Greves diminuem nos primeiros nove meses do ano à boleia das eleições e acordos setoriais

Com país focado nas eleições (primeiro, legislativas e, depois, europeias), pré-avisos de greve recuaram face a 2023. Acordos setoriais que o novo Governo foi fechando também ajudam a explicar quebra.

Nos primeiros nove meses do ano deram entrada menos 379 avisos prévios de greve do que no mesmo período de 2023, mostram os dados da Direção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho (DGERT). As eleições e os acordos setoriais que o Governo de Luís Montenegro tem fechado (das forças de segurança aos professores) explicam esta quebra, segundo os politólogos ouvidos pelo ECO. E indicam que não deverá haver um agravamento da contestação social nos meses que restam a 2024.

Comecemos pelos números. No primeiro trimestre do ano, ainda com o Governo de António Costa no poder (embora já em gestão), deram entrada 282 pré-avisos de greve. Já entre abril e junho (o primeiro trimestre completo do novo Governo), esse número baixou para 263. E entre julho e setembro, voltou a recuar para 151 avisos prévios de paralisação.

Contas feitas, nos primeiros nove meses do ano, foram entregues, no total, 696 pré-avisos de greve, o que corresponde, calcula o ECO, a um recuo de cerca de 35% face ao mesmo período do ano passado, já que em 2023, até setembro, tinham dado entregue mais de mil destes avisos.

A manter-se este ritmo, o número de avisos prévios de greves entregues ao longo de 2024 deverá ser o mais baixo desde 2021. Isto depois de em 2023 se ter atingido o valor mais elevado desde 2013.

Avisos prévios em 2024 estão bem abaixo de 2023

Fonte: DGERT

A explicar esta redução das greves estão três fatores chaves, de acordo com os politólogos ouvidos pelo ECO: a mudança de Governo, as eleições (primeiro, as legislativas e, depois, as europeias) e os acordos setoriais que o Executivo de Luís Montenegro tem fechado.

“O primeiro fator tem que ver com o desgaste que estava associado ao final da governação do Partido Socialista, depois de oito anos. Havia um cansaço e um descontentamento por um conjunto de promessas que não consubstanciadas em medidas”, salienta o professor Bruno da Costa, da Universidade da Beira Interior.

O primeiro fator tem que ver com o desgaste que estava associado ao final da governação do Partido Socialista, depois de oito anos. Havia cansaço.

Bruno da Costa

Professor da Universidade da Beira Interior

Por outro lado, identifica o mesmo politólogo, o período eleitoral “acaba por acalmar as reivindicações”, uma vez que os sindicatos tendem a focar-se em apresentar propostas aos futuros governantes e os partidos associados ao sindicalismo a centrar-se nas próximas eleições, não trazendo “para as ruas a contestação”.

Na mesma linha, o professor Tiago Carvalho, do Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE), aponta o novo ciclo político e a entrada do novo Governo como explicações para a redução dos pré-avisos, referindo que os últimos momentos do Executivo anterior ficaram marcados por alguma tensão, já que, depois de ter feito algumas concessões, “retraiu-se muito”, nomeadamente no que diz respeito aos professores.

A estes motivos, o também investigador soma um outro: a maior abertura que este Governo tem mostrado para a negociação (pelo menos, nalguns setores).

Bruno da Costa concorda com a importância dos acordos setoriais que o Governo fechou para esse redução das paralisações, mencionando, por exemplo, o entendimento com os professores, que veio dar resposta a uma das suas persistentes reivindicações: a devolução do tempo de serviço perdido. E também o acordo com as forças de segurança, em torno dos polémicos suplementos.

“O Governo conseguiu frenar aquilo que era um conjunto de pré-avisos de greves em múltiplos setores“, observa, assim, o professor da Universidade da Beira Interior. “Trocou-se a contestação pela negociação”, afirma, por sua vez, Tiago Carvalho.

Três meses finais sem aumento das greves?

Se no último ano, os politólogos ouvidos, então, pelo ECO anteviam um quarto trimestre de forte contestação social, desta vez a projeção é de que os meses que restam a 2024 serão marcados por uma manutenção do que tem sido vivido até aqui, sem agravamentos.

“Para já, acho que não haverá um aumento das greves. Não o vejo. Acho que continuará a haver greves na saúde e na educação, mas isso já vem de antes”, sublinha o professor Tiago Carvalho, que considera que os setores onde tem havido maior desinvestimento deverão ser os mais afetados por paralisações.

Para já, acho que não haverá um aumento das greves. Não o vejo.

Tiago Carvalho

Professor do ISCTE

Já o professor Bruno da Costa atira que a contestação social “tem estado estagnada” até por haver “forte instabilidade política a nível parlamentar” no país. “O cenário de forte instabilidade política desmobiliza de certo modo um conjunto de lutas“, argumenta o politólogo.

Além disso, declara o professor da Universidade da Beira Interior, o Governo continua a mostrar abertura para a negociação, tendo mesmo avançado com negociação na Concertação Social para um salário mínimo nacional acima do previsto (vai aumentar para 870 euros em janeiro, conforme já escreveu o ECO).

E até os pensionistas têm sido endereçados pelo Executivo, frisa o mesmo especialista, lembrando que o ministro das Finanças e a ministra do Trabalho mostraram abertura para repetir o suplemento extraordinário para os reformados, caso haja margem orçamental para tal.

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

Greves diminuem nos primeiros nove meses do ano à boleia das eleições e acordos setoriais

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião