Lista de convidados da Oracle continua a crescer. Empresa já ganhou 22 milhões em contratos

Uma lista de convidados da Oracle para participar num evento em São Francisco, em 2016, inclui 11 gestores de entidades públicas portuguesas. Oracle já ganhou mais de 22 milhões de euros em Portugal.

Já se conhecem alguns dos nomes dos portugueses que a Oracle convidou para participar na edição do ano passado do Oracle Open World, o evento anual da tecnológica norte-americana que decorre em São Francisco. Entre eles, há 11 altos quadros de entidades públicas. A participação neste tipo de eventos, por si só, é uma prática normal: são momentos que estão previstos nas funções de dirigentes públicos e que, em muitos casos, são financiados pelas próprias instituições públicas. As questões que se levantam têm que ver com as relações comerciais mantidas entre as entidades públicas e as empresas privadas que as convidam para estes eventos.

E, no caso, da Oracle, essas relações são expressivas. A Oracle Portugal já celebrou mais de 240 contratos com entidades públicas, num valor global que ultrapassa os 22 milhões de euros. Mas esses são só os contratos assinados pela própria Oracle. Se se contabilizarem os contratos celebrados por empresas parceiras da Oracle, que fornecem os seus produtos, os números são bem mais elevados.

Quem foi a São Francisco em 2016?

A lista a que o ECO teve acesso — que não foi confirmada pela Oracle — mostra que a empresa convidou 61 portugueses. Desses, 11 são quadros de instituições públicas ou participadas pelo Estado.

Justiça e Economia confirmam

Há dois nomes que surgem na lista de convidados e que são confirmados pelo Governo. Um deles é José Moura, coordenador do Núcleo de Arquitetura de Serviços e Plataformas Partilhadas do Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça (IGFEJ), tutelado pelo Ministério da Justiça. Questionado pelo ECO, o Ministério de Francisca Van Dunem não só confirma a presença de José Moura no Oracle Open World, como refere que as despesas desta viagem foram suportadas pelo próprio IGFEJ.

“O funcionário do IGFEJ, José Moura, coordenador do NASPP – Núcleo de Arquitetura de Serviços e Plataformas Partilhadas, deslocou-se ao Open Oracle World em 2016, que decorreu entre 18 e 22 de setembro de 2016. Esta viagem foi autorizada por deliberação do Conselho Diretivo deste Instituto, no dia 29 de julho, e todas as despesas (deslocação e alojamento) foram custeadas pelo IGFEJ”, responde fonte oficial.

O Ministério acrescenta ainda a justificação para esta viagem: “Estava em curso (na data) um processo de migração do ESB da Justiça para a nova plataforma SOA Suite da Oracle. O IGFEJ pertence ao Oracle Integration Customer Advisory Board, composto por várias entidades de múltiplos países, com o objetivo de providenciar um fórum colaborativo, onde são trocadas ideias com vista ao avanço da plataforma. Por se considerar relevante a participação neste fórum colaborativo, a viagem foi autorizada e as despesas foram custeadas pelo Instituto“.

O outro nome confirmado é o de Ermelinda Carrachás, secretária geral do Ministério da Economia. Neste caso, o Ministério confirma a presença da responsável no evento da Oracle, não só em 2016 mas também em 2015, mas não diz quem pagou as despesas da viagem.

“A Secretária Geral do Ministério da Economia, Ermelinda Carrachás, participou na Oracle Open World, em São Francisco, em 2015 e 2016, integrada no âmbito das competências do Grupo de Projeto para as Tecnologias de Informação e Comunicação (GPTIC), atual Conselho para as Tecnologias de Informação e Comunicação na Administração Pública (CTIC) e da Rede Operacional de Serviços Partilhados de Tecnologias de Informação e Comunicação da Administração Pública (RSPTIC)”, diz fonte oficial do Ministério da Economia, em resposta ao ECO.

E deixa também uma justificação para esta participação: “A presença desta dirigente no Open Oracle World 2016 vem na sequência da participação em edições anteriores e no âmbito da participação de dirigentes públicos de diversos países para desenvolvimento de contactos, apresentação de tendências tecnológicas e de partilha de boas práticas nacionais nas Administrações Públicas. A participação neste evento configura-se, deste modo, compatível com as funções da dirigente pelo seu relevante interesse do ponto de vista de informação e formação na área das Tecnologias de Informação e Comunicação“.

O Ministério da Economia sublinha, ainda, que “já recusou várias solicitações” para outros eventos, “por não se adequarem ao âmbito das funções dos respetivos dirigentes”.

Educação desmente

A lista a que o ECO teve acesso inclui ainda o nome de Teresa Evaristo, da Direção Geral de Estatísticas da Educação e Ciências, mas, contactado, o Ministério da Educação nega que esta responsável tenha participado no evento da Oracle. “De acordo com a Direção Geral de Estatísticas da Educação e Ciência, não houve quaisquer viagens durante o mandato do atual Governo. Fomos informados de uma viagem anterior à entrada em funções deste Governo, cujos contornos estamos a apurar“, diz ao ECO fonte oficial do ministério, sem esclarecer qual é a a viagem cujos contornos está a apurar.

Administração Interna e Saúde não confirmam nem desmentem

Há também um dirigente do Ministério da Administração Interna (MAI) — Vítor Costa, chefe de equipa multidisciplinar da Rede Nacional de Segurança Interna — que surge na lista. O MAI não confirma nem desmente a sua presença e remete para o comunicado que emitiu na terça-feira, onde dava conta de que abriu um inquérito para apurar todas as circunstâncias da participação de um funcionário da Secretaria Geral da Administração Interna no evento da Oracle. Esse inquérito, referia o comunicado, será “alargado às viagens pagas por entidades privadas a funcionários de todos os serviços tutelados pelo MAI”.

Entre os convidados estão, ainda, dois quadros da Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS), instituição que não faz qualquer comentário sobre o assunto. Mas, segundo adiantou o Observador na quarta-feira, estes dois quadros — Raquel Vilas, coordenadora de registos nacionais da SPMS, e Pedro Miranda, coordenador dos sistemas de suporte a Programas Estruturais de Saúde — tiveram as despesas pagas por uma empresa parceira da Oracle.

Quanto é que a Oracle ganha em Portugal?

Os dados que constam do portal Base, que reúne os contratos celebrados por entidades públicas, mostram que, desde 2008, a Oracle Portugal assinou 246 contratos, no valor acumulado de 22.875.452 euros. Estes são, contudo, apenas os contratos que a Oracle assina em nome próprio. Falta contar com os contratos celebrados com as empresas parceiras da empresa norte-americana, que fornecem os seus produtos em Portugal. E, nesse caso, já estão registados no Base 844 contratos, alguns dos quais com valores na ordem dos milhões de euros.

Contabilizando apenas os contratos celebrados após o evento da Oracle em 2016 — e é de referir que já houve quadros do Estado a viajarem a convite da Oracle em edições anteriores –, é fácil de ver a ligação entre a empresa e as entidades públicas cujos representantes já participaram nestes eventos. É o caso, por exemplo, da SPMS, que, em fevereiro de 2017, celebrou com a Normática, parceira da Oracle, um contrato para a aquisição de serviços de manutenção e suporte do licenciamento Oracle para o Ministério da Saúde. Por estes serviços, pagou mais de quatro milhões de euros.

Entidades sob a tutela da Economia, da Administração Interna e da Educação também têm contratos celebrados para aquisição de serviços da Oracle pouco tempo depois da participação no evento de 2016. Em agosto deste ano, a Secretaria-Geral do MAI adquiriu à Wrightia, por quase 40 mil euros, “serviços de gestão, administração e otimização de base de dados Oracle”.

Já a Secretaria-Geral do Ministério da Economia adquiriu à Timestamp, em junho deste ano, “serviços pós-venda” para a infraestrutura Exadata (um sistema otimizado para Oracle Database), por pouco mais de 22 mil euros. E a Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência adquiriu, à Timegarden, em março deste ano, um “sistema de backup de base de dados Oracle”, por perto de 75 mil euros.

Em todos estes casos, os contratos foram celebrados por ajuste direto.

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