Credores exigem centenas de milhões de euros ao Banif. Principal ativo são 55 milhões (a receber do Fisco)

  • Lusa e ECO
  • 3 Abril 2019

Mais de 5.000 credores exigem o pagamento de dívidas do Banif, mas o banco deve centenas de milhões ao Estado e o principal ativo são 55 milhões a receber do Fisco.

O Banif, banco em liquidação, recebeu 5.650 reclamações de créditos, sendo que ainda não há data para o prazo acabar, já que falta notificar credores no Brasil ou nos Estados Unidos, segundo fonte conhecedora do processo.

Mas os ativos não chegam para pagar as dívidas: o Banif tem 55 milhões a receber do Fisco, e deve 3,6 milhões à AT e à Segurança Social, bem como 459 milhões de euros ao Fundo de Resolução, três credores considerados privilegiados (ou seja, os valores têm de ser liquidados primeiro).

Enquanto todos os credores no estrangeiro não forem notificados pelo tribunal – e existem no Brasil e nos Estados Unidos, mas também na Venezuela ou na África do Sul –, não pode ser colocado um prazo-limite para a reclamação de créditos.

Contudo, milhares de clientes já fizeram chegar 5.650 reclamações e o número deve continuar a aumentar. A Lusa não tem conhecimento do valor total exigido por estes credores ao Banif.

As reclamações de créditos são feitas por particulares, como fornecedores a quem o Banif não pagou o devido, senhorios de agências bancárias que têm de receber rendas e sobretudo milhares de clientes que compraram obrigações do Banif ou Rentipar (holding através da qual as filhas de Horácio Roque detinham a participação no Banif), muitos dos quais dizem ter sido enganados, pensando que estavam a investir em depósitos a prazo.

Há ainda entre os credores entidades públicas, como o fisco (que tem impostos a receber) ou o Fundo de Resolução bancário, que são credores privilegiados (têm preferência em relação a outros credores, são os primeiros a receber).

O maior credor do Banif é precisamente o Fundo de Resolução bancário, que financiou o banco com 489 milhões de euros aquando da sua resolução, em dezembro de 2015. Agora, o Banif – em liquidação – deve-lhe esse valor, ao qual acrescem juros.

Quando for concluída a reclamação de créditos, caberá à comissão liquidatária do Banif decidir os credores reconhecidos, que têm direito a ser ressarcidos, e os credores não reconhecidos (que ainda podem depois impugnar a decisão em tribunal).

É possível que muitos clientes do Banif que investiram em instrumentos financeiros não sejam reconhecidos. Contudo, estes ainda podem ser ressarcidos caso sejam considerados credores comuns, uma vez que a legislação indica que em caso de resolução de um banco tem de ser feito um relatório para avaliar quanto teriam recebido os credores comuns se tivesse sido liquidado (ao abrigo do princípio no creditor worse off, que estabelece que um credor não pode ter perdas maiores num cenário de resolução do que as que teria num cenário de liquidação do banco). No final de 2017, o Banco de Portugal escolheu a consultora Baker Tilly para fazer essa auditoria, mas até agora ainda não foi concluída.

Na resolução do BES, a consultora Deloitte contabilizou que se o banco tivesse sido liquidado os credores comuns teriam recuperado 31,7%, pelo que esse valor terá que lhes ser pago pelo Fundo de Resolução bancário. Contudo, há dúvidas sobre quando pagará esse valor o Fundo de Resolução, podendo ser apenas no fim do processo de liquidação do BES, o que poderá demorar anos. A Lusa tem questionado o Banco de Portugal sobre o tema, mas até agora sem resposta.

Ainda sobre o Banif, atualmente decorre ainda um processo mediado pela Ordem de Advogados, no qual três peritos estão a analisar as reclamações dos lesados para avaliar se são justificadas, com vista a criar um fundo de recuperação de créditos que os compense, ainda que parcialmente, à semelhança do que aconteceu no papel comercial vendido pelo BES. Este fundo poderá beneficiar da garantia do Estado.

Principal ativo do Banif são 55 milhões de euros a receber do Fisco. Mas não chega

O Banif está a aguardar o pagamento de 55 milhões de euros por parte do Estado, que serão o seu principal ativo para pagar aos credores, mas insuficientes para fazer face às dívidas que tem.

Só ao Fundo de Resolução bancário (com estatuto de credor privilegiado) o Banif — que está em liquidação — deve 489 milhões de euros, a que acrescem juros, valor com que financiou o banco aquando da sua resolução, em dezembro de 2015.

Segundo fonte próxima do processo, o banco deve ainda dinheiro a outro credor privilegiado, a Autoridade Tributária, por impostos não pagos, cerca de dois a três milhões de euros, e ainda à Segurança Social (referente a benefícios para desempregados), cerca de 600 mil euros.

Além dos credores privilegiados (que têm preferência em ser ressarcidos), há ainda os credores comuns, destacando-se nestes o Novo Banco, uma vez que uma sentença judicial já transitada em julgado condenou o Banif a pagar-lhe 65 milhões de euros por financiamento que tinha sido concedido pelo BES.

Segundo o Jornal de Negócios de novembro passado, o Banif foi condenado a pagar os 53 milhões do empréstimo dado pelo BES mais cerca de 12 milhões de euros de juros.

Entre outros credores comuns estão fornecedores do Banif, senhorios de agências bancárias, gestores de conta acusados de burla a clientes, entre outros.

Contudo, o ativo do Banif será muito pouco face ao que todos os credores reclamam. Para fazer face a estas responsabilidades, o principal ativo do Banif são então os 55 milhões de euros devidos pelo fisco de ativos por impostos diferidos, que não chegarão sequer para o banco em liquidação pagar a dívida ao Fundo de Resolução.

Os ativos por impostos diferidos acumularam-se, nos últimos anos, no balanço dos bancos porque existiam regras diferentes de registo contabilístico e registo fiscal das imparidades, nomeadamente imparidades para crédito (perdas para créditos em incumprimento).

Uma vez que os bancos não podiam deduzir todo o custo contabilístico na fatura fiscal, criavam um crédito sobre o fisco, que os bancos abatem nos impostos futuros ou têm direito à sua devolução caso entrem em liquidação.

Uma inspeção da Autoridade Tributária decorre atualmente no Banif para avaliar se o banco tem direito à devolução da totalidade dos 55 milhões de euros. Decorre ainda, desde finais de 2017, uma auditoria que está a ser feita pela consultora Baker Tilly para avaliar quanto teriam recebido os credores comuns se o Banif tivesse sido liquidado.

Este trabalho está a ser feito ao abrigo do princípio no creditor worse off, que estabelece que um credor não pode ter perdas maiores num cenário de resolução do que as que teria num cenário de liquidação do banco.

O Banif foi alvo de uma medida de resolução em 20 de dezembro de 2015, tendo o Fundo de Resolução emprestado 489 milhões de euros para absorção de prejuízos e ainda garantias para a emissão de obrigações da Oitante. Esta sociedade foi criada aquando da resolução para ficar com os ativos do Banif que o Santander Totta não comprou.

O Banif ‘mau’ – atualmente em liquidação – ficou com poucos ativos, sendo um deles o Banif Brasil, que está há vários anos à venda, e as posições dos acionistas e obrigacionistas.

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