Portugal só tem de responder às dúvidas de Bruxelas depois de apresentar o Orçamento para 2020

A carta enviada a Portugal, Espanha e Bélgica é acima de tudo uma formalidade e, ao contrário dos países que têm governos em plenas funções, não precisará de ter resposta já.

A Comissão Europeia pediu ao Governo uma versão revista do esboço do Orçamento do Estado para 2020 “o mais rápido possível”, porque as previsões enviadas para Bruxelas apontam para um incumprimento das regras orçamentais europeias, mas a carta enviada por Valdis Dombrovskis e Pierre Moscovici não terá uma resposta nos próximos dias, ao contrário do que aconteceu nos últimos anos, porque é acima de tudo uma formalidade, apurou o ECO junto de várias fontes com conhecimento do processo. A conversa com a Comissão Europeia sobre o próximo orçamento só acontecerá depois de Mário Centeno apresentar a proposta de Orçamento do Estado para 2020, que pode chegar no final deste ano.

Como já era expectável, a Comissão Europeia enviou uma carta ao Governo a alertar que as novas previsões económicas do Governo enviadas para Bruxelas na semana passada no plano de projeto orçamental — que não inclui qualquer medida do novo Governo, nem sequer as que já estavam previstas no Programa de Estabilidade — a alertar que o agravamento do défice estrutural viola as regras orçamentais europeias, tal como o aumento previsto para a despesa.

À luz destes dados, o orçamento poderia ser chumbado pela Comissão Europeia. No entanto, devido ao calendário eleitoral a proposta de Orçamento do Estado para 2020 será apresentada depois de 15 de outubro, como se prevê na lei, e por essa razão a carta enviada pela Comissão Europeia é acima de tudo uma formalidade e não impõe uma data para Portugal dar uma resposta às inquietações do Berlaymont.

Tanto em Bruxelas como em Lisboa, o entendimento é que não terá de ser dada qualquer resposta nos próximos dias. A formulação escolhida na carta foi escolhida precisamente para evitar que este passo seja visto como uma forma de interferência da Comissão Europeia na política nacional dos Estados-membros, apurou o ECO, e Portugal não é caso único.

Também Espanha, que realiza eleições antecipadas em novembro, e a Bélgica, onde as eleições não resultaram numa maioria clara e que continuam com um Governo de gestão, receberam cartas semelhantes, onde se exige uma versão atualizada da proposta “o mais rápido possível”, mas sem qualquer referência a prazo de resposta. Já nos casos da Finlândia e Itália, que também não cumprem os requisitos mas que têm Governos em plenas funções, foram exigidas clarificações num prazo de dois dias.

Mário Centeno já esteve nesta situação em 2016, mas sem que o Governo de Pedro Passos Coelho — que saiu apenas em novembro — tenha apresentado um esboço do orçamento à Comissão Europeia até ao dia 15 de outubro, apesar de se manter em funções.

Agora, tal como aconteceu em 2016, só depois de o Governo português apresentar a sua proposta de Orçamento do Estado para 2020 é que voltará a existir interação a este respeito entre Bruxelas e Lisboa. Nessa altura, se a Comissão fizer a mesma avaliação do orçamento português, Mário Centeno poderá ser chamado a apresentar clarificações num prazo de dois dias, e ai sim, poderia dar-se a eventualidade de a Comissão chumbar o orçamento português, algo que nunca aconteceu apesar das várias cartas semelhantes enviadas pela Comissão a Portugal ao longo dos últimos anos.

Comissão também pede mais a Espanha, Bélgica, Itália e Finlândia

No total, incluindo Portugal, a Comissão Europeia enviou a cartas a cinco países cujas propostas de orçamento do Estado aparentam estar em risco de violar as regras orçamentais europeias.

Destes cinco países, três estão sem um Governo em plenas funções: Portugal, Espanha e Bélgica. Os outros dois, Itália e Finlândia, têm de responder às inquietações da Comissão, que depois as terá em conta quando chegar ao momento de entregar o seu parecer sobre as propostas de orçamento e decidir se exige uma versão revista.

  • Bélgica: As eleições foram em maio, mas os resultados ainda mais fragmentados que o habitual colocaram mais dificuldades aos belgas para encontrar uma maioria que permita formar Governo. Não é propriamente uma novidade, já que em 2010-2011 foram necessários 541 dias de Governo de gestão para finalmente se formar uma maioria no Parlamento. Sem Governo, a Comissão Europeia enviou uma carta ao Governo belga muito semelhante aquela que enviou para Lisboa, pedindo uma versão revista “o mais rápido possível”, mas sem data. A Bélgica prevê um agravamento do défice estrutural quando devia cair 0,6%, e um aumento da despesa ao triplo do ritmo permitido. A Bélgica também não cumpre o ritmo anual de redução da dívida pública que as regras exigem.
  • Espanha: A incapacidade de Pedro Sanchéz de conseguir um acordo com o Podemos para formar Governo levou à marcação de novas eleições para novembro. Como tal, a Comissão também pediu uma versão revista do orçamento “o mais rápido possível”, mas sem data marcada. Nas contas da Comissão Europeia, a redução do défice estrutural no próximo ano fica aquém do exigido, mas por muito pouco, mas a despesa cresce quatro vezes mais do limite máximo, e Madrid não reduz a dívida pública ao ritmo anual exigido.
  • Itália: Depois da disputa intensa entre Roma e Bruxelas quando o Governo ainda integrava a Liga do Norte de Matteo Salvini, a relação entre o Executivo europeu e a terceira maior economia do euro melhorou substancialmente. No entanto, Itália ainda se encontra numa situação delicada. Para além de ser o único país sujeito a um Procedimento dos Défices Excessivos devido ao elevado nível de dívida pública, recebeu uma carta da Comissão Europeia a avisar que está longe do ajustamento estrutural acordado com o Conselho da União Europeia, que viola o limite do aumento da despesa e não reduz a dívida pública como exigido. Como tem um Governo em plenas funções, Itália tem até esta quarta-feira para responder.
  • Finlândia: Em Helsínquia o processo já vai muito mais avançado do que nos restantes países. O Governo finlandês apresentou a sua proposta de orçamento no dia 7, recebeu a mesma carta da Comissão Europeia na semana seguinte — com dois dias para responder — e já o fez. A Comissão entende que a Finlândia também não está a cumprir as regras orçamentais, mas está mais perto de o fazer que os restantes países. O Governo finlandês respondeu a Bruxelas explicando os seus planos e dizendo que irá atingir as metas até 2023, mas que até lá tem de investir para criar mais emprego e estimular a economia, que se espera que abrande nos próximos anos.

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