Bloco propõe novo modelo para penalizar especulação imobiliária. Quer taxa extra para empresas e offshore
Proposta agrava carga fiscal das mais-valias consoante o tempo de detenção de um imóvel. Objetivo é beneficiar investimento em reabilitação e venda a preços que se aproximem da "real valorização".
O Bloco de Esquerda quer travar os movimentos de especulação imobiliária através de um novo regime de tributação das mais-valias, que vem agravar a carga fiscal consoante o tempo de detenção de um imóvel. A medida, que já tinha sido anunciada em setembro por Catarina Martins, consta de uma proposta de alteração ao Orçamento do Estado para 2019, apresentada esta quinta-feira, pela deputada Mariana Mortágua.
O objetivo, explicou a deputada, é beneficiar o investimento em reabilitação urbana e a venda de imóveis a preços que se aproximem da “real valorização dos imóveis”. Para isso, propõe um novo modelo que se aplica não só ao IRS e IRC, mas também a fundos imobiliários e empresas com sede em territórios offshore.
No regime atual, no caso das pessoas singulares que sejam residentes em Portugal, o lucro gerado pela venda de um imóvel é obrigatoriamente englobado no IRS e, para efeitos da determinação do lucro tributável, é apenas considerado 50% do saldo obtido com a venda do imóvel. Assim, o imposto máximo aplicável é de 24% (metade do escalão máximo do IRS). No caso dos não residentes, é aplicada uma taxa autónoma de 28% sobre a totalidade da mais-valia.
Já no caso das empresas, o lucro obtido com a venda de um imóvel é obrigatoriamente englobado no IRC, pelo que fica sujeito a uma taxa fixa de 21%. Também aqui é considerado apenas 50% do lucro obtido com a venda do imóvel, se o valor do lucro for reinvestido total ou parcialmente até ao segundo período de tributação após a venda. Os fundos imobiliários também são tributados em sede de IRC, ficando as mais-valias sujeitas à taxa de 21%, mas não são considerados alguns tipos de rendimentos.
O Bloco vem agora propor que as mais-valias obtidas com a venda de imóveis por parte de pessoas singulares sejam divididas em duas partes. A mais-valia correspondente a até metade do valor do investimento que tenha sido feito em reabilitação será considerada em 40% do seu valor para englobamento no IRS.
A restante mais-valia será considerada numa percentagem crescente, dependendo do período de detenção do imóvel. Se o proprietário vender o imóvel após menos de um ano após tê-lo comprado, a tributação incidirá sobre 75% desta parte da mais-valia. A aplicação da taxa será progressiva até aos 12 anos. Se a venda for feita mais de 12 anos após a compra, a taxa incidirá sobre 50% da mais-valia, tal como acontece atualmente.
- Até um ano: 75% da mais-valia
- De um a dois anos: 74% da mais-valia
- De dois a três anos: 73% da mais-valia
- De três a quatro anos: 72% da mais-valia
- De quatro a cinco anos: 70% da mais-valia
- De cinco a seis anos: 68% da mais-valia
- De seis a sete anos: 66% da mais-valia
- De sete a oito anos: 63% da mais-valia
- De oito a nove anos: 60% da mais-valia
- De nove a dez anos: 57% da mais-valia
- De dez a 11 anos: 54% da mais-valia
- De 11 a 12 anos: 51% da mais-valia
Com esta aplicação progressiva ao longo do tempo, o Bloco pretende desincentivar “a retenção do imóvel por mais tempo para aproveitar uma descida significativa da taxa de imposto de um período para outro”.
O modelo proposto pelo Bloco prevê que fiquem isentos de tributação os ganhos provenientes da venda de imóveis destinados a habitação própria e permanente, desde que sejam total ou parcialmente reinvestidos para o mesmo objetivo, período compreendido entre os 24 meses anteriores e os 36 meses posteriores à realização da mais-valia.
A proposta prevê que também no caso dos não residentes as mais-valias sejam separadas: o ganho equivalente a até metade do valor dos encargos com reabilitação realizados nos últimos 12 anos ficará sujeito a uma taxa autónoma de 28%; a mais-valia superior a esse valor fica sujeita a uma taxa autónoma de 33%, aplicada sobre o valor total da mais-valia.
É ainda agravada a tributação para o caso específico dos imóveis de particulares sediados em offshore, aplicando-se uma taxa autónoma de 35% sobre o valor total da mais-valia.
Empresas pagam taxa adicional. Fundos também
Quanto às empresas, o Bloco propõe a criação de um adicional que incide sobre o “ganho apurado pela diferença entre o valor de venda e o valor de compra (ajustado por um fator de correção monetária) deduzida de despesas inerentes à compra e venda do imóvel e de 1,5 vezes o valor dos encargos com a valorização do imóvel, comprovadamente realizados nos últimos 12 anos.
Assim, mantém-se o apuramento atual das mais-valias tributáveis das empresas e acrescenta-se uma taxa adicional. Esta não se aplica quando o valor do lucro seja total ou parcialmente reinvestido até ao fim do segundo período de tributação após a venda do imóvel.
Também neste caso, a taxa adicional será tanto maior quanto menor for o período de detenção do imóvel. Se a empresa vender o imóvel menos de um ano após a sua compra, a mais-valia ficará sujeita a um adicional de 9%; 8,5% para um a dois anos; 8% para dois a três anos; 7,5% para três a quatro anos; 7% para quatro a cinco anos; 6,5% para cinco a seis anos; 5,5% para seis a sete anos; 4,5% para sete a oito anos; 3,5% para oito a nove anos; 2,5% para nove a dez anos; 1,5% para dez a 11 anos; 0,5% para 11 a 12 anos.
No caso das entidades offshore, as taxas são todas agravadas em 50%.
Os fundos imobiliários também passarão a estar sujeitos a um adicional. “Se a venda for feita a um preço que reflita um lucro até 50% do valor investido na valorização do imóvel, não há lugar a adicional”.
Esta quinta-feira, o PSD também apresentou uma proposta para travar a especulação imobiliária, com semelhanças à proposta do Bloco no que toca ao agravamento da tributação consoante o tempo de detenção de um imóvel, mas com menos escalões e protegendo as empresas.
No caso dos imóveis empresariais, uma vez que o objetivo é que os imóveis sejam colocados no mercado, as empresas ficam isentas de tributação quando a revenda seja feita no espaço inferior a um ano. Para os particulares, a proposta do PSD é de que se venderem o imóvel num período inferior a um ano, a tributação incidirá sobre a totalidade das mais-valias; a base de incidência cai para 75% se o imóvel for vendido entre um e dois anos após a compra; 50% entre dois e 15 anos; 25% entre 15 e 30 anos, período a partir do qual haverá isenção sobre as mais-valias obtidas.
12 propostas para a habitação
Para além deste novo modelo de tributação, o Bloco apresentou, esta tarde, outras 11 propostas de alteração ao Orçamento do Estado com medidas para a área da habitação. Entre elas, o aumento da capacidade financiamento do IHRU em 30 milhões de euros (passando assim para 80 milhões), a duplicação da dotação orçamental do Primeiro Direito (para 80 milhões de euros), a redução da taxa máxima de IMI a aplicar a prédios urbanos destinados a habitação própria e permanente (de 0,45% para 0,4%), a revogação do Regime dos Residentes Não Habituais, bem como a revogação dos Vistos Gold.
Questionada sobre se acredita que o novo modelo de tributação sobre as mais-valias será aprovado, Mariana Mortágua diz que o Bloco está disponível para “discutir a proposta com quem quer que queira discutir uma forma mais justa de tributação sobre lucros com vendas de imóveis“. “Estamos disponíveis para alterar esta proposta se a discussão for séria”, acrescentou.
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