PSD promete choque fiscal. Os socialistas prometem óculos

Há uma medida no programa eleitoral do PS que é capaz de dar jeito à direita: óculos grátis. Rui Rio não está a ver bem o filme; não se promete, do nada, 7 mil milhões de euros que não se tem.

Em maio, o Presidente da República veio fazer um aviso à navegação, dizendo que “há uma forte possibilidade de haver uma crise na direita portuguesa nos próximos anos”. Marcelo acertou no prognóstico, falhou no timing: a crise na direita não é “nos próximos anos”, é agora e já começou.

A sondagem da Pitagórica para o Jornal de Notícias e TSF é uma espécie de certidão de óbito de um quadrante político que teima em não saber reinventar-se e que definha a cada eleição.

Santana Lopes, o homem que prometeu refundar a direita, consegue a proeza de liderar o índice de rejeição de voto: 77% dos inquiridos responderam que jamais votariam nele para primeiro-ministro. No campeonato da falta de notoriedade, lidera Carlos Guimarães da Iniciativa Liberal: 47% nem sequer sabem quem é.

O CDS aparece com o terceiro pior resultado de sempre, com 6%. Pior só em 1987 e 1991, quando era o “partido do táxi”, com 4,4%. Enquanto Assunção Cristas anda entretida a escolher o novo penteado, a líder dos centristas é aquela que dá a maior queda no índice de rejeição, que já é de 66%. Com este tombo, não há penteado que aguente.

Resta o PSD de Rui Rio que aparece na sondagem com uns míseros 21,6% nas intenções de voto, precisamente metade dos 43,2% que colocam os socialistas à beira da maioria absoluta.

Como é que possível o líder do maior partido da oposição fazer uma promessa eleitoral de baixar a carga fiscal em 3,7 mil milhões de euros e aumentar o investimento público em 3,6 mil milhões e dar um trambolhão na sondagem seguinte? A resposta é precisamente essa: prometeu baixar a carga fiscal em 3,7 mil milhões e aumentar o investimento público em 3,6 mil milhões!

Nos últimos quatro anos, em que o país conseguiu crescer ao ritmo mais elevado dos últimos 20, o Governo apenas conseguiu aliviar a carga fiscal em cerca de mil milhões de euros, com uma geringonça ávida de reversões. Como é que o PSD de Rui Rio fará um choque fiscal de dimensão ainda maior do que o “enorme aumento de impostos” de Vítor Gaspar, sem fazer perigar as contas públicas e com previsões de que a economia vá abrandar?

Os social-democratas contra-argumentam que a economia vai crescer mais do que o esperado por causa do choque fiscal que propõem. Mas dizem que o choque fiscal só será possível se a economia crescer mais do que o esperado. Rio vai ter de desfazer este dilema: se para ter mais crescimento é preciso um choque fiscal, e se para ter um choque fiscal precisa de mais crescimento, então qual vem primeiro, o ovo ou a galinha? E se a galinha não aparecer, onde vai buscar o ovo?

A última vez que Rio tinha dado um trambolhão tão grande nas sondagens foi quando o PSD e o CDS resolveram juntar-se ao PCP e Bloco para abrir os cordões à bolsa no descongelamento do tempo de serviço dos professores. Com a bancarrota do país e os sacrifícios ainda frescos na memória, os eleitores não vão premiar nestas eleições quem participar naquilo que Mário Centeno chamou de “leilão absolutamente demagogo da política fiscal”.

Rui Rio está a desbaratar talvez a único trunfo que poderia levar para estas eleições: a imagem de rigor nas contas públicas, uma herança de Passos Coelho que o partido não soube preservar. Numa outra sondagem no Expresso este fim de semana, é perguntado qual é o partido que dá mais garantias de manter as contas públicas em ordem: 30% responde PS e apenas 11% responde PSD.

António Costa acabou definitivamente com o mito “de que em Portugal é a direita que sabe governar a economia e as finanças públicas”. Aliás, o secretário-geral do PS está tão confortável nesta posição de “guardião das contas públicas” que até se dá ao luxo de fazer um programa eleitoral onde, para além de uns floridos para eleitor ver — como os óculos grátis para crianças e idosos que recebam o RSI — coloca medidas de austeridade sem medo de afastar eleitorado.

No programa que o PS apresentou este fim de semana no Pavilhão Carlos Lopes fica claro que no próximo ano a Função Pública continuará a não ter aumentos salariais generalizados, ou pelo menos “expressivos”. No programa dos socialistas lê-se ainda que é “inevitável” rever as carreiras especiais, nomeadamente dos professores, que consomem grande parte dos recursos destinados aos aumentos e progressões. Ou seja, Costa dá-se ao luxo de ir para eleições a prometer cortes, aumentos salariais pífios e alívios fiscais incertos.

Rui Rio veio dizer que António Costa estava a copiar o programa eleitoral do PSD porque os socialistas também vieram anunciar uma baixa de impostos. Há uma diferença substancial entre os 3,7 mil milhões prometidos pelo PSD e a promessa oca do PS de “aumentar a progressividade do IRS, como corolário da vertente distributiva do imposto”.

A promessa do PSD assusta o eleitorado e, tal como disse Marques Mendes na SIC a propósito do choque fiscal de Rui Rio, “quando a esmola é muita, o pobre desconfia”. A promessa dos socialistas não aquece, nem arrefece: serve para fazer boa figura nos comícios, mas pode não querer dizer absolutamente nada se a economia não der margem para grandes veleidades fiscais.

Confrontado com os resultados desastrosos da sondagem da Pitagórica, fruto de uma estratégia errática, desgovernada e temerária a nível económico, Rui Rio disse que as sondagens “não servem para nada”. O pior cego é aquele que não quer ver; e não há óculos que o possam ajudar.

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