Depois da denúncia contra Montenegro, o que pode fazer o PGR?

Amadeu Guerra admite que recebeu uma denúncia anónima contra Luís Montenegro mas, de forma defensiva, esclarece que a mesma ainda "está em análise".

O Procurador-Geral da República recebeu uma denúncia anónima relativamente à questão que envolve Luís Montenegro e sua empresa familiar Spinumviva. “Confirmamos a receção de uma denúncia anónima, a qual se encontra em análise”, garantiu fonte oficial do gabinete de Amadeu Guerra ao ECO.

O ECO já tinha tentado obter uma reação por parte da PGR sobre a criação da empresa familiar de Luís Montenegro – a Spinumviva –, que ganhou contornos políticos mais graves na sexta-feira, levantando questões sobre o papel que o primeiro-ministro ainda terá nesta sociedade. E que levou, no sábado, Montenegro a desafiar a oposição a apresentar uma moção de censura, o que acabou por acontecer, por iniciativa do PCP. Mas a resposta da PGR só chegou esta segunda-feira, depois do gabinete de Amadeu Guerra admitir que recebeu uma denúncia anónima mas, de forma defensiva, esclarecer que a mesma ainda “está em análise”.

Depois das explicações do primeiro-ministro, para lá de um potencial conflito de interesses entre Montenegro e a Solverde, ficam ainda no ar dúvidas relativamente aos atos praticados pela própria empresa. Se configuram, ou não, atos jurídicos que – até abril de 2024 – eram exclusivos de advogados e só poderiam ser exercidos em contexto de uma sociedade de advogados e não de uma sociedade comercial. Ou seja: se estamos perante o crime de procuradoria ilícita.

E o que pode fazer Amadeu Guerra, a partir daqui?

Ora, tratando-se de factos que podem ter sido realizados por Montenegro enquanto já era primeiro-ministro – o que aconteceu em março de 2023 –, a abertura de um inquérito criminal contra o primeiro-ministro tem sempre de ser feita por um procurador-geral-adjunto do Ministério Público do Supremo Tribunal de Justiça (STJ).

Apesar de não ser obrigatória a abertura desta investigação, a lei diz que, a menos que seja manifestamente infundada, uma denúncia impõe abertura de inquérito, nem que seja para arquivar posteriormente. Logo, se Amadeu Guerra nada fizer poderá vir a ser criticado por deixar de lado uma investigação ao líder do Executivo que o indicou para titular da investigação criminal, em outubro de 2024.

Segundo o artigo 246º do Código de Processo Penal, a denúncia anónima determina a abertura de inquérito se “dela se retirarem indícios da prática de crime” ou se o ato em causa “constituir crime”.

O advogado penalista Paulo Saragoça da Matta disse ao ECO/Advocatus que o Ministério Público “não pode decidir livremente, mas sim decidir de acordo com o princípio da legalidade”.

António Jaime Martins, advogado e ex-dirigente da Ordem dos Advogados – e atual candidato ao Conselho Superior –, defende que os atos referidos pela empresa “exigem qualificação jurídica. E mesmo agora a consultoria jurídica por empresas está sujeita a requisitos apertados e neste caso a empresa nem sequer é uma multidisciplinar pois não tem sócios advogados”.

Também esta segunda-feira, a bastonária da OA, Fernanda de Almeida Pinheiro, remeteu o comunicado da empresa familiar de Montenegro, Spinumviva, para ser alvo de averiguações pelo Conselho Regional do Porto. “A Ordem dos Advogados tem estruturas próprias para averiguar essa situação [se estamos perante um crime de procuradoria ilícita].

O que acontece agora é que perante o comunicado que foi emitido pelo primeiro-ministro relativamente à sua empresa, uma situação que é pública, a Ordem desencadeia um processo de forma normal como se sucederia como qualquer outro processo”, disse a bastonária em declarações à RTP3.

Desde abril de 2004 que o “Regime Jurídico dos Atos de Advogados e Solicitadores” foi alterado, definindo o alcance dos atos próprios dos advogados e dos solicitadores e tipificando ainda o crime de procuradoria ilícita. Uma alteração que surge na sequência de obrigações europeias, com a alteração da Lei das Associações Públicas Profissionais.

Os mais relevantes atos reservados aos advogados e solicitadores são no exercício de um mandato que é, no fundo, a representação legal de uma pessoa em tribunal. Mas não só.

São também os atos de consulta jurídica, como a elaboração de contratos e a prática dos atos preparatórios à constituição, alteração ou extinção de negócios jurídicos, designadamente os praticados junto de conservatórias e cartórios notariais, a negociação para cobrança de créditos ou o exercício do mandato no para reclamação ou impugnação de atos do Estado ou do Fisco. E que são exclusivos de advogados e solicitadores e não podem ser realizados por consultoras ou empresas comerciais, como é o caso da de Montenegro.

Caso aconteça, estamos perante o caso de procuradoria ilícita, punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias.

Conferência de líderes reúne-se terça-feira para decidir data do debate de moção de censura

A conferência de líderes parlamentares vai reunir-se esta terça-feira de manhã para decidir a data do debate e votação da moção de censura do PCP, entregue no domingo pelo partido no parlamento, indicou à Lusa fonte parlamentar. A moção de censura em questão, com o título “Travar a degradação nacional, por uma política alternativa de progresso e de desenvolvimento”, tem chumbo garantido, uma vez que o secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos, já anunciou que não pretende viabilizá-la.

Esta iniciativa foi apresentada pelo PCP depois de, no sábado à noite, o primeiro-ministro, Luís Montenegro, ter feito uma declaração ao país na qual admitiu avançar com uma moção de confiança ao Governo se os partidos da oposição não esclarecessem se consideram que o executivo “dispõe de condições para continuar a executar” o seu programa.

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

Depois da denúncia contra Montenegro, o que pode fazer o PGR?

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião