Novo Presidente de Angola toma posse com crescimento mais baixo da década
Angola deverá ter fechado 2016 com crescimento nulo. Economistas pedem diversificação económica e medidas que melhorem o investimento e o clima de negócios.
O novo Presidente de Angola toma posse terça-feira num contexto de abrandamento económico para valores que rondam os 2%, crise de liquidez e de dificuldades financeiras num dos maiores produtores de petróleo subsaariana.
João Lourenço recebe das mãos de José Eduardo dos Santos um país que é o maior produtor de petróleo na África subsaariana, a par da Nigéria, mas que deve ter fechado 2016 com um crescimento nulo ou até em recessão. O Fundo Monetário Internacional prevê que Angola cresça 1,3% este ano e acelere para 1,5% no próximo. Já o Banco Mundial é mais pessimista colocando a perspetiva de crescimento este ano em 1,2% seguida de um abrandamento em 2018 para 0,9%.
No último verão, várias agências de notação financeira desceram o rating de Angola, afundando-o ainda mais em território especulativo, ou ‘lixo’, como normalmente é conhecido. A Moody’s coloca a notação de Angola em B1, com outlook negativo, a Standard & Poor’s atribui B- com perspetiva estável e a Fitch coloca o rating de Angola em B com outlook negativo.
Mas apesar deste cenário, não é expectável uma grande alteração na política económica do país. “A eleição de João Lourenço nas eleições de agosto vai fazer com que o atual status quo económico se mantenha firme nos próximos trimestres, o que significa que as reformas necessárias para atrair investimento estrangeiro farão poucos progressos”, escreve a consultora BMI Research.
"A eleição de João Lourenço nas eleições de agosto vai fazer com que o atual status quo económico se mantenha firme nos próximos trimestres, o que significa que as reformas necessárias para atrair investimento estrangeiro farão poucos progressos.”
Numa nota de análise sobre o mandato do novo Chefe de Estado, a consultora do grupo Fitch — a única instituição que prevê um crescimento acima de 4% para 2018 em Angola — considera que “apesar de ter feito campanha com a promessa de diversificar a economia, há pouca margem para o novo presidente alterar os padrões da economia”.
É por isso, aliás, que só para 2018 esta consultora prevê uma subida mais robusta na economia de Angola: “Não antecipamos uma subida significativa no investimento, o que poderia acelerar o crescimento do PIB; apesar de um aumento na produção de petróleo ir fazer o PIB aumentar para 4% em 2018, face à estimativa de 2% este ano, acreditamos que isto é, em última análise, insustentável” devido à falta de reformas estruturais.
Na análise ao novo mandato de João Lourenço, enviado aos investidores e a que a Lusa teve acesso, os analistas da BMI acrescentam que depois de 2018, Angola, apresentada como um “petro-estado”, deverá abrandar o crescimento para 2,4%.
Os analistas dizem que José Eduardo dos Santos, “mesmo abandonando oficialmente o poder, vai manter um grande poder de influência enquanto líder do partido no poder e através dos seus filhos, que são líderes da maior empresa de petróleos do país e do fundo soberano de cinco mil milhões de dólares”.
Sem poder para mudar as coisas, a BMI Research prevê João Lourenço permita que “a Sonangol continue uma instituição opaca e ineficiente”.
Já o economista-chefe da consultora Eaglestone considera que o novo Presidente de Angola terá de melhorar as condições de vida dos cidadãos, “senão poderá ter uma surpresa desagradável como perder a maioria ou até as próximas eleições”.
Em declarações à Lusa a propósito da tomada de posse de João Lourenço, o economista salientou que a melhoria do ambiente de negócios, da confiança dos investidores externos e das condições de vida da população deverão ser as principais prioridades do sucessor do histórico Presidente angolano. “As pessoas que agora começam a votar são muito jovens e daqui a cinco anos provavelmente a maioria já terá nascido com Angola em paz”, disse Tiago Dionísio, acrescentando que José Eduardo dos Santos “é reconhecido, valorizado e apoiado por ter trazido e mantido a paz no país”.
A questão, apontou, é que “a classe política está consciente que os problemas de boa parte da população são outros, já não são a questão da paz, são antes as desigualdades, a fraqueza dos serviços públicos, e tem de haver uma preocupação política com estas questões, senão poderão ter uma surpresa desagradável como poder a maioria ou até as eleições”, dentro de cinco anos.
"A classe política está consciente que os problemas de boa parte da população são outros, já não são a questão da paz, são antes as desigualdades, a fraqueza dos serviços públicos, e tem de haver uma preocupação política com estas questões, senão poderão ter uma surpresa desagradável como poder a maioria ou até as eleições.”
Questionado sobre o país que João Lourenço vai receber de José Eduardo dos Santos, Tiago Dionísio assumiu estar “preocupado com as perspetivas de crescimento em Angola”. O segundo maior produtor de petróleo da África subsaariana cresceu acima de 8% durante a última década, “mas no ano passado teve um crescimento zero ou até uma recessão, e as perspetivas para este e para os próximos anos apresentam estimativas de 1 a 1,5%”.
Sobre a melhor forma de acelerar esse crescimento, insuficiente para impedir o PIB per capita de descer, o economista-chefe da Eaglestone disse que “para além da diversificação económica, falada há anos, os esforços devem concentrar-se na introdução de medidas que melhorem o investimento privado doméstico e internacional”.
O petróleo, admitiu, vai continuar a ser o grande motor do crescimento angolano, mas “há setores com um potencial brutal, como os serviços, o retalho e a agricultura”, que pode ser aproveitada tendo em conta a necessidade da China e da Índia de alimentar uma população a crescer, e “isso é algo que as autoridades angolanas podiam explorar”.
Sobre o novo estilo de João Lourenço e quais as diferenças com o seu antecessor, Tiago Dionísio admitiu que “existe uma enorme expectativa” e considerou que “a escolha da equipa e o próximo Governo vão ditar muito do que o novo Presidente quer para o país”.
Deverá haver, concluiu, “alguma preocupação em melhorar a transparência e as condições para o investimento privado em Angola e que o país consiga arrepiar caminho na diversificação”, tornando-o menos suscetível à volatilidade dos preços das matérias-primas, até porque “o petróleo não vai chegar aos 100 dólares nos próximos anos”.
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