Do turismo à agricultura, impacto da greve na economia foi marginal

Depois de uma semana de greve, os impactos foram mínimos para muitos setores. Na agricultura, turismo, calçado, têxteis e distribuição, a preparação e os mecanismos acionados impediram grandes perdas.

Sete dias depois, a greve dos motoristas chegou ao fim. Os receios do impacto que a paralisação teria no caso da greve se manter por mais de uma semana não se concretizaram, mas que consequências teve o protesto na vida das empresas? Para a maioria, o impacto foi marginal.

Perante o cenário que se afigurava, o Governo decidiu decretar serviços mínimos entre 50% e 75%, e de 100% para serviços essenciais. No primeiro dia de greve, relatos de incumprimento destes serviços mínimos motivaram o Governo a decretar requisição civil. Este mecanismo, aliado aos serviços mínimos garantidos, foram suficientes para combater o impacto da greve em vários setores.

De acordo com Luís Mira, secretário-geral da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) “devido as medidas de precaução, no setor agrícola o impacto foi mínimo”, em declarações ao ECO.

Também no setor dos têxteis como no calçado o impacto foi reduzido. Paulo Vaz, diretor geral da Associação Têxteis de Portugal (ATP), destacou ao ECO que “nos têxteis não houve grandes inconvenientes porque grande parte das indústrias estão de férias”. Considera que podia ser uma “situação desagradável mas não chegou a acontecer devido à requisição civil e aos serviços mínimos”.

O pré aviso de greve permitiu às empresas aumentar os stocks e o cumprimento dos serviços mínimos não trouxe situações de grande transtorno para o setor.

Gonçalo Lobo Xavier

Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED)

A greve também não causou grandes impactos no setor do calçado tendo em conta que tal como no setor têxtil, a maioria das empresas estão no período de férias.“O impacto foi mínimo e não houve prejuízo. Foi tudo muito tranquilo e a situação esteve sempre normalizada”, disse ao ECO fonte da Associação Portuguesa dos Industriais de Calçado, Componentes, Artigos de Pele e seus Sucedâneos (APICCAPS).

Miguel Pinto, diretor geral da Continental Vila Real, também confirma que o impacto foi reduzido e que a greve dos combustíveis “não afetou muito a empresa” que conta com mais de 500 colaboradores. “Sabíamos que ia haver greve, aumentamos o stock de matérias primas e tomamos as devidas precauções”, refere. O diretor geral da Continental contou ao ECO que a empresa fez uma gestão de recursos para evitar consumos desnecessários. “Temos cerca de 40 engenheiros que vivem no Porto e fazem diariamente a viagem para Vila Real. Durante a semana de greve, algumas dessas pessoas ficaram a trabalhar remotamente”.

Considero que grande parte das pessoas nem sentiu o efeito da greve.

Paulo Vaz

Diretor geral da Associação Têxteis de Portugal (ATP)

Gonçalo Lobo Xavier da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED) destaca que para o setor da distribuição foi um período de perturbação mas o impacto foi mínimo. Constata que o pré aviso de greve foi importante para as empresas se precaverem e que existiu “apenas ligeiros atrasos” na distribuição de bens essenciais.

Greve desmotivou alguns turistas, mas setor resistiu

Tal como aconteceu em abril, durante a altura da Páscoa, o timing da greve dos motoristas “afetou sobretudo o setor do turismo e região do Algarve“, salienta o presidente do Turismo do Algarve, João Fernandes, ao ECO. Quando o primeiro-ministro deu conta das situações de incumprimento dos serviços mínimos, referiu também que foi esta zona que foi mais impactada. A greve teve início no dia 12 de agosto, altura tipicamente de férias, ao que se acrescentou também o facto de a semana em causa ter um feriado.

Se por um lado o pré-aviso de greve ajudou as empresas a acautelarem o cenário, pode também ter assustado alguns turistas. “Esta última greve teve pré-aviso em meados de julho e desde esse período se andou a discutir qual o impacto que teria no setor, e portanto terá desmotivado alguns portugueses e espanhóis que habitualmente visitam a região“, reitera João Fernandes.

Desta forma, verificou-se uma redução na procura das pessoas que habitualmente frequentavam o Algarve, nomeadamente “as famílias, que ficam mais sensíveis a estas garantias”. No que diz respeito aos cancelamentos de reservas, estes “não são significativos e é até difícil estabelecer ligação direta”, mas em alguns casos os hoteleiros reportaram mesmo clientes que justificaram a decisão com a greve.

Já nos mercados tradicionais com mais procura, nomeadamente os britânico, alemão, holandês ou irlandês, “não houve um grande ângulo de divulgação” desta situação, de forma a que não foram tão influenciados por ela. Terão sido mais os “operadores turísticos e companhias aéreas que informaram quem viajava, no sentido que poderia ter dificuldade no abastecimento de combustível”, explica o responsável.

Nos primeiros dias de greve registaram-se infrações nos serviços mínimos e “houve algumas dificuldades de abastecimento nas bombas, e até em alguns postos REPA, que obviamente afetaram ou constrangeram as pessoas que correram até às bombas“, conta João Fernandes. Também nas marinas, sobretudo nas de Portimão e Lagos, as empresas marítimo-turísticas, que são mais de 400 na região, tiveram “pontualmente dificuldades de abastecimento”.

Mas com a requisição civil decretada pelo Governo “houve uma clara capacidade de reverter o processo e oferecer à região um instrumento concreto” para conseguir repor o abastecimento. Os serviços mínimos, aponta ainda João Fernandes, “foram bem definidos no sentido de acautelar para a população e visitantes”.

Quando se olha para a mobilidade, o impacto também foi reduzido. “Durante o período da greve, “o aeroporto não foi afetado, houve apenas um dia de manhã em que não se cumpriram serviços mínimos”, e nas rent-a-cars “não há grande constrangimento a salientar”. Estas empresas de aluguer de carros fizeram “uso dos depósitos, e implementaram medidas flexíveis de gestão do combustível com os clientes”.

Pelos hotéis, “como têm depósitos com uma capacidade de autonomia de entre sete e dez dias, tiveram neste período a possibilidade de não reduzir os serviços que prestaram aos hóspedes”, sendo que não se sentiu falta de bens alimentares. Com o avançar da semana, e depois de notícias de que a greve iria terminar, “os hoteleiros começaram a sentir acréscimo nas próprias reservas, que foram muito em cima da hora mas melhoraram a procura que estava menos ao nível do que tinha acontecido no ano passado”.

No panorama geral, para o resto do território, o cenário foi semelhante. “Apesar de ter havido alguns cancelamentos de reservas, antecipação de saídas e resistência a viajar no território, o negócio da hotelaria e da restauração no seu todo foi afetado de forma muito marginal“, adianta fonte oficial da Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP), ao ECO.

A preparação foi um dos fatores essenciais para esta “Assim que se começou a falar sobre a greve, os empresários da restauração e alojamento prepararam-se, aumentando os seus stocks, quer de combustível, quer de matérias-primas”, aponta. “Por outro lado, tanto a definição de serviços mínimos como, depois, a requisição civil, ajudaram a manter a normalidade do dia-a-dia dos nossos empresários”, acrescentou a associação destes setores, também muito envolvidos com o turismo nesta altura.

Se a greve durasse mais uma semana o impacto seria diferente

“O prolongamento da situação seria nefasta para o setor”, disse fonte da APICCAPS. A opinião é unânime e para o secretário-geral da Confederação dos Agricultores de Portugal uma semana de greve era o prazo limite. “Se esta situação durasse mais uma semana não havia capacidade para fazer jus a mais uma semana de greve”.

Miguel Pinto, diretor geral da Continental Vila Real concorda e refere ao ECO que “caso a greve se estendesse mais de duas semanas, aí sim podia existir um impacto significativo, tendo em conta que este é um setor que exporta 95% dos produtores”.

"Havia uma certa apreensão relativamente ao possível prolongamento da greve, o que, a acontecer, podia trazer consequências graves.”

AHRESP

Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal

Para a AHRESP o panorama também seria mais negro se a paralisação continuasse. Apesar de o impacto no setor ter sido marginal, “havia uma certa apreensão relativamente ao possível prolongamento da greve, o que, a acontecer, podia trazer consequências graves.”

Face à greve e à atuação do Governo, Luís Mira, secretário-geral da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), destaca que “há que felicitar o Governo de António Costa pela atuação correta”. Destaca que os “serviços mínimos permitiram às empresas e cidadãos terem o mínimo de transtorno possível”.

O presidente do Turismo do Algarve reitera também que “era de todo de evitar uma nova greve”, e saúda as partes por terem chegado a um acordo, esperando “que esse seja consubstanciado com medidas que evitem um novo episódio”.

Paulo Vaz, diretor geral da Associação Têxteis de Portugal (ATP), referiu ao ECO que António Costa geriu a greve de forma “competente do ponto de vista político”, mas acrescenta que “foi uma oportunidade de ouro para a maioria absoluta do PS e uma derrota para a estratégia do sindicato independente dos motoristas, que foi demasiado ambicioso naquilo que pretendia conseguir e acabou por cair completamente na armadilha”.

Gonçalo Lobo Xavier da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED) destacou ainda o “comportamento exemplar dos portugueses”, tendo em conta que não houve uma corrida às bombas como na última greve em abril.

O Governo aprovou já o fim da situação de crise energética, decretada a 9 de agosto, a partir da meia-noite de terça-feira. Num balanço destes sete dias de greve, o primeiro-ministro apontou, esta segunda-feira em declarações no Sistema de Segurança Interna, que “chegamos ao fim da semana com a situação resolvida, sem danos, sem qualquer tipo de violência”.

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