Bagão Félix: “Nos bons tempos deve-se encontrar as soluções para os maus”
O ex-ministro das Finanças alerta que Portugal se deve preparar para os maus tempos económicos, destacando a redução da dívida. Para Guilherme de Oliveira Martins a dívida pública tem de ser limitada
“Finalmente assumiu-se que a grande questão financeira é a da dívida e não a do défice”. A frase é de Bagão Félix, ex-ministro das Finanças, que, a par de Guilherme d’Oliveira Martins, está ser ouvido esta terça-feira no grupo de trabalho sobre o endividamento público e externo do Parlamento. Bagão aconselha Portugal a preparar-se para os “maus tempos” económicos. Guilherme d’Oliveira Martins quer que a dívida pública seja “objeto de limitação”.
Na sua intervenção inicial, Bagão Félix recordou que “raramente se falava na dívida” nas reuniões dos ministros das Finanças da União Europeia a que assistiu, onde se colocava a tónica no défice — uma estratégia de que discorda. “O défice é uma fotografia, a dívida é um filme”, apontou, elogiando a mudança de prioridade para a dívida. Para o ex-ministro das Finanças esta é a questão é essencial porque pode colocar em causa a equidade geracional ao “impor-se às futuras gerações uma fortíssimo constrangimento”.
É também esta a preocupação de Guilherme d’Oliveira Martins que destaca as operações de risco do Estado, as quais devem ser evitadas. “Com os meios públicos não deve haver riscos“, afirmou o ex-presidente do Tribunal das Contas, recordando o caso dos swaps. Para o ex-ministro das Finanças, o país “não deve fazer operações de risco e garantir que haja um controlo deste tipo de operações”.
"O défice é uma fotografia, a dívida é um filme.”
Ambos concordam num ponto: é preciso cumprir a regra de ouro das finanças públicas — “o endividamento só deve acontecer em situações de investimento reprodutivo“, sintetiza Bagão Félix, algo que nem sempre aconteceu no passado do país. Para Guilherme d’Oliveira Martins “não deve haver endividamento se não for para despesas de investimento”. Mas, acima de tudo, ambos priorizam a criação de condições de sustentabilidade para não existir mais dívida no futuro.
Qual é a solução para reduzir a dívida pública? Além da redução do défice e o aumento dos excedentes orçamentais, os ex-ministros das Finanças argumentam que é preciso aliar o crescimento económico com a redução da dívida bruta, de forma a baixar o rácio.
Neste momento o BCE só por si não vai resolver a próxima crise.
Para Bagão Félix deve-se agir já uma vez que é “nos bons tempos que se deve encontrar as soluções para os maus tempos”. Uma ideia também elaborada por Guilherme d’Oliveira Martins: “O quantitative easing está a chegar ao fim da sua eficácia e é por isso que neste momento o BCE só por si não vai resolver a próxima crise”, avisa, assinalando que “se quisermos antecipar na nova crise temos de apostar no elemento E da União Económica e Monetária”.
Uma das preocupações do ex-ministro é a dependência da dívida nas mãos de não-residentes, o que aumenta a dívida externa do país. Além disso, avisa que há “um completo desincentivo à poupança, ideia que está muito desvalorizada”, destacando a necessidade de não se consumir mais do que se produz.
Não deve haver endividamento se não for para despesas de investimento.
“É indispensável numa conjuntura como a atual articular o aumento do PIB e o ritmo da amortização“, defende Guilherme d’Oliveira Martins, dando o exemplo do Canadá que, na década de 1990, conseguiu reduzir “drasticamente” a sua dívida pública conjugando estes dois fatores.
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