FMI mostrou “pouco interesse” no impacto social das medidas em Portugal

A entidade independente que avalia o FMI diz que as autoridades portuguesas queixaram-se da ausência de preocupação do Fundo com as questões sociais durante o programa da troika.

A análise do Gabinete de Avaliação Independente do Fundo Monetário Internacional revela que as autoridades portuguesas queixam-se que a equipa do FMI demonstrou “pouco interesse” no impacto social das reformas. O relatório publicado esta terça-feira considera que o desempenho do fundo foi positivo, mas assinala as queixas deixadas pelos Estados onde o FMI interveio. O documento deixa ainda cinco recomendações.

De acordo com as autoridades portuguesas entrevistadas para esta avaliação, a equipa do FMI estava principalmente focada na consolidação orçamental durante o programa [de assistência financeira] e evidenciou pouco interesse no impacto social das medidas reformadoras, preferindo deixar tais assuntos para as instituições europeias“, lê-se no relatório do Gabinete de Avaliação Independente. Já as autoridades da Grécia — onde o FMI ainda continua presente — criticaram o FMI por não compreender o sistema de proteção social do país.

Recorde-se que em setembro do ano passado o Ministério das Finanças português criticou duramente o FMI. “Quando o FMI [Fundo Monetário Internacional] classifica o Programa [implementado entre 2011 e 2014] como um ‘sucesso qualificado’, o Governo opta antes por promover uma avaliação mais detalhada do Programa”, escreveu o gabinete de Mário Centeno, acusando o Fundo de aplicar medidas que resultaram num “enorme custo social”.

Contudo, é preciso ressalvar que este estudo não incidiu sobre o impacto da intervenção do FMI na proteção dos mais pobres. Este estudo tinha como objetivo avaliar a perceção das autoridades da utilidade dos conselhos do Fundo para a proteção social.

Mais à frente no relatório, a análise Gabinete de Avaliação Independente revela que, nos programas de ajustamento, o papel do FMI foi mais de suporte do que de destaque nos esforços para minimizar os “custos sociais do ajustamento [orçamental]”. “Os comunicados de imprensa do FMI para os programas da Grécia, Irlanda, Portugal e Chipre enfatizaram a necessidade de proteger os grupos vulneráveis e/ou reforçar os sistemas de segurança social”, refere o relatório.

A análise geral ao desempenho do FMI conclui que “tradicionalmente” o papel do FMI na proteção social era “limitado”, dado que o foco estava no campo orçamental. No entanto, o Gabinete refere que o Fundo tem mudado essa atitude, dando mais atenção a esse campo. “Reconhecendo o aumento global da atenção aos assuntos relativos à proteção social, a avaliação encontrou níveis diferentes de envolvimento do FMI entre os países e ao longo do tempo”, analisa o relatório.

O próprio Gabinete de Avaliação Independente admite que “avaliar o envolvimento do FMI na proteção social é complicado pelo facto de que não existe uma definição standard para ‘proteção social'”, referindo que há “fatores idiossincráticos” a perturbar a análise: “a equipa [do FMI] tinha diferentes opiniões sobre o que esperavam do seu trabalho nesta área específica e no papel específico do FMI“. Esta dificuldade resultou numa das conclusões do trabalho, a de que as autoridades dos países notaram frequentemente que os conselhos do FMI eram genéricos e não tinham em conta as circunstâncias nacionais.

Como resolver este problema?

Identificado o problema, a equipa deixa cinco recomendações:

  1. O FMI devia estabelecer uma estratégia clara e estruturada para guiar o seu envolvimento na proteção social entre as várias prioridades que existem;
  2. O Fundo deveria sugerir polícias desenhadas à medida das necessidades e da situação do país em concreto, aproveitando o trabalho já feito pelas autoridades nacionais ou outro tipo de parceiros como o Banco Mundial ou a OCDE;
  3. O FMI necessita de encontrar abordagens mais realistas e eficientes no desenho dos programas para assegurar que os impactos adversos das medidas nos mais vulneráveis sejam mitigados;
  4. Em termos de comunicação externa, o FMI deveria explicar de forma realista a sua abordagem aos temas da proteção social, e o que consegue ou não fazer nesse assunto, tendo em conta o seu mandato e os seus recursos limitados;
  5. O Fundo deveria empenhar-se em cooperar com outras instituições na proteção social para encontrar formas de trabalhar construtivamente.

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