadas mais jovens.

Luís Miguel Ribeiro

Presidente da AEP

No entanto, as mesmas alertam para a “maior dificuldade de controlo direto do trabalho realizado, a diluição das sociabilidades e as dificuldades na promoção da cultura organizacional”. A UGT realça que as “dificuldades em integrar novos trabalhadores, a confidencialidade dos dados e também situações de isolamento social e saúde mental” são também alertas a considerar.

Os peritos que prepararam o livro verde sobre a saúde e segurança no trabalho também deixaram alertas nesse sentido, recomendando ao Executivo e às empresas que tenham atenção aos teletrabalhadores e implementem práticas que “eliminem ou reduzam o impacto do isolamento social e a falta de limites entre a vida pessoal ou profissional”.

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