O Estado português deve fazer um acordo com a BlackRock e a Pimco
Não deixa de ser impressionante, mas é a realidade. A dívida do Estado português não para de crescer.
Há duas realidades que não podem ser ignoradas. A primeira mostra que o Estado português está viciado em capital. Simplesmente, não consegue evitar o aumento permanente da dívida pública. De acordo com dados revelados agora, no último ano, a dívida pública aumentou em cerca de 2,4 mil milhões de euros. Neste momento, o Estado deve 246 mil milhões de euros, mais de 125% do PIB. Os anos da austeridade assumida mais os anos da austeridade escondida, ou seja desde 2011 até hoje, não foram capazes de travar o endividamento público em termos absolutos. Não deixa de ser impressionante, mas é a realidade. A dívida do Estado português não para de crescer.
A segunda realidade, quase tão certa como a primeira, é que o BCE irá terminar a sua política monetária actual, só não se sabe quando. Muitos analistas apontam para o fim do ano. Mas, dependendo da evolução política em Itália, poderá terminar apenas no final de 2019, quando Mario Draghi abandonar as suas funções.
Um ponto é certo: Draghi tudo fará para evitar uma crise em Itália ou, não sendo possível, pelo menos limitar a sua dimensão. Quando a política monetária do BCE mudar, haverá menos liquidez nos mercados financeiros e os juros ficarão mais altos. Estas mudanças levarão os bancos portugueses a comprar menos dívida pública. De resto, não é possível manter os níveis de aquisição de dívida pública pelos bancos nacionais nos níveis do ano passado. Os bancos não terão capacidade para isso e vai contra a estratégia europeia pós-crise de separar o sector bancário das dívidas soberanas. Em 2019, a dívida portuguesa poderá estar de novo sob pressão nos mercados internacionais.
Além destas duas realidades, há ainda a variável do risco político em Itália. Neste momento, ninguém consegue prever o futuro da política italiana. Parece, contudo, que teremos um de dois cenários. Poderá haver uma aliança entre o Movimento 5 Estrelas e a Liga. Após as derrotas de Berlusconi e de Renzi nas eleições, esta será a única maioria parlamentar politicamente possível. Esta aliança improvável não terá que resultar necessariamente num governo de coligação. Poderemos ter um governo do Movimento 5 Estrelas com o apoio parlamentar da Liga, uma espécie de geringonça italiana. Ou a fórmula inversa, um governo liderado pela Liga, na sua condição de maior partido da maior coligação eleitoral (a coligação de direita), e apoiado pelos 5 Estrelas. Mas neste ultimo caso, na prática, estaríamos perante uma coligação entre a Liga e o Movimento 5 Estrelas. Um segundo cenário passará pela realização de novas eleições, provavelmente em Outubro e um governo de gestão até lá. De acordo com as sondagens, o resultado mais provável seria o reforço da votação nos dois partidos anti-sistema.
Parece assim quase inevitável que a Itália terá num futuro mais ou menos próximo um governo populista cuja política económica assentará no aumento da despesa pública, na diminuição da receita fiscal ou até em ambas. Veja-se por exemplo, uma aliança entre o Movimento 5 Estrelas e a Liga. O primeiro prometeu aumentar a despesa pública para reforçar os apoios sociais no sul da Itália, onde se encontra a sua base eleitoral. A Liga prometeu baixar os impostos pagos pelas classes médias do Norte e do Centro de Itália. Esta combinação, a única que permite uma aliança entre as forças populistas, será explosiva para a dívida italiana e para o preço das obrigações soberanas italianas nos mercados financeiros. O risco italiano constitui o maior perigo para a estabilidade da zona Euro e dos mercados.
Com uma dívida pública elevada, o fim da política monetária expansionista do BCE no horizonte e os perigos do risco Itália, o governo deve preparar as melhores condições para vender obrigações soberanas a um preço razoável nos mercados internacionais. Não poderá continuar, durante muito tempo, a contar com a liquidez do BCE nem com os bancos nacionais. É aqui que entram a BlackRock e a Pimco.
Os dois fundos consideram que foram prejudicados com a passagem de linhas de obrigações do Novo Banco para o banco mau no final de 2015. O Banco de Portugal afirma que agiu em conformidade com a lei. Independentemente da razão legal, a resolução do diferendo nos tribunais não é do interesse do Estado português. Um processo jurídico prolongado afecta a imagem de Portugal nos mercados e, sobretudo, impede que a BlackRock e a Pimco comprem dívida portuguesa. Sem o programa do BCE e a diminuição da capacidade dos bancos nacionais para comprar dívida soberana, Portugal precisa da disponibilidade de dois dos maiores fundos globais a investir em obrigações soberanas. Quer a BlackRock como a Pimco foram muito importantes para o regresso de Portugal aos mercados em 2014.
Os mercados de obrigações estão relativamente tranquilos, mas podem mudar rápida e subitamente. O mais provável é que se tornem mais agitados na Europa durante o próximo ano. A economia e o sistema financeiro portugueses ainda estão numa posição frágil. Se os mercados se agitarem, convém contar com fundos como a BlackRock e a Pimco do nosso lado e não contra nós. Seria assim avisado que o Estado português chegasse a um acordo com esses dois fundos, e outros mais pequenos, nos próximos meses. Se a tempestade regressar aos mercados, precisamos de aliados e não de adversários.
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